quinta-feira, 25 de junho de 2009

A entrevista que nocauteou Richard Nixon



Em 1977, um grupo de jornalistas independentes produziu uma longa entrevista com Richard Nixon (1913-1994), veiculada em vários países, e que se tornou um marco na história da imprensa. Nela, o ex-presidente norte-americano admitiu "erros" como acobertamento de crimes e obstrução do processo judicial no emblemático caso Watergate. Três décadas depois, o cinema retoma o episódio, do ponto de vista dos bastidores. Frost / Nixon (EUA, 2008), de Ron Howard, pode ser assistido na Sessão de Arte do grupo Severiano Ribeiro, com exibições amanhã (21h) e sábado (11h) no Multiplex Boa Vista; e de segunda a quinta (19h20) no UCI Recife.

O longa conta em detalhes como David Frost (Michael Sheen), até então um apresentador da TV britânica com tendência a frivolidades, obteve o que nenhum tribunal ou veículo da imprensa política conseguiu: extrair de Nixon (Frank Langella) uma confissão. Para chegar a tanto, encarou um espinhoso e declarado combate entrevistador / entrevistado. Suprido de boas atuações (além da dupla, há Sam Rockwell e Kevin Bacon no elenco), Howard demonstra naturalidade e precisão ao narrar sua versão dos fatos, apresentada quase como uma reportagem pontuada por depoimentos dos envolvidos, que "ajudam" na reconstituição dos fatos.

Mal comparando, é algo como se George W. Bush fosse encurralado por David Letterman e, após muita resistência, desmoronasse emocionalmente em rede nacional. Howard, porém, disse à imprensa que não acredita em tal situação pois, diferente de Nixon, que amargava restrições financeiras e recebeu US$ 200 mil pela entrevsita, Bush jamais se submeteria a 30 horas de aprofundada sabatina.

Outro ponto, este apontado pelo filme, é que Nixon aceitou o desafio porque alimentava a ambição de retornar à cena política. Após três anos afastado da vida política, esta poderia ser sua grande oportunidade de se redimir nacionalmente. Partiu com artilharia pesada pra cima de Frost, um "duelo" do tipo vale-tudo. Do outro lado do ringue, Frost vacila e contra-ataca, motivado em ter seu nome eternizado no panteão dos ricos e famosos da mídia (tanto que após a consagração ele recebeu o título de Cavaleiro do Império Britânico, e até hoje continua entrevistando políticos e celebridades).

Diferente de Anjos e demônios, outro trabalho de Howard em cartaz nas salas do mundo, Frost/Nixon não tem demonstrado vocação para grandes plateias fora dos EUA, onde recebeu cinco indicações para o Oscar deste ano. Tanto que no Brasil estreou de forma tímida, no começo de março. É verdade que o assunto interessa mais à população dos Estados Unidos, que viveu sob os desmandos de Nixon, mas é importante não subestimar o valor desta obra cinematográfica.

Ao contrário de W. (2008), tentativa um tanto embaçada de Oliver Stone em contar a vida íntima de Bush, Frost/Nixon instiga o pensamento e chega a provocar risadas de nervosismo. Em meio à franqueza e cinismo com que as equipes rivais interagem, o filme arrisca apresentar o ex-presidente como um homem forte e manipulador, mas quena intimidade se mostra complexado com relação aos "bem nascidos" e a seus oponentes liberais e "de olhos azuis", como os Kennedy.

Entre revelações da vida pública e privada, Nixon assumiu ser mais um líder a abusar do poder e cometer ilegalidades "pelo bem da nação". Por uma série de fatores, há os que nunca chegarão a tanto. A estes, Nixon deixou a clara lição de jamais se submeter aos constrangimentos de uma dedicada apuração jornalística.

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