segunda-feira, 1 de março de 2010

Sonhos de menina



Kika Farias não quer esperar. Antes mesmo de brilhar na tela como protagonista do filme Sonhos roubados, de Sandra Werneck, o novo talento pernambucano a alcançar projeção nacional se empenha em investir na carreira. Não importa se no cinema, teatro ou na TV, onde apareceu ano passado como um dos rostos da campanha Rio 2016, dirigida por Fernando Meirelles. Com fotografia de Walter Carvalho e elenco formado por Marieta Severo, MV Bill, Nelson Xavier, Daniel Dantas, Lorena da Silva, Ângelo Antônio e Zezé Barbosa, Sonhos roubados deve estrear nacionalmente em 23 de abril e trata da dura vida de meninas pobres que ganham a vida fazendo programas nos subúrbios do Rio de Janeiro.

Diferente de Irandhir Santos e Hermila Guedes, atores que primeiro conquistaram reconhecimento local para então alçar voos em grandes produções, Kika percorreu caminho contrário ao ser escolhida por Wernek e equipe para viver a adolescente Sabrina, que ao lado de Jéssica (Nanda Costa, a Soraya na novela Viver a vida) e Daiane (Amanda Diniz, ex-Narizinho do Sítio do Pica Pau Amarelo), formam o núcleo principal do filme. O filme é baseado no livro Meninas da esquina, da jornalista Eliane Trindade, construído a partir do relato de seis garotas que se prostituem para realizar seus desejos de consumo.

"Sinto que estou dando meu corpo para Sabrina falar para o mundo. Ela e as amigas são vistas como prostitutas, mas o filme olha para elas como vítimas da exploração sexual. São crianças, fazem sexo para poder comer. As pessoas dizem 'mais um filme-favela', mas a gente precisa falar sobre isso, porque está acontecendo agora. E nós, que somos classe média, não temos noção do que é essa realidade", diz Kika.

Kika chegou ao papel de Sabrina através da produtora de elenco Rosa Fernandes, que já a conhecia de testes que fez anteriormente para Baixio das bestas, de Claúdio Assis e Olhos azuis, de José Joffily. Sua forma física delicada, do tipo "mignon", foi decisiva, pois permitiu à atriz de 25 anos viver uma adolescente de 16 sem causar espanto. "O filme passou por vários processos. Fiz alguns testes e comecei a preparação com Camila Amado, sapateado no TAP com Flávio Salles e comecei a frequentar o Grupo Nós do Morro pra vivenciar mais o morro carioca".

Recifense criada no Janga, Kika começou como a maioria dos atores: no teatro, que hoje pratica com a companhia Trupiniquim. No audiovisual, participou da série televisiva Cruzamentos urbanos, Um dia azul (clipe da banda Volver) e do curta Uma flor, de Érica Rocha e Gilson Júnior, inspirado no conto Restos de carnaval, de Clarice Lispector. Atualmente mantém o projeto Contações de histórias, que até ontem esteve em temporada no Recife.

Após um mês na cidade natal, Kika retornou para o Rio de Janeiro, onde mora há dois anos e colhe frutos por ter sido escalada para Sonhos roubados. "Fazer o filme já é um presente e me dá credibilidade para outros trabalhos". Um deles foi uma pequena participação no novo longa de Daniel Filho, As vidas de Chico Xavier, onde pode contracenar novamente com Ângelo Antonio e Nelson Xavier.

De olho nas próximas produções pernambucanas, Kika não esconde o desejo de voltar para casa. Ao longo do ano passado, fez testes para Era uma vez Verônica, de Marcelo Gomes, A febre do rato, de Cláudio Assis e Amor sujo, de Paulo Caldas. "Fui para o Rio porque fui chamada. Sinto falta de realizar meu trabalho aqui". Kika vê o fato de ser estreante como algo estratégico no atual cinema feito no Brasil. "Hoje se buscam atores menos conhecidos, para que o personagem apareça mais do que o ator que o interpreta. Para mim, bom ator é o que muda de acordo com o personagem".

(Diario de Pernambuco, 01/03/2010)

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