sexta-feira, 7 de agosto de 2009

"Moscou", de Eduardo Coutinho, radicaliza na experimentação


Coutinho, Diaz e as regras do jogo

Ao final dos 78 minutos de Moscou, a reação estampada no rosto do público do Festival Paulínia de Cinema oscilava entre estranhamento e admiração. Não fosse o prêmio da crítica, sairia do festival de mãos abanando. Filme difícil. Até mesmo a parcela de cinéfilos e de iniciados nas artes cênicas, potenciais interessados pelo longa, terão dificuldade para acompanhar a narrativa fragmentada e obscura do novo trabalho de Eduardo Coutinho.

Em Moscou, Coutinho dá uma guinada com relação aos filmes que realizou ao longo da década. A investigação é a mesma de Jogo de cena, o filme anterior: localizar a linha - se é que ela existe - que separa ator e personagem, real e imaginário, ficção e documentário. O método, no entanto, é radicalmente outro. No lugar das longas entrevistas frente a frente, que se tornaram uma das marcas do diretor, entram em cena os atores do Grupo Galpão, convocados para ensaiar por três semanas a peça russa As três irmãs, de Anton Tchekhov. A peça nunca chegou a ser encenada. Foi proposta exclusivamente para ser matéria-prima fílmica.

Coutinho se manteve praticamente fora de cena. No começo, ele surge para estabelecer as regras ao grupo: conciliar memórias afetivas ao texto de Tchekhov. O objetivo inicial era reproduzir o texto completo durante o filme. O primeiro corte teve 4h40 de duração. Por sugestão do produtor João Moreira Salles, o corte final abre mão de cerca de 80% dos diálogos. Não apresenta os personagens, alguns interpretados por mais de um ator. Não diferencia exercício e cena. Tudo é válido, tudo é palco. O único sentido indispensável é expressar as inquietações do cineasta.

Do camarim à sala de ensaio, o diretor optou por exercer o mínimo de influência. Outorgou a tarefa para Enrique Diaz, um dos diretores do Galpão. Às câmeras, ordenou que circulassem à vontade entre os atores. O ponto máximo desse descontrole se dá quando a cena se desenrola no escuro absoluto, ocasionalmente iluminado por fósforos riscados pelos atores.

Para os personagens de As três irmãs, que habitam os confins da Rússia, Moscou é a promessa de uma vida melhor. No filme, é um destino abstrato, adaptável à imaginação. Coutinho, ao abrir mão de sua conhecida habilidade na condução do próprio filme, o torna aberto para que cada um que procure o seu.

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