domingo, 8 de agosto de 2010
Muito além de Mafalda
Quadrinhos argentinos estão em alta no Brasil. Após décadas de miopia, o mercado nacional avança para além dos consagrados Quino (Mafalda) e Maitena (Mulheres alteradas) e se abre a novos artistas do país vizinho. O mais celebrado se chama Liniers, criador de Macanudo, que chegou ao terceiro volume publicado no Brasil. Outros são Tute, da série infantil Batu, e Salvador Sanz, autor de Noturno. Títulos históricos como El Eternauta e a coletânea semestral Fierro, até então inéditos no Brasil, estão na pauta de lançamentos dos próximos meses.
Liniers se tornou conhecido no Brasil em 2009, quando a editora Zarabatana publicou o primeiro Macanudo. A resposta de público e crítica foi imediata: o autor de 36 anos venceu o prêmio HQ Mix de melhor artista estrangeiro. Logo depois, por intermédio de Maitena, Liniers passou a ter seu trabalho publicado diariamente na Folha de São Paulo. Jornais do Peru, Espanha, Canadá e França também publicam suas tiras.
Os personagens de Macanudo são crianças ou animais. Também há robôs e duendes. Na Argentina, eles são tão queridos quanto Mafalda e sua turma. Estão em agendas, cartões-postais e uma linha de roupas infantis e adultas, desenvolvida por Liniers e a estilista Juana de Arco. A dupla mais recorrente é a garota Enriqueta e o gato Fellini. Outros são Z-25, o robô sensível, a Vaca Cinéfila e os pinguins da Patagônia. Liniers participa das histórias, como um coelho desenhista. Eles vivem situações modernas, mas a aparência evoca a nostalgia dos quadrinhos antigos - o próprio nome da série vem de uma gíria em desuso, o equivalente ao nosso "supimpa". Uma das tirinhas faz homenagem a Little Nemo in the Slumberland, publicado nos jornais dos anos 1910.
Claudio Martini, editor da Zarabatana, diz que Liniers é uma celebridade na Argentina - faz exposições de pinturas, participa de filmes e shows de música. "Além de apresentar uma tirinha inovadora, divertida e inteligente, Liniers é uma pessoa muito carismática e transfere o carisma para sua obra. Todos que folheiam Macanudo se apaixonam". Bonjour, série de Liniers anterior a Macanudo, será lançada pela Zarabatana.
Publicada entre 1957 e 1959, as duas primeira partes de El Eternauta, de Héctor Germán Oesterheld, chega ao Brasil pela Martins Martins Fontes, a mesma editora que mantém em catálogo as obras de Quino. Com 420 páginas, Toda Mafalda (R$ 104) é seu best-seller. Aos 78 anos, nome maior dos quadrinhos argentinos, que continua ativo e radicalmente pensante.
10 anos com Mafalda (R$ 45), recém-lançado no Brasil pela WMF Martins Fontes, vendeu mais de 1.500 exemplares em um mês. Lançados em abril, Que presente inapresentável! e Humanos nascemos reunem sua produção recente como cartunista.
Martini explica que a relação entre argentinos e brasileiros só não é melhor porque está sufocada por laços editoriais norte-americanos e europeus. "Temos mais facilidade em negociar com eles do que com os argentinos. Os próprios autores de lá se voltam para a Europa, onde tem muitos trabalhos editados, e deixam o Brasil de lado. O que é compreensível, se compararmos tiragens e potencial do mercados daqui e da Europa".
Para o jornalista Paulo Ramos, autor do livro Bienvenido - um passeio pelos quadrinhos argentinos (R$ 36), a atual "onda" de quadrinhos argentinos no Brasil é resultado do esforço editorial da Zarabatana e Martins Fontes. "Ambas estão trazendo para o Brasil apenas a ponta do iceberg. A questão é saber se essa onda será passageira ou se encontrará eco junto ao leitor brasileiro. Qualidade as obras têm, mas sabemos que nem sempre isso é sinônimo de boas vendas".
O livro de Ramos é um ótimo guia para conhecer a centenária produção argentina. Além de informações históricas, traz entrevistas com Liniers e com a viúva de Héctor Germán Oesterheld, desaparecido durante a ditadura argentina. "Acredito que temos muito a aprender com os roteiros de histórias mais longas, uma tradição dos argentinos que vem sendo lapidada desde a década de 1950. Não temos a tradição de construir narrativas assim aqui no Brasil, algo que começa a mudar, de forma mais sistemática, a partir deste século", compara o autor.
Ramos diz que histórica barreira entre a produção portenha e o mercado nacional foi um dos motivos que o levaram a estudar o tema. "Não entendia por que sabíamos tanto dos quadrinhos norte-americanos, europeus e até japoneses e tão pouco sobre a produção de um país tão próximo como a Argentina. Os motivos ainda precisam ser investigados detalhadamente. Tenho a impressão que a resposta passe pela nossa histórica predileção editorial pelos quadrinhos feitos nos Estados Unidos, o que nos cegou para o que ocorria na América do Sul".
A recíproca é verdadeira. Em sua pesquisa de três anos, Ramos descobriu que, com exceção de Adão Iturrusgarai, que mora na Argentina e se tornou um dos nomes mais fortes de lá, a produção brasileira também ocupa pouco espaço. "Como nós, eles têm uma abertura muito forte aos super-heróis e aos mercados europeu e japonês - os mangás são febre por lá também. Isso inibe a presença de produções brasileiras por lá".
Serviço
Quino
www.quino.com.ar
Liniers
www.porliniers.com
Zarabatana Books
www.zarabatana.com.br
Paulo Ramos
www.blogdosquadrinhos.blog.uol.com.br
(Diario de Pernambuco, 08/08/2010)
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3 comentários:
o que acho marcante nos volumes do macanudo (tenho quatro aqui), no bonjour e no "planeta tute" (que tá aqui recém-comprado, só dei uma folheada) é que eles seguem uma linha de humor meio melancólico, o que particularmente acho massa, uma coisa meio marcante nessa geração de quadrinistas argentinos. nunca li as traduções, espero que esse feeling continue nas edições nacionais :)
e, porra velho, massa ver matéria sobre liniers no DP :)
abração.
Alô Tarta.
Sim, a edição nacional da Zarabatana é bem boa. Falta alguem publicar a coletânea capa dura dos cinco primeiros volumes de Macanudo, que pela ediciones de la flor sai por nada módicos R$ 180...
Parabéns André pela sua bravura em escrever sobre quadrinhos no Diário de PE. Estive no evento do Dia do dia 30 de Janeiro, dia do quadrinho nacional, organizado por Amaro Braga e neste evento vi e ouvi sobre sua disposição para divulgar os quadrinhos, nacional e local.
Mas pergunto, como podemos divulgar a Prismarte na impressa local.
E nesse momento já temos a Prismarte 53 para divulgação.
Tem algum e-mail para enviar nosso release? O e-mail da Prismarte é prismarte@prismarte.com.br
Mas também temos nosso site (www.prismarte.com.br) e nosso twitter (twitter.com/prismarte).
No mais agradeço pela sua atenção.
Milson Marins
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