segunda-feira, 7 de março de 2011

Mestres de fôlego



Haja fôlego para a noite de encerramento do Garanhuns Jazz Festival. São nada menos que cinco mestres do sopro reunidos no Palco Ronildo Maia Leite, na Praça Guadalajara. O maior deles, Rick Estrin, fez sua história com a gaita cromática (com botão, capaz de tocar as 12 notas da escala) e acaba de chegar da Califórnia com o grupo The Nightcats, a saber: J. Hansen, Loranzo Farrell e Kid Andersen. Por 30 anos, eles foram conhecidos como Little Charlie and The Nightcats. Com o afastamento de Charlie Baty, em 2008, Estrin assumiu a banda.

Antes de Estrin, que concedeu entrevista a seguir, haverá um encontro de três gerações da harmônica brasileira: o pernambucano Jehovah da Gaita e os cariocas Flávio Guimarães (fundador do Blues Etílicos, banda pioneira do gênero no país) e Jefferson Gonçalves. Jehovah toca gaita cromática há mais de meio século. Nos anos 1960 fundou o Trio Harmônico com os irmãos Emílio e Ênio Damasceno. É talvez um dos músicos de gaita mais antigos em atividade no Brasil.

´Ele tem um conhecimento musical que poucos têm`, diz Flávio Guimarães, que conheceu e tocou com Jehovah durante um encontro internacional de harmônicas, promovido por ele em São Paulo. ´Hoje, para demonstrar destreza, as pessoas estudam muito técnica e velocidade, um virtuosismo quase atlético. Antes, o estilo que se tocava era mais voltado para melodia. Eu prefiro assim.` Guimarães, que toca a gaita diatônica (de dez furos, usada para o blues), se coloca em uma geração intermediária entre Jehovah e Jefferson Gonçalves (que foi seu aluno).

Também adepto da diatônica, Jefferson começou na banda Baseado em Blues, com rápida passagem na Blues Etc, para se lançar em bem sucedida carreira solo. Em 2004 lançou o álbum Gréia.

Todos os músicos que tocam hoje à noite devem concordar que a grande ausência do encontro é a do mestre de Caruaru, Tavares da Gaita (1925-2009). ´O que ele fazia eu nunca vi ninguém fazer. Ele inventou uma forma de tocar. Tinha um balanço único pra o baião, fazia ritmo e acompanhamento ao mesmo tempo, parecia que estava ouvindo um acordeon`, diz Flávio.

Abrindo a programação está a Banda de Pífanos Folclore Verde, do Mestre Romão & João Faustino, fundada em 1817 e formada por músicos da comunidade quilombola do Castainho, no município de Garanhuns.

Entrevista//Rick Estrin: "Hoje os artistas são muito parecidos entre si"

Como será o show?

Vai ser divertido e espontâneo. Com exceção de uma ou duas, todas as músicas são minhas ou de membros da banda.

Você é conhecido pela grande presença de palco. De onde vem esse talento?
Quando era jovem tive a chance de ficar próximo de grandes performers como Muddy Waters, Junior Wells e BB King. Quando fiz 18 anos, Roger Collins me levou para a estrada e pude constatar como uma boa performance é capaz de atrair audiência. Então resolvi investir na minha personalidade e construir a minha própria carreira.

Quando você percebeu ter chegado a um estilo próprio?
Comecei a me diferenciar em 1978, quando me juntei ao Charlie e fundamos o The Nightcats.

Seu trabalho remete aos anos 1950. O que há de tão especial nessa década?
Foi um tempo especial, de grandes músicos. Hoje os artistas são muito parecidos entre si, mas naquela época, você ouvia algo novo e sabia de quem era. Além disso, havia diferentes ritmos e jovens procurando por algo estimulante. Havia mais estilo e música honesta, nãoera como um evento olímpico pra ver quem toca mais rápido. A ideia era entregar uma mensagem, fazer o público sentir a música.

E o seu visual?
Foi natural, desde quando comecei tocando em clubes. Apenas quis me parecer com aquilo em que acredito.

Como foi sua formação musical?
Queria ser músico desde criança, mas comecei a tocar gaita com 15 anos. Aprendi a tocar sozinho, ouvindo discos de Jimmy Reed, Little Walter, Sonny Boy Williamson e outros clássicos. Aos 18, comecei a tocar em clubes, onde tive a oportunidade de estar com o Lowell Fulson, um grande cara.

O que você aprendeu com Muddy Waters?
O principal foi a validação de que eu estava no caminho certo. Ele me deu muita confiança nesse sentido.

O que acha do blues feito no Brasil?
Acho que, se a música vem do coração e for boa, não importa em que país ela é feita.

Algumas pessoas no Brasil dizem que você se parece um comediante da TV, chamado Zé Bonitinho. O senhor o conhece?
(Risos) Não, mas gostaria de conhecê-lo.

(Diario de Pernambuco, 07/03/2011)

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