segunda-feira, 29 de março de 2010

Polytheama é aberto sem programação


Foto: Priscila Buhr

Goiana (PE) - Boas notícias primeiro: o Polytheama, uma das mais antigas salas de cinema do país voltou a abrir as portas para a população de Goiana. Por 28 anos, o histórico município da Zona da Mata pernambucana assistiu o sucateamento do centenário edifício da Rua Marechal Deodoro da Fonseca, conhecida como Rua Direita, que desde 1912 funcionava como sala de cinema, já havia mudado de nome para Nacar e Rex, e nos últimos dias funcionou como cinema pornô.

A reinauguração do Polytheama aconteceu na noite da última sexta-feira, com direito a festa com fogos de artifício, música da tradicional Sociedade Musical Curica e presença de representantes dos poderes públicos estadual e municipal, doravante responsáveis pela gestão do espaço. A restauração custou R$ 2,2 milhões aos cofres do Programa de Apoio ao Desenvolvimento Sustentável da Zona da Mata de Pernambuco - Promata.

Em 1982 o Polytheama foi comprado pela prefeitura de Goiana, que somente agora, com a conjugação de esforços do governo estadual, conseguiu ressuscitar o local, que volta mais como espaço de múltiplas funções do que para exibição de filmes. Tanto que a primeira atividade do Polytheama, logo após o discursos das autoridades, foi receber o espetáculo A Chegada da prostituta no Céu. O programa elaborado pela coordenação de cinema da Fundarpe em parceria com a Federação de Cineclubes de Pernambuco ficou para o dia seguinte. A recuperação do Polytheama faz parte de um plano de resgate para antigas salas de cinema do estado. A próxima será o Cine Apollo, de Palmares.

O tom sentimental marcou os discursos das autoridades, que evocaram a memória afetiva dos que viveram os dias de ouro do Polytheama. "Este é um momento de restauração de nossa história", disse o prefeito de Goiana, Henrique Fenelon. "Este é um novo espaço para a democratização da cultura. Todas as rotas libertárias passam pela Zona da Mata", disse Carlos Carvalho, diretor de políticas culturais da Fundarpe, em referência direta à revolução de 1817, episódio cuja dramatização O nascimento da bandeira, de Ronaldo Correia de Brito, acontecera minutos antes na Igreja do Carmo. Também estiveram presentes Aloísio Costa, secretário executivo da Casa Civil, José Patriota, Secretário de Articulação Regional e Luciana Santos secretária de Ciência, Tecnologia e Meio Ambiente.

“Me lembro de ter assistido filmes de Rock Lane, Roy Rogers, O Fantasma e o seriado A Caveira do Terror, que passava todas as quarta-feiras”, disse Antônio Nelson, Secretário de Turismo e Desenvolvimento Artístico-Cultural de Goiana, disse que o Polytheama trazia peculiaridades como o apartheid social, que dividia a sala em duas. Do lado da frente, sentavam os que podiam pagar entrada inteira. Os demais, assistiam o filme do lado oposto, que contava com um narrador para traduzir as legendas projetadas ao contrário. Lembrou também de Zefa Deão, personagem constante nas sessões, que se vestia com calça e vestido, chapéu, paletó, usava um cajado e um cachimbo. “Ninguém sentava na primeira cadeira da esquerda, que era reservada para ela”.

Disfarçadamente, a história se repete. Na reinauguração do Polytheama, primeiro entraram as autoriadades; depois, os bem vestidos; para então, pouco antes da peça começar, os demais ocupassem as cadeiras vazias. Enquanto o público assistia a peça do lado de dentro, numa das paredes externas do Polytheama um grupo de jovens do Cineclube Iapoi projetava o curta Engenho Prado – guerra de baixa intensidade. “Nossa crítica não é à ausência de filmes na noite de sexta, pois eles foram exibidos no sábado e domingo, mas porque nem todos puderam ter acesso ao evento”, disse Caio Dornelas, do cineclube.

A reforma do Polytheama custou quase o dobro do que a do Cine São Luiz (R$ 1,2 milhão) porque o Polytheama estava em ruínas e precisou ser praticamente re-erguido, do piso ao teto. Instalações elétricas, hidro-sanitárias, sistema de combate a incêndio e de climatização não foram recuperados, mas substituidos por novas unidades. Para receber espetáculos, há equipamento de cenotecnia (sonorização, projeção e iluminação) e camarins. O complexo ainda conta com salão para exposições, anfiteatro, sala para reuniões e um telecentro com dez computadores, para oficinas e capacitações e um espaço de convivência na cobertura.

A má notícia é que ainda não há programação definida para ocupar o novo espaço, que assim como o Cine Guarany de Triunfo (inaugurado em 2008), fechará as portas logo após o Festival Pernambuco Nação Cultural. “A ideia é que ele tenha uma pauta frequente, definida em gestão compartilhada entre poder público e população”, diz Guilherme Almeida, da assessoria de comunicação da Fundarpe. O primeiro passo nesse sentido será dado em reunião marcada para 15 de abril.

O secretário Antônio Nelson diz que, diferente do suntuoso Cine Urubatã, o maior cinema do interior do estado (1500 lugares), o Polytheama escapou de virar templo ou supermercado. Agora, diz a Fundarpe, ele se torna “locus” da política pública de interiorização da cultura e atenderá a demanda de 19 municípios da região. Por enquanto, não há previsão para o início das atividades contínuas como, por exemplo, a exibição de filmes. Com 220 cadeiras, a sala de exibição conta com uma tela de 7 x 4 metros, projetor digital de 6500 ansi lumens e som estéreo. Há planos para instalação de equipamento de projeção com código Rain, o que permitirá interligar salas estaduais em rede.

(Diario de Pernambuco, 29/03/2010)
*com acréscimos

domingo, 28 de março de 2010

O patrimônio é a própria pessoa



Nos últimos anos, políticas públicas estão sendo criadas para apoiar e fortalecer mestres da cultura popular, que aos poucos vêm saindo do limbo do preconceito para ganhar status de patrimônio imaterial. Mas o que torna o mestre um mestre? Qual a sua importância, o seu papel? Durante o 5º Encontro Mestres do Mundo, em Limoreiro do Norte, interior do Ceará, o Diario conversou sobre o assunto com aqueles assim considerados e também para os que neles reconhecem pulsante sabedoria. A maioria diz que começou cedo e aprendeu sozinho, observando os mais velhos. E considera que mestre mesmo está lá em cima.

"É o superior", diz Badia Medeiros, que trouxe a viola mineira para os confins de Goiás, onde ganhou o título de "mestre do Sertão". "Aprendi com a natureza e ouvindo os mestres antigos. Com o próprio esforço, aprendi vários instrumentos e a comandar grupos de dança e cantoria. Nosso país tem tudo de boa qualidade, mas precisa ser descoberto".

Nascido em Assaré, terra do grande Patativa, o sanfoneiro Chico Paes começou a dedilhar os oito baixos com oito anos e nunca mais parou. "Pegava a sanfona do meu pai quando ele ia pra roça. Um dia ele me pegou no flagra e em vez de me repreender, liberou o instrumento. Com dez anos, já tocava em festa, acompanhado dele. Com 13, comecei a tocar só". Após uma vida de dedicação ao "pé de bode" (como a sanfona de oito baixos é conhecida por lá), aos 85 anos, Chico acaba de ser contemplado pela Lei dos Tesouros Vivos, que consiste em R$ 10 mil mais um salário mínimo temporário ou vitalício concedidos pelo governo do Ceará.

O pernambucano Zé do Pife ainda não conseguiu esse "diploma", apesar de ter se formado mestre na Universidade de Brasília, onde trabalha desde os anos 1990. Autodidata, ele começou a soprar as primeiras notas nos sítios de São José do Egito. "Ano passado dei oficina para umas 150 pessoas. Deles, sai 20 ou 30 tocando bem". No Mestres do Mundo, Zé do Pife praticamente não parou de tocar e falar sobre vida e arte. De quebra, fez mais alguns aprendizes, entre eles o garoto Alexandre Sawatani, de Limoeiro. Junto à necessidade de sobrevivência, traduzida numa banca de CDs e instrumentos que ele mesmo faz, Zé do Pife traz um cristalino sentimento de missão a ser cumprida. "Enquanto estiver vivo, seguirei ensinando".

Os irmãos Orlângelo Leal e Ângelo Márcio, da banda Dona Zefinha, acreditam que mestre mesmo não se autointitula como tal. "O mestre se legitima pelo respeito e reconhecimento dos seus. Sempre há oportunistas. Mestres de verdade aprenderam com outro mestre, têm longa atividade e uma autêntica preocupação de cuidar e repassar seu conhecimento", diz Leal. "Ele surge de uma relação de convivência. O mestre é você quem identifica e valoriza, de acordo com seu universo de interesse. Se não, vira mística", diz Márcio.

Para o músico Siba Veloso, mestre é uma palavra de várias facetas. "Na minha escola, ela é usada para ofícios muito específicos, como maracatu, ciranda, cavalo-marinho. Numa concepção mais geral, mestre é a pessoa que passa um saber não de maneira organizada ou racional, mas com a vivência ou convivência que a tradição possibilita".

Mas nenhum conceito parece preocupar os mestres da sabedoria popular. Para Zé Borba, o "homem da mata" de Condado, Zona da Mata Norte, simplifica pela raiz. "Mestre é Jesus. Nós apenas fazemos papel de mestre. Trazemos tradição que vem do berço, para que não se acabe".

(Diario de Pernambuco, 28/03/2010)

quinta-feira, 25 de março de 2010

Potencial para comover multidões



Paulínia (SP) - Assim que assumiu a direção do longa Chico Xavier, lágrimas involuntárias escorreram pelo rosto de Daniel Filho. Quinze anos atrás, o mesmo ocorreu com o jornalista Marcel Souto Maior, autor do livro As vidas de Chico Xavier, quando pediu ao médium permissão para publicar o livro. Essas e outras histórias foram contadas ontem, para a imprensa, em coletiva promovida no Teatro Municipal de Paulínia.

Na noite de terça-feira, uma avant-première reuniu cerca de 1.300 pessoas. Com potencial de comover multidões, Chico Xavier tem estreia nacional no dia 2 de abril, data em que o personagem completa 100 anos de nascimento. No elenco, Nelson Xavier, Tony Ramos, Christiane Torloni, Letícia Sabatela, Giulia Gam e Cássio Gabus Mendes.

Souto Maior, que também assina o livro de bastidores atualmente nas lojas, batizou a torrente lacrimal que acometeu a ele e ao veterano diretor de "fenômeno das lágrimas inexplicáveis". Apesar de se considerar ateu, Daniel Filho disse queXavier e Bezerra de Menezes, o "Kardec brasileiro", tentaram mais de uma vez fazer contato mediúnico durante a realização do longa.

Não que o filme tenha sido psicografado - todos negam uma obra espírita, mas sobre um homem incomum, cuja vida de abnegação, bondade e dedicação desperta curiosidade imediata. Abençoada pela conjugação de esforços da Globo Filmes, Sony Pictures e Downtown Filmes, se a produção de R$ 11 milhões fosse ditada por espíritos, de quem seriam os lucros? Apesar de Rodrigo Saturnino Braga, da Sony, ter dito que "a única preocupação é divulgar a mensagem de Chico Xavier", a única filantropia praticada será a fatia de 10% a ser revertida para a Casa da Prece de Uberaba (MG).

Polêmicas em torno do cristianismo estiveram na pauta. "O filme não foi feito para defender a bandeira do espiritismo, ele é mais voltado para os valores de amor e paz que Chico defendia. Quem seria contra isso?", pergunta Bruno Wainer, da Downtown. A resposta não tardou a vir à tona: a Igreja Católica, que negou a utilização de igrejas como locação, o que obrigou a equipe construir uma nos estúdios de Paulínia. "Meu produtor foi levado pelo braço pra fora da sacristia, quando souberam sobre quem o filme era", disse Filho.

Diretor de Se eu fosse você e Tempos de paz, Daniel Filho deu à história de Chico Xavier uma carga melodramática que ainda vai gerar muito choro por aí. Há algumas passagens cômicas, que aliviam a carga emocional de sua sofrida biografia e do oficio de realizar contato com os que já se foram ou, para utilizar um termo espírita, os desencarnados. Tendo como âncora um programa de entrevista em que concedeu a ele notoriedade nacional, Xavier é apresentado em três momentos de sua vida: infância, juventude e maturidade. Enquanto flashbacks do passado contam sua história de forma linear e didática, surge uma trama paralela, em que o diretor do programa (Ramos) e sua mulher (Torloni) sofrem com a perda prematura do filho.

É nesse ponto que o filme deve atingir direto o coração de todos os que perderam entesqueridos. "É a consolidação do Chico no imaginário dos brasileiros. Ele permite o retorno do filho que partiu. Isso mexe muito com as mães, que querem refazer o contato uterino", diz Marcos Bernstein, que roteirizou o livro para o cinema. "O Chico era movido por três sentidos raros e preciosos, o de missão, de doação e de aceitação das dores, as quais agradecia para crescer e voltar melhor. Isso transformou ele num ídolo, num mito", acredita Souto Maior.

Questões mais polêmicas como sua vida sexual, processos judiciais e a permanente desconfiança dos católicos e da mídia são tratados de forma sutil e com desfecho quase sempre favorável ao protagonista, interpretado com impressionante semelhança por um Nelson Xavier de peruca e óculos Ray Ban. "Foi uma das coisas mais arrebatadoras que já fiz na vida", diz o ator, que desde o princípio foi pensado para o papel. "Chico vai me acompanhar para sempre. Enquanto atuava, uma cachoeira de emoção foi tomando conta de mim. Foi algo que ultrapassa o trabalho profissional. Me considerava ateu e hoje não sei dizer. Descobri com Chico que precisamos prestar mais atenção no amor".

* o repórter viajou a convite da produção do filme

(Diario de Pernambuco, 25/03/2010)

Lançamentos, bastidores, Eu indico e ranking da semana

Adrenalina - Das videolocadoras para os cinemas, a sensação do Oscar 2010 chega agora para venda doméstica. Celebrado pela narrativa incomum para um gênero saturado por imagens manjadas e frases de efeito, o longa não consegue evitar o discurso ideológico. Ele continua lá, menos óbvio, disfarçado pelo confinamento de soldados que desarmam bombas e procuram se manter vivos no deserto iraquiano. Pena que a melhor sequência, a que Jeremy Renner sai da zona de conflito e se perde num subúrbio árabe, nem dura tanto. No mais, tome adrenalina.
Guerra ao terror (The hurt locker, EUA, 2009). De Kathryn Bigelow. 131 minutos. Imagem Filmes.

Ressaca - A comédia que atraiu muita gente aos cinemas - e que emplacou no Brasil com uma piada a mais no título que parodia a campanha de trânsito - faz graça com o antigo mote da despedida de solteiro que termina em confusão. No caso, provocada por um trio de amigos que elege Las Vegas como cenário para a farra, que foi tão sem limites que no dia seguinte um deles sumiu e os dois restantes não se lembram como um bebê, um tigre e uma bagunça monumental foram parar no quarto do hotel. Além da ressaca, a eles só resta decifrar esse quebra-cabeças.
Se beber, não case (The hangover, EUA, 2009). De Todd -Phillips. 100 minutos. Warner.

Antonioni - Com músicas de Pink Floyd, The Youngbloods, Grateful Dead e Rolling Stones, o mestre do cinema mundial aborda a contracultura norte-americana, em ebulição na virada dos anos 60-70. Segundo de uma série de três filmes falados em ingês (os outros são Blow up e The passenger), aqui temos dois jovens estudantes engajados na luta contra o "sistema". Com seu relevo árido e e rico em contrastes luz-sombra, Zabriskie Point fica em um Parque Nacional dos Estados Unidos, locação utilizada por Antonioni de forma bastante experimental.
Zabriskie Point (EUA, 1970). De Michelangelo Antonioni. 113 minutos. Europa.

Clássico - Por décadas, os estúdios Disney mantiveram hegemonia com desenhos animados voltados para o imaginário infanto-juvenil e da literatura universal. Agora que a tecnologia digital recria a realidade ao bel prazer, os limites das técnicas tradicionais viram recurso de linguagem para os mais nostálgicos e pais interessados em oferecer para os filhos desenhos parecidos com os que assistiram quando crianças. Assim, a clássica história da princesa que beija o sapo-príncipe ganha variações, em que a princesa é negra e se transforma em perereca antes de outra tradição: o final feliz.
A princesa e o sapo (The princess and the frog, EUA, 2009). De Ron Clements e John Musker. Disney.

Bastidores
O Festival de Toulouse, na França, promove esta semana uma retrospectiva de oito curta-metragens do crítico e realizador Kleber Mendonça Filho. A primeira sessão foi ontem e a próxima será no sábado. Os filmes também podem ser assistidos em boa qualidade via internet, aqui.

A jornalista Silvana Marpoara apresenta amanhã seu documentário Mulher além da maré, sobre mulheres pescadoras de Itapissuma, no Litoral Norte. Será às 11h, no auditório do Posmex, no Departamento de Educação da Universidade Rural de Pernambuco.

Três festivais estão com inscrições abertas para curtas e longa-metragens. Até 30 de abril, o Cine Ceará recebe candidatos de toda a América Latina. Regulamento e ficha de inscrição no site. O resultado sai até 15 de maio e o festival será de 24 de junho a 1º de julho.

O Festival Paulínia de Cinema mantém período de inscrições até 21 de maio, desde que o filme seja inédito no circuito comercial e não tenha sido premiado em festival. Ficha de inscrição e regulamento no site. O festival acontece entre 15 e 22 de julho, no interior paulista.

Já a segunda edição do Animage - Festival Internacional de Cinema de Animação de Pernambuco recebe inscrições até 2 de abril. O festival será entre 21 e 27 de maio. Informações: www.animagefestival.com.

O Cinema da Fundação exibe Direito de amar (A single man) em regime de pré-estreia, no sábado. Dirigido pelo estilista Tom Ford, o filme rendeu indicação ao Oscar de melhor ator para Colin Firth. Domingo, outra sessão especial: O processo de Joana d'Arc (Le procès de Jeanne d'Arc, França, 1962), de Robert Bresson.

No circuitão, uma boa novidade: entra em cartaz A caixa, refilmagem de episódio de Twilight Zone.

Eu indico

Achei massa o filme Distrito 9, porque tem uma abordagem diferente dos outros, sobre alienígenas que invadem a Terra. Eles não são mostrados como superiores, mas como vítimas, pois sua nave espacial quebrou sobre Johannesburgo, na África do Sul, e os humanos os colocaram num lugar que lembra um campo de concentração. O diretor conseguiu tratar da miséria humana de uma forma peculiar. E a mutação do humano em ET faz uma metáfora de que, não importa de onde se venha, se nos retiram a dignidade passamos para o estado da barbárie. Nunca tinha visto um filme de alienígenas assim.
Jr. Black, músico e ator

Os mais locados
Se beber, não case
Harry Potter e o enigma do príncipe
Apenas amigos
O contador de histórias
O advogado do diabo
18 anos e ainda virgem
666 - o filho do mal
Impacto final
9º Pelotão
2 dias em Paris

Fonte: www.saraiva.com.br

terça-feira, 23 de março de 2010

Espetáculos da cultura popular



Uma centena de representantes da cultura popular de todos os cantos do Brasil se reuniu por quatro dias em Limoeiro do Norte (CE), a convite do 5º Encontro Mestres do Mundo. De chapéus e roupas floridas, mestres da música, da dança, da oralidade, do artesanato e de diferentes manifestações religiosas deram à pequena cidade do Vale do Jaguaribe cearense um colorido diferente do usual. Mestres pifeiros, bonequeiros, ceramistas, bordadeiros, sineiros, do jongo, do fandango, do lundu, da curraleira, coco e cordel, a semear sonho e poesia nesse mundinho cada vez mais sem graça.

Promovido pelo governo do Ceará em parceria com o MinC, o evento é de mestres para mestres, uma espécie de convenção com direito a conferências e showcases durante o dia e apresentações musicais durante a noite, num palco principal caprichado, com som e luz de qualidade e um tablado para grupos de dança que virava pista nos shows mais concorridos como o da Velha Guarda da Portela (RJ), Renato Borghetti (RS) e Siba e a Fuloresta (PE). Os três são tidos como exemplos a serem seguidos, no sentido de que transmitem a cultura popular com dignidade, renovam seu público e a formatam como produto universal, bem acabado.

"Esse tipo de cultura no Brasil vem de uma longa história de isolamento e segregação, e ainda considerada muito inferior. Por isso precisamos valorizar encontros como esse, que lentamente possibilitam que gerações futuras construam um conhecimento menos fechado, com mais diálogo e em outros níveis de sociedade", diz Siba, que encerrou o evento na noite de sábado.

Essa noção/ambição de atingir o status de espetáculo parece estar clara para boa parte dos mestres e seus produtores presentes no evento - alguns mais do que outros. Por um lado, os extrovertidos Zé do Pife, Zé Borba e Irmãos Aniceto foram assediados em tempo integral por inúmeras câmeras e gravadores, disposta a registrar cada passo, palavra e olhar de figuras naturalmente capazes de gerar imagens tão diferentes e belas. Outros são como "Seu" Badia, violeiro do norte de Minas radicado em Goiás, onde mantém uma oficina para instrumentos de corda - preferem a discrição.

No dia a dia do evento, não foi raro o surgimento de hits, outro fenômeno da cultura de massa. Dentre eles, destaque para a música caipira de Amarildo Pereira, que trouxe de Lagoinha (SP) a toada A véia que o trem matou, morreu e Paraíba do Forró, que fez o forró Jazz do Jegue, com direito a uma interpretação do animal digna de um Screamin' Jay Hawkins. Risadas e aplausos para eles.

Orlângelo Leal, do grupo cearense Dona Zefinha, diz que a cultura digital e seus mecanismos de registro e disseminação não somente permitem mais acesso a culturas antes ignoradas pelas grandes mídias, como provoca uma renovação nas tradições populares. "A tecnologia em breve vai gerar mestres mais urbanos", diz Leal. Clerton Martin, presidente da Comissão Cearense de Folclore, diz que a cultura popular em si já é um espetáculo, mas que determinados grupos, como o de Dona Expedita dos Santos (Tianguá - CE) se manifestam não para o público, mas para o santo, no caso, São Gonçalo.

Além de mestres e mídia, um encontro como o Mestres do Mundo reúne todos os atores do universo da cultura popular: antropólogos, pesquisadores, aprendizes e o tradicional grupo de jovens admiradores classe média, disposto a cantar todas e dançar a cada toque de tambor.

Educação patrimonial

Mal saiu do banheiro e o pernambucano Zé do Pife se viu cercado por um grupo de estudantes ávido para filmar, fotografar e gravar sua voz. Através da tecnologia, queriam esquadrinhar a figura do mestre, seu conhecimento, o DNA que faz dele um patrimônio vivo.

A atividade faz parte do programa Patrimônio para Todos, realizado desde o ano passado pela Secretaria de Cultura do Ceará. Para privilegiar o encontro, o foco é a experiência dos mestres. A busca é pela memória e afetividade como patrimônio imaterial. O site reúne textos e imagens produzidos no evento.

"Nos interessamos em como o jovem vê o patrimônio, longe do olhar oficial, mas como agente de definição e proteção", diz Juliana Marinho, coordenadora do programa. "Partimos da vivência própria, pois eles já convivem com o patrimônio no dia a dia, basta que se contextualizem como agentes da cultura. Isso cria um olhar diferente", diz o arte-educador Antonio Vieira da Silva.

Já estava na hora de voltar para a sala de aula e descarregar as fotos do dia, mas os jovens exploradores da cultura popular não queriam deixar o evento, com tantos personagens interessantes para descobrir. "Ele sabe tocar muito bem o instrumento, mesmo sem saber ler e escrever", percebeu Larissa da Costa, sobre Zé do Pife. Vinícius Domingos quer conhecer os Estados Unidos, mas descobre a poesia do mestre com o mesmo interesse que reserva para os estudos da língua inglesa. "Percebi na voz e na emoção o contexto de onde eles vivem".

Sua colega, Letícia da Costa Araújo, aprendeu a relacionar o canto dos declamadores com a tradição dos trovadores medievais. "Eles mostram o que realmente é a vida", disse a estudante. Marina Hollanda repara que às vezes é mais fácil valorizar a cultura de outros países do que a feita na região em que vive.

"Uma coisa é fazer cultura popular na plástica daqui, outra é fazer na comunidade, enfrentando o preconceito, afirmando nossa identidade", diz Beth de Oxum, do Coco de Umbigada, em Guadalupe, Olinda. Pertinente lembrança de que, para além da dimensão estética, cultura popular também é política.

(Diario de Pernambuco, 23/03/2010)

segunda-feira, 22 de março de 2010

Cinema contra a intolerância


Paulette (Brigitte Fossey), a garota órfã de Brinquedo Proibido

O Cinema Apolo recebe a partir de hoje uma mostra de filmes especialmente escolhidos para promover o debate sobre a cultura da paz e tolerância às diferenças. A programação faz parte do Projeto Paralelos - Somos todos humanos, criado pelo ator Germano Haiut.

As sessões são gratuitas e incluem obras-primas do cinema como Brinquedo proibido (Jeux interdits, França, 1952), de René Clément e Noite e neblina (Nuit et Brouillard, França, 1955), em que Alain Resnais revisita os campos de concentração abandonados e inclui imagens de arquivo gravadas durante a atividade nazista.

A maior parte desta seleção remete aos horrores do nazi-fascismo e suas consequências, mas o foco maior é discutir o fenômeno da intolerância na sociedade contemporânea, tema que o projeto continuará investigando nas próximas edições. "Os filmes são atemporais, pois dizem respeito às minorias. Queremos lembrar a intolerância como uma constante na nossa história, pois hoje há o holocausto no Sudão, na Palestina, no Santo Amaro", diz Haiut.

Nesse sentido, contribui muito o filme Escritores da liberdade (Freedom Writers, EUA, 2007), de Richard LaGravenese. Nele, a atriz Hillary Swank faz o papel de uma professora idealista que ensina cidadania a alunos que enfrentam problemas raciais e a violência na periferia de Los Angeles, nos anos 1990. "Esse filme devia passar em todas as escolas para adolescentes", diz o idealizador do projeto.

A seleção foi feita por Haiut, em parceria com as produtoras Tatiana Braga e Sarah Hazin, "uma representando os judeus e outra os árabes", brinca Haiut, ele mesmo de família judaica - seu pai, Josef Haiut, vivia na Romania (atual Moldávia) e foi naturalizado brasileiro em 1935. "Os familiares que ficaram na Europa foram extintos na Segunda Guerra", conta Haiut. Além dos filmes acima citados, ele destaca Arquitetura da destruição, com narração do ator Bruno Ganz, que já interpretou Adolf Hitler no filme A queda, de 2003

A mostra de cinema inaugura a terceira fase do Projeto Paralelos,que começou em janeiro com a exposição Anne Frank - uma história para hoje, disponível na Galeria BNB/MinC Regional Nordeste (Rua do Bom Jesus, 237 - Recife Antigo) e antes circulou em diversos países. Outra exposição - esta, montada na Casa da Fundação Safra (Rua do Bom Jesus, 191) - é Desenhos das crianças de Terezín, com obras de crianças que viveram num campo de concentração da antiga Tchecoslováquia. As duas exposições foram vistas por cerca de 5 mil pessoas e contaram com a presença do presidente Lula, que visitou as exposições no Dia Internacional em Memória Às Vítimas do Holocausto.

"O holocausto não foi só na câmara de gás. Vivemos num país com um dos maiores índices de desigualdade do mundo. As políticas sociais existem, mas quando vamos para qualquer bairro menos privilegiado, dá pra sentir que ainda falta muito", afirma Haiut, que para provocar debates, convocou palestrantes que coordenarão as conversas com o público, além de representantes das polícias Civil e Militar, escolas públicas, universidades, Corpo de Bombeiros, ONGs e representantes ligados à defesa das minorias estão sendo especialmente convidados pela organização. Na semana que vem, o programa se repete, com novos debatedores.

As atividades do Projeto Paralelos seguem até o próximo dia 31, quando será lançado o livro Dossiê Ditadura - Mortos e desaparecidos políticos no Brasil - 1964 a 1985 (Imprensa Oficial, R$ 60), organizado por Criméia de Almeida, Janaina de Almeida Teles, Suzana K. Lisboa e Maria Amélia Teles.

Mostra de Cinema do Projeto Paralelos

Hoje
14h30 - O Diário de Anne Frank, de George Stevens (debate com Sandro Coza Sayão)
18h - Arquitetura da destruição, de Peter Cohen (debate com Jorge Zaverucha)

Amanhã
14h30 - Escritores da liberdade, de Richard La Gravenese (debate com Genilson Marinho)
18h - Noite e neblina, de Alain Resnais (debate com Jorge Benvenuto)

Quarta-feira
14h30 - O menino do pijama listrado, de Mark Herman (debate com José Mário Austregésilo)
18h - Brinquedo proibido, de René Clément (debate com Dr. José Paulo Cavalcanti Filho)

Segunda-feira (29 de março)
14h30 - O Diário de Anne Frank, de George Stevens (debate com Chico de Assis, Alberto Vinícius, Amparo Araújo e Marcelo Santa Cruz)
18h - Arquitetura da destruição, de Peter Cohen (debate com Geneton Moraes Neto - a confirmar)

Terça-feira (30 de março)
14h30 - Escritores da liberdade (debate com Ronidalva Melo)
18h - Noite e neblina, de Alain Resnais (debate com Frei Tito)

Quarta-feira (31 de março)
14h30 - O menino do pijama listrado, de Mark Herman (debate com WilfredGadelha)
18h - Brinquedo proibido, de René Clément (debate com Rodrigo Pelegrino)

(Diario de Pernambuco, 22/03/2010)

sexta-feira, 19 de março de 2010

Policial em crise



Com toda a estranheza que possa causar, o filme romeno Polícia, adjetivo (Politist, adjectiv, 2009) atinge em cheio a atual discussão sobre drogas, o anacronismo da lei e o consequente dilema ético de seus representantes, a polícia. Não foi à toa que, no último Festival de Cannes, o novo longa de Corneliu Porumboiu (A leste de Bucareste) ganhou o prêmio do júri na mostra Un Certain Regard e foi eleito o melhor pela crítica. Sua investigação de costumes se dá principalmente na estética, o que impõe ao filme um ritmo lento, burocrático e repetitivo a ponto de mexer com os brios do mais paciente dos espectadores. O filme estreia no Recife hoje, no Cinema da Fundação (Derby).

Eis a missão de Cristi (Dragos Bucur), homem da lei jovem o suficiente para questionar se precisa dar voz de prisão para um estudante que repassa haxixe para os colegas. Eles fumam impunes, num terreno baldio nos fundos da escola, sem saber que são vigiados. A prova do crime? Uma bituca recolhida do chão. Após um sem número de relatórios e carimbos de funcionários do departamento onde Cristi trabalha, seu chefe não tem dúvida e manda prender os delinquentes. Cristi resiste e argumenta que em breve a lei que manda punir a atividade vai cair, como tem sido em toda a Europa.

Polícia, adjetivo funciona como ante-sala. Cruzamos corredores, escadarias, e calçadas inteiras em tempo real. Se algo está prestes a acontecer, o corte nos leva para a próxima cena longa e chata, como a que Cristi aguarda a vez de falar com o chefe enquanto a secretária aperta teclas do computador, infinitamente.

A elipse, recurso utilizado para dar agilidade, aqui recorta a ação cinematográficapelo avesso, um claro desafio à perspicácia de quem assiste e elemento máximo da ironia de um drama que se resolve na base da dicionário. Irredutível no cumprimento da lei, o chefe não se deixa convencer e busca o significado de palavras como “consciência”, “moral”, “lei” e, naturalmente, “polícia”. O plano fixo de quase 20 minutos é o ápice da forma adotada pelo filme, que deixa de fora qualquer cena de ação típica, assim como a montagem frenética dos policiais norte-americanos.

(Diario de Pernambuco, 19/03/2010)

sábado, 13 de março de 2010

A despedida dos três amigos

Brasil perde violentamente o humor de Glauco



O Brasil acordou ontem de mau humor. Na madrugada, o pai de Geraldão, Dona Marta, Doy Jorge, Zé do Apocalipse, Casal Neuras e muitos outros personagens, o cartunista Glauco Villas Boas, foi assassinado a tiros em sua casa, na zona rural de Osasco (Grande São Paulo).

A tragédia - que também vitimou seu filho, Raoni, de 25 anos - deixou artistas, colegas e admiradores consternados. "Perdi boa parte da minha história com a morte do Glauco", disse Angeli, à Folha. "O dia fechou com o desaparecimento do Glauco. Não há palavras para justificar, explicar, entender...", escreveu Maurício de Souza no Twitter.

Segundo a polícia, dez tiros foram disparados por volta da meia-noite de ontem. Glauco foi baleado quatro vezes. Um tiro acertou seu rosto. Os outros atingiram o abdome e o tórax. Seu filho Raoni, que também seguia carreira de cartunista, foi baleado quatro vezes, no tórax e abdome. Ironia do destino, sua última tira, publicada ontem pela Folha de São Paulo, mostra Dona Marta e seu chefe apontando armas de fogo na cabeça um do outro. Em charge do mesmo dia, Angeli desenha um fuzilamento no paredão em Cuba. Já o cartunista Pelicano, seu irmão, desenhou um anônimo que morre e vai para o céu.

Não há consenso para explicar as circunstâncias do crime. A mais provável indica que não se tratou nem de assalto, nem de vingança. Um dos suspeitos foi identificado como Carlos Eduardo Sundfeld Nunes, universitário conhecido da família, que até seis meses atrás frequentava a Igreja Céu de Maria, fundada há 15 anos pelo cartunista, dentro da doutrina do Santo Daime. No fim da tarde de ontem, a família Villas Boas disse à imprensa que Sundfeld queria que Glauco o acompanhasse até a casa de sua mãe, para dizer a ela que ele era Jesus Cristo.

Transtornado e armado com pistola, ele primeiro rendeu a filha do cartunista. Quando Glauco tentou negociar com o agressor, recebeu uma coronhada no nariz, que o deixou ensanguentado. Na sequência, o rapaz ameaçou se matar e Glauco o aconselhou a não fazê-lo. Quando Raoni chegou e viu a cena, Sundfeld deu os disparos.Os corpos foram velados na igreja onde Glauco era líder espiritual de cerca de 300 pessoas.

Trajetória - Nascido em Jandaia do Sul, no Paraná, Glauco tinha 53 anos e era um dos maiores nomes de sua geração. É filho do sertanista Orlando Villas Boas e irmão de Pelicano, também cartunista. Sua carreira começou nos anos 1970, quando publicou as primeiras tirinhas no Diário da Manhã, de Ribeirão Preto, onde foi prestar vestibular para engenharia. O reconhecimento veio cedo, premiado por dois anos consecutivos pelo Salão Internacional de Humor de Piracicaba. Em 1978 passou a colaborar para a Folha de São Paulo.

O sucesso editorial foi obtido nos anos 1980, quando passou a publicar seus personagens em revistas da Circo Editorial, entre elas Chiclete com Banana, Piratas do Tietê e seu próprio título, Geraldão. A parceria com os colegas Angeli e Laerte rendeu momentos antológicos, sendo o maior deles a criação de Los 3 Amigos, que, anos depois, se tornaram quatro, com a entrada de Adão Iturrusgarai. Glauco também trabalhou para a televisão, onde fez parte da equipe de criação dos programas TV Pirata e TV Colosso, da Rede Globo.

"Em plena era digital Glauco continuava fiel à prancheta, desenhando à mão com nanquim. Usava o computador apenas para colorir os trabalhos, depois de escanear cada um deles. Glauco registrou, a cada momento, as transformações pelas quais passou o mundo, o Brasil. Era um profundo conhecedor e crítico da alma humana, mas sempre de maneira bem humorada, provocando reflexões", destaca Ricardo Viveiros, presidente do Salão de Piracicaba.

Amigos se mobilizam
Assim como Henfil - sua principal influência-, Glauco se foi. Sua obra, descrita por Bob Fernandes como dedicada a mostrar políticos no "exercício infantil do poder", deixou uma legião de seguidores e admiradores que cresceram rindo com suas tirinhas e HQs. Querido pelos colegas, sua morte atingiu em cheio a comunidade artística que imediatamente se mobilizou em homenagens. O presidente Lula, que teve sua imagem desenhada por Glauco incontáveis vezes, emitiu nota oficial prestando solidariedade à família, na qual diz que o desenhista paranaense foi "um grande cronista da sociedade brasileira".

Como reação às circunstâncias absurdas da morte de Glauco e Raoni, há uma mobilização nacional para que todas as charges do país tematizem o caso com foco no problema da violência social. "(Glauco) Usava o humor como arma de anteparo à violência. Fica a lembrança de um amigo que fez de sua vida uma história de sucesso no humor gráfico do país. E o compromisso de continuarmos na batalha de enfrentar a violência de nossos dias, com o que melhor sabemos fazer- o humor", diz nota oficial emitida pela Associação Brasileira de Cartunistas.

Na internet, usuários do Twitter se desdobraram em mensagens e lamentos. O site da revista Mad nacional e o Blog da publicação especializada Universo HQ organizaram a reunião que, até o fechamento desta edição, contava com mais de cem cartuns em homenagem ao artista.

"Glauco era a alegria em pessoa. Seu bom humor contagiava todos. Hoje, o cartum ficou sem graça.", diz Samuca, chargista do Diario de Pernambuco e presidente da Associação dos Cartunistas de Pernambuco - Acape, E acrescentou: "Glauco Villas Boas, levaram você, como a tantos outros, de forma estúpida. Deixamos aqui nosso respeito e reconhecimento pelo seu talento, pelo seu humor e pelos personagens e situações que criou. Estas, sim, imortalizadas pelo seu traço".

Amigo de longa data, o cartunista Spacca disse ao Diario que percebe certa lógica na tragédia. "A vida do Glauco sempre foi cheia de acontecimentos insólitos, coisas que só aconteciam com ele. Fica a lembrança de um cara muito gozador, sensível, destrambelhado, que encontrou o eixo e saiu de uma vida junkie para o consumo ritual do Santo Daime. Aprendi muita coisa com ele, desde imitar seu traço, no início de carreira, até a não me levar muito a sério".

Em seu blog, Spacca publicou uma bela homenagem com desenhos e textos. "Ele conservava a irreverência e a rapidez do traço do Henfil, mas a genialidade era dele. Tinha um humor maroto, meio caipira, que era dele mesmo, da família e da cidade dele". Spacca destaca o "absoluto 2D" como a característica marcante de seu traço. "É um desenho egípcio, chapado, bidimensional. Nestes tempos de louvação do 3D, isto merece ser resgatado". E certa vez Glauco disse a ele que o nome "Geraldão" vem da ideia de que o personagem é um homem comum, "geral".

Depoimentos

"O fato é tão chocante que nossa reação não pode ser medida em palavras, mas em um sentimento de dor, luto e desesperança. Apesar disso, nós sairemos do choque. E vamos encontrar caminhos, mesmo que sejam longos, demorados, para contermos essa onda de irracionalidade e desumanidade. Vamos lutar para isso"
Maurício de Souza, criador da Turma da Mônica

"Glauco era o melhor chargista do Brasil. Ele tinha um raro senso de síntese e simplicidade que geram identificação rápida com o leitor. Ele usava isso para colocar o dedo na ferida da política brasileira, sem rancor e com senso de humor"
Álvaro de Moya, jornalista e pesquisador

"Não sei o que dizer. É tudo muito cruel e sem sentido. Glauco, assim como Angeli e Laerte,são muito importantes para mim, que sou da geração seguinte. Glauco tem um trabalho único, original, que divertia as pessoas. E morre dessa forma. Muito ruim"
Lourenço Mutarelli, escritor e desenhista

"Glauco é um dos maiores cartunistas do mundo. Sua produção não mente: para mim, é o rei da composição e da síntese. É quase impossível encontrar uma linha sobrando"
Antônio Clériston, cartunista

(Diario de Pernambuco, 13/03/2010)

sexta-feira, 12 de março de 2010

Abismos da memória


Boas atuações - DiCaprio interroga Kingsley; Ruffalo observa

Em Ilha do medo (Shutter island, EUA, 2010), hoje nos cinemas do Brasil, Martin Scorsese exercita seu métier de forma vigorosa e estimulante. Seu contínuo interesse pela cultura norte-americana rendeu obras marcantes em diferentes épocas e grupos sociais.

O foco do novo filme é a loucura e seu processo de construção através de atos de violência, esta última, especialidade de Scorsese. A ação se dá sempre sob o ponto de vista do investigador federal Teddy Daniels, interpretado por um Leonardo Di Caprio menos galã e mais ator, ao lado de atuações não menos notáveis de Ben Kingsley, Max Von Sydow, Mark Rufallo e Elias Koteas.

Daniels traz consigo a perda da esposa e filhos em situação traumática, que desde então o deixou obcecado com uma instituição psiquiátrica para criminosos insanos mantida pelo governo, onde tem certeza que o assassino de sua família está internado. A casa funciona na remota Ilha Shutter, espécie de Asilo Arkham arquitetado com marca pessoal de Scorsese, onde Daniels inicia investigação que desde o início parece estar fadada ao fracasso.

Na procura de uma paciente desaparecida, ele interroga diretores, funcionários e demais pacientes, enquanto nuvens escuras são o aviso de que eventos nefastos estão a caminho. Enquanto cresce a suspeita de que há uma conspiração para que ninguém deixe a ilha, somos capturados pelo filme, de forma irreversível, até o fim.

Após uma dezena de situações suspeitas e a ingestão de psicotrópicos, há o encontro com a fugitiva, momento em que Daniels, cada vez mais perturbado, chega à descoberta de que experiências sistemáticas com seres humanos estariam sendo feitas na Ilha de Shutter, algo equivalentes aos gulags russos e campos de concentração nazistas, lugares que despertam no detetive outro rol de memórias doloridas.

A trama se passa em 1954, auge da perseguição macarthista a "subversivos" de Hollywood, da histeria anticomunista e da paranóia gerada pela bomba atômica. Não é dificil traçar paralelos entre esse contexto eo clima tenebroso potencializado também pela música, capaz de tornar o ambiente e situações ainda mais sufocantes.

Referências cinematográficas vão do expressionismo alemão, filmes noir e muito de Alfred Hitchcock, o que faz de Ilha do medo mais do que um thriller, mas uma magistral viagem pela cinefilia do diretor. O clássico de 1920 O gabinete do Dr. Caligari, de Robert Wiene, foi a primeira das imagens que vieram à tona para Scorsese quando terminou de ler o livro Paciente 67, de Danis Lehane, também autor do sinistro Sobre meninos e lobos, adaptado para as telas por Clint Eastwood.

O protagonista se movimenta sobre a ilha e abismos da memória, que leva a um diálogo entre ele e o diretor do hospício (Von Sydow, fenomenal) sobre sonho (traum, em alemão), traumas e feridas. Da mesma forma, econômicos na revelação de fatos importantes, Lehane / Scorsese conduzem uma história que coloca em dúvida o limite entre sanidade e loucura. Outra suspeita remete ao questionamento da psiquiatria convencional, até entãodividida entre a intervenção cirúrgica (lobotomia) e a famacológica. Scorsese faz parte da geração que defendia antipsiquiatria, que investigava a loucura como construção social. Não é o caso.

Ao contrário do que o título nacional sugere, Ilha do medo não assusta. Seu horror psicológico não causa repulsa, mas fascina. Assim como a porção de terra por ele retratado, é um território a ser habitado. E como todo grande filme, continua depois da sessão.

(Diario de Pernambuco, 12/03/2010)

Curto-circuito no São Luiz

Nem bem voltou à ativa e o Cine São Luiz voltou a fechar as portas. O motivo é a rede elétrica, que mais uma vez entrou em pane na noite do último domingo, durante sessão de O homem que engarrafava nuvens, de Lírio Ferreira. De acodo com a assessoria de comunicação da Fundarpe, a previsão é que a sala retorne em "curto período de tempo", provavelmente na semana que vem.

Coincidência ou não, Lula Cardoso Ayres Filho, engenheiro aposentado da Celpe, volta a participar de forma efetiva das atividades técnicas do São Luiz e de outros equipamentos geridos pela Fundarpe, que renovará por mais quatro meses o contrato entre sua diretoria de difusão cultural e a Sétima Arte (empresa de Lula) e reconhece publicamente o valor do serviço especializado que tem oferecido.

"Estamos fazendo uma análise minuciosa da subestação para eliminar a ocorrência que gerou o curto-circuito. Acredito que depois dos reparos, a volta será definitiva", diz Lula. Ele diz sentir ambiente favorável para a criação da Cinemateca Pernambucana e um núcleo de preservação de filmes, projetos incialmente vinculados ao São Luiz e que devem encontrar abrigo com a reabertura do Mispe. Nunca estivemos afastados. A volta do São Luiz é maior do que tudo. E o mais importante é que o cinema está pronto. Espero que no futuro possamos participar das discussões que decidem a programação dos filmes".

(Diario de Pernambuco, 12/03/2010)

quinta-feira, 11 de março de 2010

Mito fundador do cinema nacional



Dos mitos fundadores do cinema nacional, Humberto Mauro (1897 - 1983) é um dos maiores. Ao mesmo tempo, seu nome permanece envolto em névoa para a maioria dos brasileiros, inclusive cinéfilos afeitos à filmografia brasileira.

Quais foram as suas convicções? Por que, em meados dos anos 1920 um eletricista do interior mineiro escolheu o cinema como atividade para uma vida inteira? Um importante documento a respeito de Mauro acaba de ser lançado pelo jornalista Ronaldo Werneck, que pesquisou toda a obra e conviveu com o cineasta nos últimos anos de vida. Humberto Mauro revisto por Ronaldo Werneck (Arte Paubrasil, R$ 69,90) reúne entrevistas, depoimentos e rico material iconográfico levantado em seis anos de pesquisa.

O extenso material foi organizado em recorte afetivo e por isso não-linear, o que torna o livro diferente das biografias tradicionais. "Quis deixar o Mauro falar. Embora contenha itens básicos de uma biografia, ele vai se fragmentado, através de impressões que tenho sobre ele, seus filmes e textos escritos por Glauber Rocha, Paulo Emílio Salles Gomes, André Andries E Alex Vianny. "Fui marcando esses textos e fiz um recorte que dialoga com outros livros".



Werneck é natural de Cataguases, cidade que nos anos 20 ficou marcada por um ciclo de produção de filmes semelhante aos do Recife. Vários filmes de Mauro foram rodados lá, como Thesouro perdido (1927) e Brasa dormida (1928). Na década seguinte, iria para o Rio, onde dirigiu Ganga bruta e A voz do carnaval, ambos de 1933. Em 1961, aos 18 anos, o futuro jornalista encontrou o famoso cineasta pela primeira vez, por ocasião de um festival de cinema em que Glauber Rocha também foi convidado. "Era um momento de redescoberta do Mauro. Nequele tempo Glauber estava lançando Barravento", lembra Werneck.

Glauber precisava de referências para seu Cinema Novo e viu no "cinema puro" de Mauro o equivalente a Grifith, a Eisenstein. Em Revisão crítica do cinema brasileiro, Glauber lamenta a falta de apoio a Mauro, Mário Peixoto, Alberto Cavalcanti (que fez seus filmes na Europa) e aos produtores Adhemar Gonzaga e Carmen Santos no momento em que o cinema europeu e norte-americano se afirmavam. Caso contrário, o cinema brasileiro seria poderoso. Mas relativiza: "na Europa ele talvez tivesse feito menos filmes, porque somente no Brasil poderia, numa indústria amadorística, manter integridade profissional e liberdade criadora".

"Glauber dizia que os filmes de Mauro eram puros, não no sentido de primitivos, mas de seminais. Creio que ele se identificava com o antecessor porque ambos faziam cinema de intuição, inaugural, que não bebe em tradição alguma", diz Werneck, que enxerga no cineasta Vladimir Carvalho um continuador dessa linhagem que busca uma linguagem brasileira, com temas brasileiros.


Humberto Mauro e Ronaldo Wernck

A amizade entre Mauro e Werneck começou nos anos 70, após um perfil preparado pelo último para a revista Vozes. "Sempre passava em Volta Grande. Mauro era interessantíssimo no falar, ele falava como se estivesse filmando. Ele era um mineirão bem-humorado, inteligente e curioso. Aliás, ele entrou no cinema pela curiosidade e fascínio pelo equipamento, para saber como a filmadora e o projetor funcionam. Depois, se afirmou como autor".

De volta a Cataguases, no fim dos anos 90, Werneck participou da construção de um centro cultural e um memorial para Humberto Mauro. A pesquisa rendeu dez pequenos filmes e isso me deu muito material. O livro é minha maneira de homenagear Mauro". Avesso às novas tecnologias, Humberto Mauro via no cinema falado uma redundância que fere os ouvidos. Antes, diz ele em texto publicado no livro, a imaginação trabalhava muito mais. Diz também que o cinema brasileiro não precisa caminhar com o cinema estrangeiro e sim transportar para a tela o ambiente brasileiro, para que o público conheça o Brasil através do cinema. Que estranha os Barreto rodarem Dona Flor e seus dois maridos com R$ 2,5 milhões. Que queria filmar o Eclesiastes, começando em Volta Grande até chegar ao Rio Amazonas. Curioso imaginar o que o desbravador mineiro diria sobre o cenário atual.

(Diario de Pernambuco, 11/03/2010)

Coluna Lançamentos / Bastidores

Lançamentos // DVDs

Assombração - Este é um dos melhores filmes de terror dos últimos tempos. E sem a matemática de pregar um susto a cada minuto, o que já é uma ótima qualidade. A ideia é passar a sensação que os eventos demoníacos aconteceram de verdade na vida de Katie e Micah. Por isso, a produção utilizou apenas uma câmera, adquirida pelo casal e pela qual podemos testemunhar as suas noites perturbadas por um espírito maligno. Determinado a entender o que se passa enquanto dormem, Micah traz a câmera para dentro de casa, o que parece irritar ainda mais a entidade. A baixa resolução da imagem e personagens com o nome dos atores aumentam a sensação de veracidade de uma história que nunca foi contada dessa forma.
Atividade paranormal (Paranormal Activity, EUA, 2007). De Oren Peli. Playarte.

Herói da Capoeira - Pela primeira vez no cinema nacional a capoeira é tratada com a dignidade que merece. Através dos ensinamentos de um mestre, jovem negro rebelde (Ailton Carmo) se torna um perigo para o Coronel Venâncio (Flávio Rocha). Aos poucos, o aprendiz se torna o lendário e temido Besouro Cordão de Ouro. O formato que beira o publicitário não deixa de ser uma estratégia de aproximar e atualizar para o grande público os temas da cultura negra brasileira. Nos extras, é possível assistir como foram feitas as cenas de ação, coreografadas por Ku Huen Chiu. A trilha com Nação Zumbi e Gilberto Gil contam a favor.
Besouro (Brasil, 2009). De João Daniel Tikhomiroff. 120 minutos. Disney / Buena Vista.

Espionagem - Soderbergh e Damon retomam parceria que deu certo na trilogia Onze/Doze/Treze homens e um segredo. Alguns quilos acima do peso, Matt Damon é Mark Whitacre, um executivo da indústria química que se torna informante do FBI e delata formação de cartel na multinacional onde trabalha. Só que os relatos de Whitacre mudam o tempo todo, o que gera desconfiança nos agentes da Bureau. Inclui material extra com cenas inéditas. Baseado no livro The informant - a true story, de Kurt Eichenwald.
O desinformante! (The Informant, EUA, 2009). De Steven Soderbergh. 108 minutos. Warner.

Vingança - Após ter esposa e filha assassinadas, o pai de família Clyde Shelton (Gerard Butler) quer vingança. Descrente do sistema judicial, ele prepara violento revide não só ao autor das mortes, mas ao promotor público Nick Rice (Jamie Foxx), responsável pelo acordo que libertou o assassino. A atuação de Butler corresponde à psicologia do personagem, espécie de Charles Bronson com faca de açougueiro na mão. A causa de seu ódio é pessoal, mas seu alvo é institucional: a justiça norte-americana. Apesar do excesso de explosões e frases de efeito, o filme acerta enquanto coloca em dúvida qual das partes tem mais razão. Ao menos aqui não há lição de moral. Escolhe-se dos males, o menor.
Código de Conduta (Law Abiding Citizen, EUA, 2009). De F. Gary Gray. 107 minutos. Imagem.

Bastidores

O cineasta espanhol Antonio Cuadri estará no Recife no próximo dia 26, em evento promovido no Instituto Cervantes. Ele exibe e conversa sobre O coração da Terra, longa dirigido por ele em 2007. O evento inaugura novo projeto do Cervantes, que a cada 15 dias promove sessões de cinema no Museu do Estado.

De 22 a 31 de março, o Cinema Apolo recebe uma mostra de filmes sobre cultura judaica. A programação inclui O menino do pijama listrado, Brinquedo proibido e Arquitetura da destruição, sempre seguidos por debates. A idealização é do ator Germano Haiut.

Em abril chega aos cinemas A morte e a morte de Quincas Berro D'Água, adaptação de Sérgio Machado (Cidade baixa) para romance de Jorge Amado. E o próximo projeto de Machado já está definido: filmar o musical A arca de Noé, de Vinícius de Moraes.

Até o fim do mês, Viajo porque preciso, volto porque te amo, de Marcelo Gomes e Karim Aïnouz, será exibido no Festival Internacional de Filmes de Miami, Cinema du Réel, em Paris e no 25º Festival Internacional de Cinema de Guadalajara, no México, o mais importante da América Latina.

Atenção para Onde vivem os monstros, novo filme de Spike Jonze (Quero ser John Malkovich). Entra amanhã no Box Guararapes e na Sessão de Arte do Multiplex Boa Vista, em horários (bem) pontuais.

Eu indico
O último filme que assisti e indiquei para todos os amigos é À procura de Eric, de Ken Loach. Fiquei encantadíssimo porque o filme junta duas coisas que simplesmente adoro, o futebol e o lado social. Tem o contexto da família do Eric Carteiro, seus filhos envolvidos com drogas e seus amigos que se juntam para ajudar a resolver os conflitos. E tem o Eric Cantona, seu ídolo, que traz tantas mensagens interessantes sobre a vida. Ele, que tem tantos gols históricos, disse ao carteiro que seu momento mais sublime foi um passe. Uma metáfora de que o que torna a vida bonita não são os lances maiores e sim os mais simples. - Samarone Lima, escritor

Os mais locados
Bastardos inglórios
500 dias com ela
Se beber, não case
Tá chovendo hambúrguer
O sequestro do metrô 123
Substitutos
A verdade nua e crua
Te amarei para sempre
Código de conduta
Distrito 9

Fonte: www.blockbuster.com.br

(Diario de Pernambuco, 11/03/2010)

É Tudo Verdade anuncia primeiros selecionados

O festival de documentários É Tudo Verdade anunciou ontem uma lista com quinze produções selecionadas para sua 15ª edição, que acontecerá entre 8 e 18 de abril, em São Paulo e no Rio de Janeiro. O curta pernambucano As aventuras de Paulo Bruscky, de Gabriel Mascaro, está entre os divulgados nesta primeira lista.

Ele concorre na categoria curta-metragem nacional com Bar da estação, de Leonardo Ayres Furtado (MG), Mãos de outubro, de Vitor Souza Lima (PA), Querida mãe, de Patricia Cornils (SP), Xetá, de Fernando Severo (PR), Karl Max way, de Flavia Guerra e Maurício Osaki (SP), Acontecências, de Alice Villela e Hidalgo Romero (SP), Bernnô, de Pedro Gorski (SP) e Se meu pai fosse de pedra, de Maria Camargo (RJ). Assim como o filme de Mascaro, os dois últimos têm como personagem artistas plásticos, no caso, o pintor Bernnô e o escultor Sérgio Camargo.

Para a mostra de longas nacionais, foram selecionados Arquitetos do poder, de Vicente Ferraz e Alessandra Aldé (RJ), O Contestado - Restos mortais, de Sylvio Back(RJ), Eu, o vinil e o resto do mundo, de Lila Rodrigues e Karina Ades (SP), Fora de campo, de Adirley Queirós (DF), Manual prático de como ter sucesso na política brasileira, de Felipe Lacerda (RJ), Programa Casé - O que a gente não inventa não existe, de Estevão Ciavatta (RJ), e Terra deu, terra come, de Rodrigo Siqueira (MG).

Os programas especiais incluem No meio do rio, entre as árvores, de Jorge Bodanzky, Doce Brasil Holandês, de Mônica Schmiedt, e Sobre rios e córregos, de Camilo Tavares. Nos próximos dias, o festival revelará a seleção internacional e novos títulos nacionais inéditos.

(Diario de Pernambuco, 11/03/2010)

terça-feira, 9 de março de 2010

De Hollywood para o Xambá

Como num filme de situações improváveis e interessantes, o ator norte-americano Danny Glover visitou o terreiro Nação Xambá, na periferia de Olinda. Foi na noite da última sexta-feira, onde pode conhecer a história do local, um dos poucos quilombos urbanos do país.

De férias em Pernambuco, onde passou a última semana, ele discretamente quebrou o anonimato para prestigiar o encontro promovido por lideranças negras da cidade. Após atuar em Hollywood por décadas, o famoso ator facilmente reconhecido como parceiro de Mel Gibson em Máquina mortífera e Maverick foi recebido com sobriedade por cerca de 60 artistas e representantes da cultura negra da cidade.

Danny Glover chegou ao Xambá por volta das 20h, ao lado de sua esposa Eliane Cavalleiro, que é presidente da Associação Brasileira de Pesquisadores Negros. Recém-casados, Glover e Cavalleiro foram recebidos pelo babalorixá Adeildo Paraíso da Silva (Ivo de Xambá) e a yalorixá Maria de Lourdes da Silva, a Tia Lourdes. Antes de entrar na casa, fez reverências de respeito e adentrou o terreiro, onde ouviu toques para Iansã e Oxum. Na sequência, subiu para o primeiro andar, onde visitou um memorial de cultura negra, com ênfase para a história do local. Logo após, por cerca de uma hora, Glover falou sobre a importância do engajamento social para comunidades negras.

"É importante motivar instituições como esta. Quando Dona Biu fundou esta casa, ela sabia que existe algo superior para procurar. Lembrando ela, podemos descobrir novas maneiras de ser uma comunidade", disse Glover. Embaixador do Unicef, sua carreira inclui papéis que remetem a preocupação social. Nesse sentido, seu personagem mais emblemático é o de Albert, em A cor púrpura (1985), de Steven Spielberg. Ainda nos anos 80, interpretou Mandela para a TV e no ano passado encarnou um presidente humanista no blockbuster 2012. Não participou da festa do Oscar na noite de domingo, mas enviou uma carta convocando seus colegas atores a boicotar roupas da Hugo Boss, que ameaça fecharfábrica nos EUA para investir em unidades na Europa Oriental.

Na mesa onde falou, Glover recebeu presentes e lembranças: CDs dos rappers Zé Brown e Tiger, parceiros no Faces do Subúrbio; o DVD Cine Favela, do projeto Pé no Chão, do qual participa o DJ Big; o livro Baobás de Ipojuca, da escritora Inaldete Pinheiro; o CD do Grupo Korin Orishá, regido pelo professor José Amaro, do departamento de música da UFPE. Representando a prefeitura do Recife, Lindivaldo Júnior preparou um kit que incluiu CDs do carnaval e produtos do Núcleo de Cultura Afro-Brasileira.

"Foi algo exclusivo, um ator de filmes internacionais num centro de representação espiritual negra, ouvir nossa música, experimentar da nossa comida. Pela história que o centro tem, essa visita dele vai passar de geração em geração. Seria bom que outros como ele pudessem vir", disse Zé Brown. Percussionista da Nação Zumbi, Gilmar Bolla 8 também estava lá. "Esse é um momento especial para a comunidade negra. E para ele também, que vai lembrar da visita pelo material que recebeu aqui".

Vera Baroni, da Sociedade das Mulheres Negras de Pernambuco, entregou ao ator uma resolução publicada no Diário Oficial, em que um site mantido por igreja evangélica foi punido por discriminação religiosa. De formação cristã, Glover ganhou uma guia de Xangô, "pela luta", nas palavras de Ivo de Xambá. "A visita de um ator como ele é um incentivo para que se abram portas internacionais num recorte que não diz respeito apenas à religião, mas ao lugar do negro na sociedade", disse Ivo.

Determinada a extrair o máximo do encontro, Inaldete Pinheiro provocou discussão sobre o fato de negros ricos dos EUA agirem como mobilizadores dos pobres, enquanto no Brasil passam pelo processo de "embranquecimento". Formado em economia, Glover repassou episódios importantes para a afirmação negra nos EUA e questionou o sentido de palavras como liberdade, independência e autonomia.

"Na América do Sul há 150 milhões de afrodesendentes e 97% vivem na pobreza, a maioria no Brasil. Vejo que a luta do povo americano acontece aqui também, para que os negros tenham vida melhor. Em alguns países, talvez por motivos políticos esses sonhos não se realizem, mas ao menos o desejo de liberdade está na alma do povo. Precisamos passar essa resistência para as novas gerações".

(Diario de Pernambuco, 09/03/2010)

segunda-feira, 8 de março de 2010

Os sonhadores



Um filme brasileiro que começa com uma música famosa do Radiohead é algo, no mínimo, para ficar com as orelhas em pé. Pois Quanto dura o amor?, segundo longa de Roberto Moreira (Contra todos, 2003) não só elegeu High and dry como música-tema, como mostra a cantora Danni Carlos entoando uma versão para voz e violão num pub da Rua Augusta, em São Paulo.

A atitude arriscada rendeu resultado acima da média, grande parte graças à linda combinação de fotografia e som capaz de ordenar o caos que é o panorama urbano da metróple, ao mesmo tempo em que traduz a delicadeza das situações vividas por tipos urbanos eleitos pelo roteiro.

Um deles é Marina (Sívia Lourenço), garota do interior que tenta investir na carreira de atriz. Ela aluga um quarto no apartamento de Suzana (Maria Clara Spinelli), advogada independente e bem sucedida que parece precisar mais da companhia do que do dinheiro da nova inquilina. Da Consolação, onde agora mora, à Augusta é um pulo, e lá vai Marina ao pub onde começa seu mergulho no mundo noturno da supracitada performer que, como saberia logo mais, tem tatuagens e se chama Justine.

Paralelamente, Suzana se envolve com um colega do fórum e fica ansiosamente empenhada para que tudo dê certo. Marina, assim como o filme, acompanha o caso à distância. Outro vizinho Jay (Fábio Herford), misto de urbanóide e escritor frustrado ridiculamente apaixonado por uma garota de programa (Leilah Moreno). No auge de suas paixões, todos acreditam que podem atingir grandes objetivos. O destino cruel para o qual os amantes se arremessam os colocam de olhos abertos para a cidade. E nesse momento, a humanidade se divide entre fumantes e não fumantes.

Em coletiva à imprensa, no último Festival de Paulínia (onde o filme foi lançado), Moreira contou que para High and dry entrar na trilha sonora, foi preciso enviar uma cópia do filme para os integrantes do Radiohead. Mais do que isso, a produção do longa enviou duas versões. Uma com, e outra sem a composição desejada. A presença da música na produção dá a entender que Thom Yorke, Jonny Greenwood e cia entenderam a importância da canção para a construção do clima melancólico e delicado da produção.

(Diario de Pernambuco, 08/03/2010)

Seis Oscar para Guerra ao Terror



Guerra ao terror foi o grande vencedor da 82ª cerimônia do Oscar, que anunciou na noite de ontem as produções e profissionais eleitos pela Academia de Cinema de Hollywood. O filme sobre soldados que vivem em constante tensão desarmando bombas em território iraquiano ganhou em seis das nove categorias a que foi indicado. Primeira mulher a receber o prêmio de melhor diretora, Kathryn Bigelow ficou visivelmente surpresa quando Tom Hanks revelou a premiação máxima, por volta das 2h da madrugada.

Ao privilegiar a dura realidade da guerra à fantasia escapista em 3D, Hollywood consagra uma produção “pequena” (cerca de US$ 10 milhões) que passaria despercebida não fosse os senhores da Academia notarem o rebuliço da crítica. Na exorbitância de seus US$ 500 milhões, Avatar ficou com três estatuetas. Efeitos visuais e direção de arte são mais do que merecidos, mas como explicar o prêmio de melhor fotografia se 99% de suas imagens são criação digital?

Além de Bigelow, outra mulher (hoje é seu dia internacional) brilhou na noite do Oscar: Sandra Bullock, pela atuação no drama Um sonho possível. Destaque nos dois mundos (na noite anterior foi eleita a pior do ano pelo Framboesa de Ouro), ela concorreu lado a lado com Meryl Streep, a estreante Gabourey Sidibe foi elogiada por Oprah Winfrey. Seu trabalho é excelente, mas não conseguiu se sustentar frente ao sucesso financeiro do filme capitaneado por Bullock.

Os favoritos se confirmaram em quase todas as categorias: grandes atuações de Jeff Bridges (Bafta, Critics Choice, Globo de Ouro), Christoph Waltz (Cannes, Bafta Globo de Ouro) e Mo’Nique (Critics Choice, Globo de Ouro). Já longa o argentino O segredo de seus olhos, de Juan José Campanella, foi uma zebra que caiu sobre o franco favorito A fita branca, de Micheal Haneke.

O Oscar 2010 começou por volta das 22h30, no Brasil via TV paga. meia-noite, quando assim permitiu a Rede Globo, detentora dos direitos de exibição na TV aberta brasileira. Parte dos excluídos foram salvos pelo Twitter e sua diversidade de comentaristas que colocaram Rubens Ewald Filho e José Wilker no chinelo.
Esperava-se que, como sugeriu o slogan “você nunca viu um Oscar como esse”, a cerimônia ficasse mais enxuta e dinâmica. Funcionou na primeira meia hora, que premiou melhor ator coadjuvante, animação, roteiro e canção original (com todos os candidatos num único clipe, em vez das tradicionais interpretações). Mas não tardou para o ritmo se arrastar para aquele velho sonífero a desafiar os mais bravo dos maratonistas. O interesse só voltou à tona na reta final, quando candidatos a melhor ator e atriz foram apresentados por parceiros de trabalho.

Homenagem do ano foi para o veterano diretor John Hughes, liderada por Matthew Broderick, Molly Ringwald e Macaulay Culkin, atores de três de seus filmes mais emblemáticos, Curtindo a vida adoidado, A garota de rosa shocking e Esqueceram de mim. No obituário, em que os famosos falecidos no último ano são lembrados, surgiu a sensação de que In my life em voz e violão de James Taylor não foi uma boa ideia.

OS PREMIADOS

Filme
Guerra ao terror

Diretor
Kathryn Bigelow (Guerra ao terror)

Ator
Jeff Bridges (Coração louco)

Atriz
Sandra Bullock (Um sonho possível)

Ator coadjuvante
Christoph Waltz (Bastardos inglórios)

Atriz coadjuvante
Mo’Nique (Preciosa- uma história de esperança)

Animação
Up – altas aventuras

Roteiro original
Guerra ao Terror, de Mark Boal

Roteiro adaptado
Preciosa

Filme estrangeiro
O segredo de seus olhos (Argentina)

Edição
Guerra ao terror

Direção de arte
Avatar

Fotografia
Avatar

Efeitos visuais
Avatar

Figurino
A jovem victoria

Maquiagem
Star Trek

Trilha sonora
Up – altas aventuras

Canção original
The weary kind, de T-Bone Burnett e Ryan Bingham - (Crazy Heart)

Documentário de longa-metragem
The cove

Documentário de curta-metragem
Music by Prudence

Curta-metragem
The new tenants

Curta-metragem de animação
Logorama

Edição de som
Guerra ao terror

Mixagem de som
Guerra ao terror

(Diario de Pernambuco, 08/03/2010)

domingo, 7 de março de 2010

O recado de Hollywood



Em um, triunfa a forma; no outro, a substância. Neste domingo à noite saberemos qual o recado de Hollywood para o mundo. Vence Avatar, produto eficaz do processo de colonização cultural em curso, detentor do mais estratosférico lucro via tecnologia de ponta já obtido com discurso ecologicamente correto? Ou Guerra ao terror, que conecta a linguagem cinematográfica ao drama geopolítico do momento?

Previsto para iniciar às 22h (horário de Brasília) no Kodak Theatre, Los Angeles, o 82º Academy Awards, o Oscar 2010, tem recebido atenção acima da média se comparado com edições anteriores. Boa parte por conta do embate entre os favoritos aos prêmios principais. Os filmes de James Cameron e Kathryn Bigelow estão indicados para nove categorias, empate que parece não ter nada de acidental. Disputas acirradas garantem audiência, e nada como uma briga de casal (Cameron e Bigelow foram casados por três anos) para esquentar a festa de logo mais.

A mídia mundial responde à altura,e nas últimas semanas têm dedicado espaço nobre para cada episódio. O último diz respeito ao processo judicial encampado por um sargento do exército americano aos produtores de Guerra ao terror, cujo roteiro ele alega ter sido baseado em sua experiência no Iraque. Curioso o fato do filme ter sido lançado há um ano, e somente agora, a menos de uma semana do Oscar, o sujeito tome consciência disso. Outro revés para Guerra ao terror foi o envio de emails depreciando seu principal concorrente a membros da Academia. Como punição, o co-produtor Nicolas Chartier, autor das mensagens, está proibido de participar da cerimônia. Mais um barrado de última hora - este por motivos de segurança moral - é o comediante inglês Sacha Baron Cohen. Ele faria uma sátira à Avatar, mas considerando o que o criador de Borat e Brüno é capaz, os produtores da festa decidiram não arriscar.

Em meio à batalha dos gigantes, nada resta aos demais concorrentes, senão aguardar. Seria uma ousadia se Distrito 9 ou Bastados inglórios, filmes que se sustentam em qualquer círculo cinéfilo, ganhassem o prêmio principal. Esborram sangue pelos ladrões e são muito experimentais para os senhores da Academia. Já Preciosa - uma história de esperança e Um sonho possível, com suas tramas de sofrimento e superação, têm tudo para comovê-los. O trabalho de suas atrizes - Gabourey Sidibe e Mo'Nique no primeiro e Sandra Bullock no segundo - está entre os favoritos à estatueta.

Quanto a Up - altas aventuras, o simples fato de ser indicado representa uma vitória para os desenhos animados. Antes dele, somente A bela e a fera (1991) havia conseguido a proeza. Deve ganhar o de melhor animação, a despeito do belo trabalho de Wes Anderson em O fantástico Senhor Raposo. A produção inglesa Educação e Um homem sério devem ficar a ver navios - só faz dois anos que os Coen levaram quatro Oscar por Onde os fracos não têm vez (2007). Amor sem escalas poderia colocar George Clooney como favorito a melhor ator, não fosse a interpretação arrebatadora outro candidato: Jeff Bridges, que vive um astro da música country em decadência em Coração louco.

Entre os filmes estrangeiros, o favorito é A fita branca, que conseguiu furar o bloqueio e ser indicado também a melhor fotografia, verdadeira obra-prima em um filme distante daquilo que se supõe ser o gosto da Academia. É o caso de outro sério candidato, o peruano A teta assustada. Fica a lição aos brasileiros, que indicam filmes supostamente alinhados à linguagem do cinemão americano e ficam a ver navios.

(Diario de Pernambuco, 07/03/2010)

Audiência de milhões



Chegou a hora de conhecer os eleitos da indústria de filmes norte-americana. Quando for ao ar, a entrega do Oscar 2010 deve atrair bem mais audiência do que no ano passado. Será que o embate Avatar x Guerra ao terror irá superar os mais de 57 milhões de espectadores que assistiram à vitória de Titanic em 1998? Apresentada por Alec Baldwin e Steve Martin, a duvidosa dupla de Simplesmente complicado, a cerimônia deve ganhar mais dinâmica agora que os números musicais foram abolidos.

Na TV paga, o público brasileiro pode assistir o evento na íntegra pelo canal TNT, com áudio original, apresentação de Chris Nicklas e comentários de Rubens Ewald Filho. Na TV aberta, a Globo transmite a cerimônia depois do Big Brother Brasil (ou seja, apenas a parte final), com narração de Maria Beltrão, comentários de José Wilker e tradução de Branca Vianna. A cerimônia estará disponível também na internet, via site oficial do Oscar (www.oscar.go.com). Confira o perfil que o Diario de Pernambuco preparou para os dez indicados aos prêmios principais.

Avatar
A superprodução de James Cameron superou a bilheteria de Titanic, do mesmo diretor, mas certamente não baterá seu recorde de onze estatuetas. E nem precisa. É a produção mais cara, maior bilheteria, divisor de águas na história da tecnologia de criação de imagens. Avatar remete a preocupações ecológicas e critica a voracidade colonialista dos países ricos e a Academia de Cinema adora discursos politicamente corretos. O filme é uma mistura de aventura e ficção-científica, gênero tradicionalmente preterido. Seria Avatar o primeiro a quebrar mais essa barreira?

Guerra ao terror (The hurt locker)
O filme dirigido por Kathryn Bigelow, ex-mulher de Cameron, é principal rival de Avatar. Ambientado no Iraque, Guerra ao terror é adrenalina pura e investe na paranoia em torno dos homens-bomba e armadilhas afins. Seu protagonista é o sargento William James (Jeremy Renner, indicado a melhor ator), o especialista em desarmar aparatos explosivos que assume os contornos do novo herói americano. Sem preocupações ideológicas, ele integra um grupo de combatentes em constante tensão, numa cidade infestada de bombas ocultas e pessoas suspeitas. Os eventos são variações do mesmo tema: salvar as pessoas e a própria pele.

Bastados inglórios (Inglorious basterds)
O novo filme de Quentin Tarantino faz uma divertida inversão de clichês ao colocar nazistas como vítimas de judeus americanos. Bastardos inglórios mexe diretamente com os brios dos judeus norte-americanos, e a Academia de Artes e Ciências Cinematográficas é repleta deles. Não deve levar o prêmio principal e um dos motivos é a violência explícita com que o diretor conduz sua vingança pessoal. Já Christoph Waltz, que interpreta o impagável coronel da SS Hans Landa, é forte candidato a melhor ator coadjuvante. A violência estetizada de Tarantino pode ser puro entretenimento, mas guarda ao menos uma frase que precisa ser levada a sério, dita antes de talhar uma suástica na testa da vítima: "se você tirar o uniforme, ninguém saberá que é um nazi".

Educação (An education)
Sem previsão de estreia no Recife, o longa é dirigido pela dinamarquesa Lone Scherfig e tem como produtor e roteirista o inglês Nick Hornby. É a primeira vez que o autor de Alta fidelidade adapta um texto que não o seu, no caso, as memórias da jornalista Lynn Barber. Educação trata do destino de Jenny (Carey Mulligan), garota de 16 anos que na Londres de 1961 fica dividida entre um futuro promissor na Universidade de Oxford e a descoberta de uma vida bem mais estimulante ao lado de um homem mais velho. Na história do Oscar, poucas produções inglesas ganharam o prêmio máximo. Mesmo assim, surpresas podem acontecer.

Preciosa - uma história de esperança (Precious)
Baseado no livro Push, o filme narra a trágica história de Preciosa (Gabourey Sidibe), uma adolescente negra, grávida e vítima de violência doméstica que é transferida para uma escola alternativa. Lá, a convivência com a professora e as novas colegas abre novos caminhos para a jovem. A intensidade das interpretações de Sidibe e Mo'Nique, que interpreta a perturbada mãe de Preciosa, é um dos trunfos do longa, dirigido por Lee Daniels e produzido por Oprah Winfrey. A participação de Mariah Carey e Lenny Kravitz, a montagem bem utilizada e a trilha sonora inspirada na música negra norte-americana tornam a produção ainda mais interessante.

Distrito 9 (District 9)
Com produção de Peter Jackson (O senhor dos anéis) e direção do novato Neill Blomkamp, Distrito 9 é tido como inovador por utilizar estrutura de documentário e investir numa perspectiva social incomum ao gênero ficção-científica. O filme se passa em um acampamento da África do Sul, que num futuro próximo se torna uma espécie de favela para alienígenas indigentes que não tem como voltar para o planeta natal. O "Distrito 9" é administrado por uma empresa privada, que envia um funcionário (Sharlto Copley) para coletar dados censitários no local. Sua vida vira de cabeça para baixo quando ele é contaminado por um gás que aos poucos o transmuta em alienígena. A partir daí, o filme também se transforma em sequências de perseguição e combates.

Up - altas aventuras (Up)
Up não deixa nada a desejar se comparado aos demais indicados ao prêmio de melhor filme. A produção da Pixar dirigida por Pete Docter tem todos os elementos de um grande filme. A história de um senhor idoso que perde a esposa e se entrega para os sonhos de juventude tem delicadeza, mistério e sutileza suficientes para satisfazer qualquer fome de cinema. Não deve ganhar o prêmio principal, mas é o favorito à melhor animação. Que sirva de modelo para outras produções do gênero.

Um sonho possível (The blind side)
O filme marca a volta de Sandra Bullock à boa forma e à sua primeira indicação ao Oscar de melhor atriz. Dirigida por John Lee Hancock, a produção é baseada na história real de Michael Oher, publicada no livro The Blind Side: Evolution of a game, de Michael Lewis. Bullock interpreta uma mãe de família que adota e cuida de um garoto sem teto (Quinton Aaron) até ele se tornar um famoso jogador de futebol americano. No Recife, ele estreiano dia 19 de março.

Um homem sério (A serious man)
A mistura de cultura judaica e psicodelismo (a trilha sonora tem Jefferson Airplane) marca a nova produção de Joel e Ethan Coen (Onde os fracos não têm vez) centra foco no homem comum norte-americano, que ao longo da carreira da dupla rendeu uma galeria de tipos ironicamente vitimizados por situações onde predomina o humor negro. Desta vez o protagonista é Lawrence Gopnick (Michael Stuhlbarg), professor de física que leva a vida no máximo de correção possível, num subúrbio qualquer dos anos 1960. Só que tudo em sua volta está uma confusão: sua mulher está apaixonada por outro; seu irmão dorme no sofá; e seus filhos estão incontroláveis. Sem previsão de estreia no Recife.

Amor sem escalas (Up in the air)
Parece mais uma comédia romântica de fórmula batida, mas o filme de Jason Reitman (Obrigado por fumar, Juno) atua sobre códigos sociais aparentemente desimportantes, mas que regem boa parte do que chamamos vida moderna - foco em cartões, senhas e mensagens via internet, artifícios de conforto para um mundo solitário e impessoal. George Clooney é Ryan, especialista em demitir pessoas que surfa feliz em plena depressão econômica. Solteirão convicto, se aproxima de Alex (Vera Farmiga) após ter seu lifestyle cinco estrelas e sem amarras ameaçado por Natalie (Anna Kendrick), funcionária novata inovar na empresa. Repleto de bom humor, Amor sem escalas é uma crítica necessária sobre a condição dos nossos tempos.

Lista dos indicados aos prêmios principais

Melhor filme
Avatar
Um sonho possível
Distrito 9
Educação
Guerra ao terror
Bastados inglórios
Preciosa - Uma história de esperança
Um homem sério
Up - Altas aventuras
Amor sem escalas

Melhor diretor
James Cameron (Avatar)
Kathryn Bigelow (Guerra ao terror)
Quentin Tarantino (Bastardos inglórios)
Lee Daniels (Preciosa)
Jason Reitman (Amor sem escalas)

Melhor ator
Jeff Bridges (Coração louco)
George Clooney (Amor sem escalas)
Colin Firth (A single man)
Morgan Freeman (Invictus)
Jeremy Rennet (Guerra ao terror)

Melhor atriz
Sandra Bullock (Um sonho possível)
Helen Mirren (The last station)
Carey Mulligan (Educação)
Gabourey Sidibe (Preciosa)
Meryl Streep (Julie & Julia)

Melhor ator coadjuvante
Matt Damon (Invictus)
Woody Harrelson (The Messenger)
Christopher Plummer (The last station)
Stanley Tucci (Um olhar do paraíso)
Christoph Waltz (Bastardos inglórios)

Melhor atriz coadjuvante
Penelope Cruz (Nine)
Vera Farmiga (Amor sem escalas)
Maggi (Crazy heart)
Anna Kendrick (Amor sem escalas)
Mo'Nique, (Preciosa)

Melhor animação
O fantástico Sr. Raposo
Coraline e o mundo secreto
Up - Altas aventuras
A princesa e o sapo
O segredo de Kells

Melhor roteiro original
Guerra ao terror
Bastardos inglórios
The messenger
Um homem sério
Up - Altas aventuras

Melhor roteiro adaptado
Distrito 9
Educação
In the loop
Preciosa
Amor sem escalas

Melhor filme estrangeiro
A teta assustada (Peru)
A fita branca (Alemanha)
O profeta (França)
Ajami (Israel)
O segredo de seus olhos (Argentina)

Melhor direção de arteAvatar
O imaginário do Dr. Parnassus
Nine
Sherlock Holmes
A jovem victoria

Melhor fotografia
Avatar
Harry Potter e o enigma do príncipe
Guerra ao terror
Bastardos inglórios
A fita branca

Melhor figurino
Brilho de uma paixão
Coco antes de Chanel
O imaginário do Dr. Parnassus
Nine
A jovem victoria

Melhor edição
Avatar
Distrito 9
Guerra ao terror
Bastardos inglórios
Preciosa

Melhor maquiagem
Il Divo
Star trek
A jovem victoria

Melhor trilha sonora
Avatar
O fantástico Sr. Raposo
Guerra ao terror
Sherlock Holmes
Up - Altas aventuras

Melhor canção original
Almost there (A Princesa e o Sapo)
Down in New Orleans (A Princesa e o Sapo)
Loin de Paname (Paris 36)
Take it all (Nine)
The weary kind (Crazy Heart)

Melhor documentário de longa-metragem
Burma VJ
The cove
Food, Inc
The most dangerous man in America
Which way home

Melhor documentário de curta-metragem
China's unnatural disaster: the tears of Sichuan province
The last campaign of governor Booth Dardner
Music by prudence
Rabbit à la Berlin

sexta-feira, 5 de março de 2010

Cine PE abre inscrições para oficinas profissionalizantes

A assessoria de imprensa do Cine PE Festival do Audiovisual informa que estão abetas as inscrições para as oficinas profissionalizantes e o workshop que integram a grade de atividades da 14a edição do festival. Este ano, os interessados terão a oportunidade de participar das oficina de produção, oficina de roteiro e do workshop formas de financiamento ao audiovisual.

Os instrutores serão, respectivamente, o produtor, diretor e roteirista de cinema Chris Rodrigues (Macunaíma, Capitães de Areia); o roteirista de cinema e vídeo, Di Moretti (Nossa Vida não Cabe num Opala, Latitude Zero ); e o advogado Fábio de Sá Cesnik.

As aulas das oficinas ocorrerão de 26 a 30 de abril, das 9h às 13h, na Fundação Joaquim Nabuco (Fundaj), no Derby. O workshop será realizado no dia 30 de abril, das 9h às 18h. Serão oferecidas 40 vagas para a Oficina de Produção; 30 para a Oficina de Roteiro; e 50 para o Workshop Formas de Financiamento ao Audiovisual. Cada oficina terá 20 horas/aula. A íntegra dos programas pode ser conferida no site do festival.

De acordo com os diretores do Cine PE, Sandra e Alfredo Bertini, as oficinas já são atividades consolidades e bastante concorridas dentro da programação do festival. “Queremos promover essa troca de conhecimento e formação, trazendo para cá profissionais de renome no mercado. É uma ótima oportunidade parar profissionais de comunicação, cinéfilos, estudantes e até para quem já atua na área de cinema”, sugere Bertini.

A inscrição custa R$ 120,00 e pode ser feita via site, e-mail (festival@bpe.com.br), fax (81 3343.5066) ou na sede da BPE (Rua João Cardoso Ayres, 1042, Boa Viagem, Recife-PE). A confirmação deve acontecer via fax. As inscrições serão encerradas automaticamente no ato do preenchimento das vagas disponíveis.

Informações: (81) 3461.2765

Tim Burton e o gato que ri

Tres estreias no escuro

Hoje três filmes entram em cartaz na cidade, lamentavelmente sem sessões para a imprensa, o que impede a publicação de comentários mais detalhados sobre as produções. A estreia principal é Entre irmãos (Brothers, EUA, 2009), distribuído pela Imagem Filmes. Estrelado por Jake Gyllenhaal, Natalie Portman e Tobey Maguire, o filme tem como diretor o irlandês Jim Sheridan, aclamado por Meu pé esquerdo (1989) e Em nome do pai (1993). Distribuídos pela Playarte, Vírus (Carriers, EUA, 2009) e O amor acontece (Love happens, EUA, 2009) completam o rol das novidades no circuito.

Programação completa aqui.

Uma semana para Toy Story 2 (3D)



Dando continuidade ao plano que antecipa o lançamento da série Toy story em 3D, a segunda sequência entra em cartaz hoje, readequada para a exibição em três dimensões, no Box Guararapes. Assim como na semana passada, quando estreou Toy Story 1, a continuação fica disponível por apenas uma semana, em dois horários vespertinos. A restrição é explicável, já que Avatar continua com sessões lotadas e a cidade conta com apenas uma sala equipada com a tecnologia. Estender a temporada para além dos sete dias seria uma solução, mas está fora de questão, porque entra em conflito com a estratégia adotada pela Pixar/Disney.

Em Toy story 2, o caubói Woody vai a uma loja de objetos usados salvar um brinquedo e lá é raptado por um colecionador de bonecos. Liderados pelo astronauta Buzz, os amigos de Woody partem para o resgate. No cativeiro, Woody descobre outros bonecos, alguns mais antigos que ele, prontos para serem vendidos para um museu.

(Diario de Pernambuco, 05/03/2010)

quinta-feira, 4 de março de 2010

Lançamentos em DVD

Caçadores de nazistas



Quentin Tarantino deita e rola nessa comédia de humor negro que inverte o jogo de gato e rato entre nazistas e judeus. Ambientado na Segunda Guerra, o filme não poupa referências cinéfilas e bem humoradas ao western, filmes noir e produções B. De um lado, temos o caricato e incontrolável Aldo Raine (Brad Pitt), que lidera os “bastardos”, grupo de judeus americanos instruído a matar nazistas e arrancar escalpos com técnicas apache. Do outro, o impiedoso caçador de judeus Coronel Hans Landa (Christoph Waltz), responsável pela segurança de Adolf Hitler e a cúpula nazista num pequeno cinema francês para o lançamento da primeira produção dirigida por Joseph Goebbles. O que ninguém sabia é que o cinema é administrado por Soshanna (Mélanie Leurent), que quando criança teve a família dizimada por Landa e também prepara sua vingança movida à combustão de rolos de nitrato. A trilha sonora, como era de se esperar, é um caso à parte.
Bastardos Inglórios (Inglourious Basterds, EUA/Alemanha, 2009). De Quentin Tarantino. Com Brad Pitt, Eli Roth, Mélanie Laurent, Christoph Waltz. Duração: 152 minutos. Universal.

Vida de gângster



Christian Bale e Johnny Depp se enfrentam neste belo filme ambientado nos anos 1930. Bale é como o agente Melvin Purvis, mobilizado pelo chefe do FBI J. Edgar Hoover (Billy Crudup) para capturar John Dilinger (Depp). Um dos trunfos da produção, a reconstituição de época traz de volta a arquitetura, grandes automóveis e o figurino impecável que deram elegância a bandidos com metralhadora e mocinhas em apuros. Mais do que um simples ladrão, Dilinger quer desafiar o poder. O filme, ancorado na atuação de Depp, dá a ele profundidade psicológica suficiente para que o mito perdure nas próximas décadas.
Inimigos Públicos (Public Enemies, EUA, 2009). De: Michael Mann. Duração: 139 min. Universal.

O futebol salvou minha vida



Veterano cineasta vinculado à linguagem documental e engajada, Ken Loach nos oferece uma história aparentemente despretensiosa e certamente divertida, em que faz um elogio ao futebol e sua importância para manter a auto-estima do proletariado inglês. Num subúrbio de Londres, acompanhamos a vida de Eric Bishop, carteiro de aspecto apagado e triste que passa a receber visitas de seu único ídolo, Eric Cantona (ele em pessoa), lenda viva do Manchester United, o maior time da Inglaterra. Com o apoio de Cantona, Bishop retoma aos poucos o respeito dos filhos e a admiração da ex-mulher. O momento máximo desse processo é o acerto de contas com um gângster local, com uma mãozinha dos amigos do serviço postal e a utilização do “método Cantona” com máscaras e tacos de beisebol. Caso à parte é a ótima utilização de imagens de arquivo com gols históricos feitos pelo astro, uma absurda coletiva de imprensa em que se despede do futebol recitando poesia e a sequência em que saca um trompete e toca A marselhesa na escadaria de um prédio.
À procura de Eric (Looking for Eric, Inglaterra, 2009). De Ken Loach. Com Steve Evets, Eric Cantona, Stephanie Bishop. Duração: 117 minutos. California.

A hora da verdade



De olho no remake que estreia em 2010, a Sony relança a trilogia original que marcou época e eternizou a dupla Daniel San e Senhor Miyagi. Na primeira parte (A hora da verdade), recém-chegado a Nova Jersey, o adolescente Daniel LaRusso sofre na mãos de valentões da escola até descobrir que o imigrante japonês que cuida dos jardins da vizinhança é mestre nas artes marciais. A amizade entre eles chama a atenção do professor de uma academia, que coloca seu mais terrível aluno para enfrentar Daniel num campeonato que chega às últimas consequências. Na segunda sequência (A hora da verdade continua), os herois vão à Okinawa, onde Miyagi reencontra Yuke, a mulher que deixou pra trás quando veio para a América. Na terceira aventura (O desafio final), Daniel quer vencer um campeonato a qualquer custo, nem que para isso precise trocar de treinador. O material especial é vasto e inclui making of, e os documentários A arte do Karatê, A música de Karatê Kid e A Vida do Bonsai.
Karate Kid – a trilogia (Karate Kid Trilogy, EUA, 1984, 1986, 1989). De John G. Avildsen. Com Ralph Macchio, Pat Morita, Elisabeth Shue. Duração: 351 minutos. Sony.