segunda-feira, 5 de outubro de 2009

Cinema // Gregório Bezerra encontra Miguel Arraes na ficção



Num fim de tarde de 1963, os amigos Miguel Arraes, Gregório Bezerra e Davi Capistrano trocam confidências na varanda do Palácio do Campo das Princesas.

Entre goles de uísque e baforadas de charuto, falam sobre os rumos políticos do país, entre os quais, a sucessão presidencial.

Um pouco antes, em reunião com usineiros, camponeses liderados por Bezerra conquistam o direito a salário mínimo.

Menos de um ano depois, sob protestos e mortes, os generais tomam conta do país.

Enquanto Arraes é preso no palácio, sua voz ecoa, derradeira, em rádios de todo o estado. Enquanto isso, Bezerra foge para Palmares para desmobilizar os camponeses.

Esta série de acontecimentos foram dramatizados neste fim de semana, in loco, durante as filmagens do longa pernambucano História de um valente, de Cláudio Barroso. É a primeira vez que tais episódios são ficcionados para o cinema. Com produção da Camará Filmes, História de um valente conta a vida de Gregório Bezerra entre 1957 e 1964.O elenco conta com 83 atores, entre eles, Francisco Carvalho (Bezerra), Edmilson Barros (Arraes), Jones Melo (Capistrano), Tuca Andrada, Hermila Guedes, Carol Holanda, Magdale Alves, Rui Dias e Sóstenes Vidal.

Segundo Barroso, os "anos de ferro" têm sido abordados por diferentes filmes, mas nenhum se ateve aos fatos que levaram até esse período. "As pessoas precisam saber como foi este país", diz o diretor. Para abrigar as filmagens, o Palácio das Princesas sofreu poucas alterações -alguns móveis mudaram de posição e objetos atuais foram trocados por antigos. Barroso conta que, a pedido de Dona Madalena Arraes, submeteu o texto ao crivo do filho cineasta, Guel Arraes. "Ele leu, aprovou, e nos ofereceu a íntegra do discurso de despedida".

Não se sabe se o encontro entre amigos realmente ocorreu após a reunião com os usineiros. No entanto, ela é perfeitamente verossímil. "Eles se encontravam pelo menos uma vez por semana", justifica Barroso. Outra licença poética adotada pela produção é a cena em que Arraes discursaao povo, enquanto soldados sobem as escadas do palácio para levá-lo à cadeia. Na verdade, o discurso foi distribuído às rádios em fitas cassete.

A partir de hoje, a equipe segue para a região de Catende, onde permanece nos próximos 30 dias. Lá serão rodadas cenas importantes como a transferência simbólica do governo para Palmares e a prisão de Bezerra, que ganhará contornos dramáticos com uma queimada servindo de fundo para a perseguição. Logo após, eles retornam para a capital, onde farão a sequência em que o líder é arrastado por cordas e torturado em praça pública.

Barroso diz que violência do episódio será tratada de forma a não parecer gratuita. Enquanto explica, cita a tela Guernica, de Picasso, como possível referência visual. "Meu objetivo não é defender partidos ou ideologias, mas contar essa história de maneira cinematográfica".

(Diario de Pernambuco, 05/10/09)

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