sexta-feira, 16 de setembro de 2011

Tirando a ferrugem



A geração que deixou o cabelo crescer e colocou o pé na estrada chegou à terceira idade. Mamute (França, 2010), de Gustave de Kervern e Benoît Delépine, faz revisão do ideário de liberdade hippie pela perspectiva de quem o perdeu e o reencontra após virar sessentão.

Eis a história Gérard Depardieu gordo e decadente, o qual encontramos em seu último dia de trabalho. Recém-aposentado, ele abandona o quebra-cabeça que ganhou dos colegas para retornar aos lugares e pessoas com quem já viveu. Montado em uma chopper, ele é o mamute em si, ser anacrônico que carrega no corpo o peso do passado conturbado e anos de conformismo.

O motivo inicial da viagem, reunir papeis que comprovem à previdência seus anos de trabalho, perde a importância na medida em que ele percebe que passou boa parte da vida fugindo de traumas e se matando de trabalhar.

Mamute é um filme de estrada, e como tal, de descobertas existenciais. Os tempos mudaram e o casal Serge (Depardieu) e Catherine (Yolande Moreau) se adaptaram a eles. Sem formação escolar suficiente, ele passou a vida em trabalho braçal - o último foi no matadouro - e ela como funcionária de supermercado onde se conheceram.

O pano de fundo social denuncia não só as suas dificuldades, mas a degradação das condições de trabalho na França. A crítica também surge em momentos surreais como no supermercado, quando Serge cruza com um idoso caído no chão, sem socorro; ou quando visita a sobrinha, observa uma versão em miniatura do mesmo local, habitado por insetos.

A convivência sincera com essa sobrinha, interpretada pela artista Miss Ming, é decisiva para o processo de libertação de Serge. É uma interlocução com o século 21 através da experimentação da videoarte.

(Diario de Pernambuco, 16/09/2011)

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