sexta-feira, 20 de março de 2009

Estreia // Gran Torino, de Clint Eastwood



O cinema de Clint Eastwood continua em plena forma. Aos 78 anos, e após um filme menor (A Troca, 2008), ele acerta em cheio com Gran Torino (2008), que estreia com certo atraso no país, e marca sua volta ao gênero ação. Trata-se não somente de uma bela história, mas de recontextualizar para os novos tempos - agora sob a ótica da maturidade – o tipo “durão” por ele eternizado em filmes da série Dirty Harry e congêneres.

Eastwood dirige e interpreta o veterano de guerra Walt Kowalski, que vive sozinho no subúrbio após a morte da esposa. Arquétipo do americano forjado a ferro e fogo, ele é aquele ser xenófobo, que lutou na Coréia, mantém o carro brilhando (o Ford Gran Torino, que ajudou a montar em 1972), e está pronto para sacar o rifle sempre que alguém pisar no jardim, onde, sim, fica hasteada a bandeira de listras vermelhas e brancas.

Kowalski rosna mais do que a própria cadela, pois tenta, mas nunca conseguirá endireitar o mundo dentro dos preceitos morais de sua época. Ao contrário, gangues infestam o bairro, crianças não ajudam velhinhas, e a antiga vizinhança foi trocada por imigrantes orientais. Sua casa é a única construção bem cuidada num quadrante que cheira decadência, e isso se estender para o próprio filme, um tesouro da carpintaria à moda antiga ilhado num multiplex de produções fast-food.

No dia de seu aniversário, irritado com os filhos que querem interná-lo em casa de repouso, Kowalski resolve encher a cara e se desarma por um instante, quando a família ao lado o convida para confraternização regada a boa comida e saquê. Num momento seguinte, ele protege os amigos do ataque de uma gangue, e passa a ser tratado como heroi da rua. A partir daí, a generosidade com que passa a tratar os novos amigos é tão grande quanto a do diretor para com seu público, e o velho espinhento e ranzinza se revela um mestre de encantadora generosidade.

Por conter elementos como a família mesquinha trocada por amigos sinceros, a forte relação “mestre coloca aprendiz nos eixos”, e um estúpido ato de violência, não é exagero comparar Gran Torino com o oscarizado Menina de ouro. No entanto, mais importante do que a recorrente mensagem de que há valores a serem defendidos a qualquer custo, é o recado do mocinho prestes a fazer justiça, desfecho que o velho Dirty Harry jamais compreenderia.

publicado no Diario de Pernambuco (com alterações)

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