quarta-feira, 30 de dezembro de 2009

Muitas emoções na reabertura do Cinema São Luiz


Foto: Beto Figueirôa

O retorno do Cine São Luiz, na última segunda-feira, foi uma noite de muitas emoções. A começar por uma pane elétrica, que quase inviabilizou o evento. Contornado o problema, quase mil convidados adentraram a mais bela sala de cinema do país, deslumbrante em detalhes, novinha em folha.

Artistas, produtores, profissionais liberais, políticos e gestores públicos estavam lá, quando a luz do projetor atingiu a tela e teve início o longa Baile Perfumado, que há 13 anos teve no mesmo local sua primeira sessão na abertura do primeiro Cine PE. A ocasião reuniu toda a equipe do longa (com exceção de Paulo Caldas, que está na França).

Provavelmente provocado por uma sobrecarga de energia (além da estrutura do cinema, havia holofotes e pontos de iluminação externa), o apagão começou às 17h15, e com o andar das horas fez surgir uma inusitada aglomeração naquele simbólico quadrante da Rua da Aurora. Às 20h, a luz interna voltou, para então cair de novo e voltar oscilante, mas definitiva. Aplausos e alívios. A sessão poderia começar.

Quinze minutos depois chegaram o governador Eduardo Campos e o secretário de Cultura Ariano Suassuna. No saguão, Eduardo (que apoiou o Baile quando era secretário da Fazenda do governo Miguel Arraes) abraçou Lírio Ferreira. No palco, o governador evocou a disposição libertária dos pernambucanos. Criticou aqueles que nada fizeram "por terem se entregado aos modismos e não à cultura pernambucana". E disse que o São Luiz é uma homenagem a todos que os artistas souberam resistir aos enlatados. À imprensa, Ariano ressaltou o papel do Estado ao apoiar projetos como este, numa época em que se assiste filmes no celular. "Das três versões para o cinema de Auto da Compadecida, duas foram exibidas aqui". Um pouco antes dos aplausos, um grito cortou o salão: "Lula Cardoso Ayres". Não fosse a iniciativa anônima, o nome de Lula, contratado para coordenar o projeto de restauro, não seria sequer citado.

A sessão começou por volta das 21h, mas o calor era tanto (a queda de energia não permitiu tempo hábil para refrigerar a sala) que parte do público não permaneceu até o fim. O sistema de som, apesar de analógico, recebeu elogios. Já a imagem estava levemente escurecida. "O ideal seria uma lâmpada de 4 mil watts (a lâmpada atual é de 3 mil)", disse o exibidor Kleber Mendonça Filho, do Cinema da Fundação.

O professor e diretor de cinema Leo Falcão chamou a atenção para as conversas na cabine de projeção e o acendimento prematuro das luzes, durante os créditos finais. "Transformar o São Luiz em um bom espaço de exibição já é um grande serviço. Espero que seja nervosismo de estreia e não se torne hábito da cultura de multiplex", disse Falcão.

Outra crítica recorrente foi a falta de um projetor digital. "Caso contrário, o cinema não vai refletir a atual produção", diz Gabriel Mascaro. Carla Francine, coordenadora de cinema da Fundarpe, diz que o equipamento digital deve estar funcionando a partir de março. Se a previsão se confirmar, o casal Alfredo e Sandra Bertini, organizadores do Cine PE, pretende negociar a volta de parte da programação ao local onde o evento nasceu.

A noite foi especial para o distribuidor de filmes Arlindo Leopoldo de Gusmão, 78 anos, que esteve na noite de inauguração do São Luiz, em setembro de 1952. "O filme de estreia foi O falcão dos mares, da Warner Brothers. Todo mundo usava paletó e gravata". Também atuante no ramo, Antonio Silva, 86 anos, disse que o cinema está muito bem restaurado. E deu a receita para o São Luiz ter vida longa: "o cinema está muito ligado à divulgação. Se ela for bem feita, o público chegará aos poucos. Antigamente havia a palavra 'habituée', isso precisa ser reconquistado".

Depoimentos

"A convergência tecnológica não vai tirar o papel do cinema. O resgate do conteúdo o grande desafio da identidade cultural. Reabrir o São Luiz quer dizer que Pernambuco volta a crer no seu futuro" - Eduardo Campos, governador

"A volta do cinema de rua traz frescor ao centro do Recife, que está abandonado. O São Luiz é um marco nesse sentido. Que não seja o único exemplo" - Cláudio Assis, cineasta

"É uma atitude de vanguarda ir na contra-mão dos lançamentos comerciais. Ultrapassa a barreira do bonito, é deslumbrante" - Lírio Ferreira, cineasta

"Para mim foi pura emoção. Nós temos cinemas virando igreja e supermercado e temos o São Luiz, que volta lotado dessa forma" - Marcelo Gomes, cineasta

"É maravilhoso poder voltar para o local onde frequentei tanto, palco sagrado do cinema pernambucano. Poder um dia tocar aqui seria maravilhoso" - Spok, músico

"Ele ultrapassa o conceito de sala de exibição. É o templo onde pessoas vêm usufruir de uma magia que os cinemas comerciais não podem mais oferecer" - Andréa Mota, produtora

(Diario de Pernambuco, 30/12/2009)

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