sexta-feira, 4 de dezembro de 2009

Estreia // "Abraços partidos", de Pedro Almodóvar



Um filme de Pedro Almodóvar nos cinemas da cidade é sempre algo a ser prestigiado. Seu mais novo trabalho, Abraços partidos (Los abrazos rotos, Espanha, 2009), dividiu opiniões quando estreou no Festival de Cannes, e faz parte da tendência autorreferente de seus últimos filmes.

As notas de produção o apresentam oficialmente como "uma história de amor insano, dominada pela fatalidade, caprichos, abuso de poder, traição e complexo de culpa". Considerando que é exatamente isso o que o público espera da "grife" estabelecida pelo diretor espanhol, talvez surja alguma decepção entre os que confrontarem a película com outras produções mais vigorosas e ousadas de sua filmografia. Então é preciso estender a descrição acima para algo que permeia o foco da trama: a realização cinematográfica.

Através de Harry Caine (Lluís Homar), um roteirista cego que nega o próprio passado, Almodóvar assume com ironia e elegância a dificuldade de olhar para si e seu legado. Caine na verdade é Mateo Blanco, cineasta de sucesso que após evento traumático se esconde no alter-ego inventado para assinar o texto de seus filmes. Blanco encontra em Lena (Penelope Cruz) a atriz ideal para seu novo filme, que aos poucos se torna um pastiche do Almodóvar clássico, de personagens histéricos e cores carregadas dos anos 80. Objeto do desejo de Blanco, Lena (não por acaso, musa recorrente de Almodóvar) é casada com o poderoso Ernesto Martel (José Luiz Gómez), que por ciúmes banca os custos da produção com sua fortuna e leva o triângulo à inevitável tragédia.

Quatorze anos depois, tudo isso está banido na memória de Caine, que vive sob a proteção da produtora Judit (Blanca Portillo) e seu filho Diego (Tamar Novas), com quem descobrirá não somente o passado recente, mas algo anterior e tão importante quanto as circunstâncias que tiraram sua visão e o separaram de Lena.

A reconstrução de uma foto rasgada ("rota", em espanhol) do casal abraçado leva à montagem da película inacabada. Mesmo às cegas, faz-se o possível. De alguma forma, diz Almodóvar, os filmes precisam ser terminados.

(Diario de Pernambuco, 04/12/2009)

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