quinta-feira, 17 de junho de 2010

Fernando Trueba apresenta "A dança da Victoria" no Recife



Nem o jogo da Seleção ou o dedicado aguaceiro que caiu sobre o Recife impediu o público de lotar o Cinema da Fundação na última terça-feira. O motivo foi a exibição de A dança da Victoria (El baile de la Victoria, Espanha/Chile, 2009), novo filme de Fernando Trueba, com a presença do cineasta, que conversou com a platéia até às 23h. O evento, promovido pelo Instituto Cervantes, faz parte do projeto de intercâmbio Encontro com Diretores do Cinema Espanhol, que agora estabelece bem-vinda parceria com a Fundação Joaquim Nabuco.

Com marcante narrativa noir e western, A dança da Victoria nos leva a Santiago do Chile, onde encontramos Vergara Grey (Ricardo Darín) e Ángel Santiago (Abel Ayala), que acabam de ser anistiados da prisão. Enquanto o primeiro, respeitado ativista político, precisa lidar com o sumiço da esposa, o segundo, ladrão despreparado e afoito, se apaixona pela bela e afônica dançarina Victoria (Miranda Bodenhofer) e quer roubar um cofre de Pinochet.

O roteiro é assinado pelo próprio Trueba, em parceria com Antonio Skarmeta, autor de O carteiro e o poeta e autor do livro que serviu de base para o novo longa, representante espanhol para o Oscar 2010 de melhor filme estrangeiro. Em 1994, trouxe a cobiçada estatueta para Madri com Sedução (Belle Èpoque, 1992). Entre os novos projetos está a ficção O artista e a modelo, co-roteirizada por Jean Claude-Carrière, longevo colaborador de Luís Buñuel.

Em conversa com o Diario, Trueba diz que, para realizar A dança da Victoria, foi preciso superar muitas dificuldades: a doença da esposa, a falência do produtor italiano e um acidente com Ricardo Dárin, estrela maior do cinema argentino, a quem o diretor compara a Cary Grant. “Adoro atores que são sempre os mesmos. Darín era quem eu mais tinha desejo de trabalhar. Além de ter provocado muitos risos no set, algo que dou muito valor, ele trabalha muito bem. O que mais posso querer?”

Nascido em Madri, Trueba é um entusiasta da cultura do Brasil, onde já rodou um documentário e prepara outro, sobre o desaparecimento do pianista Tenório Junior, durante turnê com Vinícius de Moraes na Argentina de 1974. Ele “sumiu” em Buenos Aires, deixando quatro filhos e a mulher grávida de mais um. Com mais de 170 horas captadas no Brasil, EUA, Argentina e França, ele agora pensa no formato que o filme pode assumir. Uma possibilidade é o da animação dos depoimentos, inspirada nas experiências de Valsa com Bashir, Persépolis e Waking life. “Ele saiu para passear na madrugada, a quatro dias do golpe militar na Argentina, e numa mais voltou. Foi torturado por sete dias e, após um ataque cardíaco, teve o corpo jogado no mar. Oficiais brasileiros participaram disso. Fiquei obcecado por essa história. É muito possível que eu saiba mais sobre ela do que a própria polícia, amigos ou a família de Tenório”.

Em 2004, a paixão pela música brasileira o levou a realizar El milagro de Candeal, documentário sobre a favela em que nasceu o compositor Carlinhos Brown, com participação de Brown, Gilberto Gil e Caetano Veloso. Exibido na Europa, o filme despertou investimento de instituições e voluntarismo entre os espanhóis, que construíram duas escolas e estimularam a formação de associações e cooperativas. Trueba, que sempre acreditou na na inutilidade do cinema (seu filme preferido é o clássico Contrastes humanos, de Preston Sturges), se viu surpreendido pelas possibilidades provocadas pelo documentário. “Sempre fiz comédias, adoro ouvir risadas nos meus filmes. Penso que a maior ambição do cinema é ser cinematográfico, antes de ser social ou ególatra. Como cidadão, tenho compromissos sociais, mas como diretor, minha maior responsabilidade é fazer um bom filme”.

(Diario de Pernambuco, 17/06/2010)

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