Lançamentos em DVD
O besouro verde (The Green Hornet, EUA, 2010). De Michel Gondry. 119 minutos. Sony Pictures.
Adaptado para o cinema, herói de antiga série de TV atualiza o tom de infâmia e situações absurdas. O protagonista, um playboy burraldo (Seth Rogen), conta com ajudade Kato (Jay Chou), assistente oriental versado em lutas e engenhocas, para combater o crime. Uma das armas é o jornal que herdou do pai, agora comandado pela loira Cameron Diaz, a qual pretende infantilmente conquistar. O nonsense funciona e, ao som do trompete de Al Hirt (reutilizado por Tarantino em Kill Bill), rende boas risadas.
Restrepo (EUA, 2010). De Tim Hetherington, Sebastian Junger. 94 minutos. Europa.
Documentário sobre o drama de soldados norte-americanos no Afeganistão causa estranha sensação de que já vimos aquelas imagens antes. Isso porque os diretores Hetherington (recentemente assassinado na Líbia) e Junger se valeram de recursos do cinema de ficção para construir a narrativa. A combinação é certeira. O filme varia entre depoimentos clássicos e a expedição, em que a troca de tiros é registrada como se a câmera estivesse na mão de um fuzileiro.
Pindorama - a verdadeira história dos sete anões (Brasil, 2008). 75 minutos. Canal Brasil.
Documentário aposta na curiosidade em torno de um circo mantido por sete irmãos, todos anões. Com a morte do pai, o palhaço Pindoba, eles herdaram o empreendimento, batizado Pindorama em homenagem ao fundador. O filme os apresenta durante temporada em cidade não identificada do Sertão pernambucano, região onde eles atuam. As cenas alternam entre as apresentações e o descanso, em que cada um conta a sua história. O sentimento é o de imersão naquela realidade.
Eu indico
Hotel Ruanda (EUA, 2004), de Terry George. Um filme verídico que mostra que, há pouco tempo, quase um milhão de pessoas morreram por divergências políticas, étnicas etc. O filme é pesado! Tem uma cena que mostra uma rua enorme, meio desfocada. Quando a imagem vai ficando mais nítida, a gente se deparada com uma lugar cheio de corpos e uma pessoa andando por cima (doideira!). Aí você vai refletindo que tudo aquilo rolou de verdade e se dando conta que, a qualquer momento, pode acontecer novamente. Duas coisas boas: a coragem do ser humano, que ultrapassa o medo da morte, e a trilha sonora que é muito boa.
Cannibal, vocalista da banda Devotos
Bastidores
Monty Python no Recife - Michael Palin, do cultuado grupo inglês Monty Python, está no Recife para gravar um programa para a TV britânica BBC. Ele chegou ontem à cidade, onde, tendo Paulo André Pires como cicerone, fará entrevistas com DJ Dolores, o artista plástico Derlon e conhecerá o Recife Antigo, Olinda e a vaquejada de Serrita. O nome do programa será Michael Palin in Brazil.
Luto - Cinema brasileiro de luto pela morte do cineasta, montador, produtor, crítico e gestor público Gustavo Dahl, 73 anos. Na última segunda-feira ele foi vítima de infarto. Seu primeiro longa, O bravo guerreiro, faz parte da trilogia de filmes políticos da segunda fase do cinema novo, ao lado de O desafio, de Paulo César Saraceni, e Terra em transe, de Glauber Rocha. Após participar da fundação da Embrafilme, nos anos 1970, continuou a exercer cargos políticos e atualmente era gerente do Centro Técnico Audioviusal (CTAV) do Ministério da Cultura.
Circulando - O curta Janela molhada, de Marcos Enrique Lopes, que acaba de participar do Cine OP (MG) e do Florianópolis Audiovisual Mercosul (SC), será exibido este fim de semana no 4º Cine Mube (SP) e em setembro, no 11º Curta SE. Desde a estréia, já recebeu quatro prêmios.
Festivais - Atenção realizadores: inscrições abertas para a 4ª Janela Internacional de Cinema do Recife, o 7º Fest Aruanda (João Pessoa-PB), 4ª Mostra Live Cinema (RJ), Curta Canoa (CE), 3º Festival do Filme Etnográfico do Recife, 6ª Mostra Cinema e Direitos Humanos e a 2ª Mostra Nacional Curta Sertão (Floresta, Tacaratu e Belém de São Francisco). O CEL.U.CINE (RJ) também acaba de ser lançado no Rio de Janeiro. O tema da primeira etapa é ditado popular. O primeiro lugar ganha R$ 18 mil.
(Diario de Pernambuco, 30/06/2011)
quinta-feira, 30 de junho de 2011
terça-feira, 28 de junho de 2011
Essa bebida tem história
Primeiro os animais; depois os índios; os colonizadores, vilarejos e cidades: Januária, Diamantina, Milho Verde, até chegar em Paraty. Investigação in loco sobre a rota secular que liga o norte de Minas Gerais ao litoral do Rio de Janeiro, o documentário Estrada Real da Cachaça coloca o cinema a serviço da antropologia etílica. Como o alambique para o caldo de cana, o filme destila cinema. Não à toa as sequências da produção da bebida, de evocação “vertoviana”, são plasticamente o que o filme tem de mais belo.
Talvez não há assunto mais brasileiro do que a cachaça. Como diz um dos depoimentos, são os muitos caminhos que levam à Estrada Real. Mas aqui somos conduzidos pela visão pessoal de Urano, fotógrafo que imprime sua intimidade com o assunto e faz interessante trabalho de montagem, mais visível no processo de moagem e fermentação da cana, além da fabricação do alambique.
Com depoimentos, personagens exóticos e belas paisagens, ele explica como a cachaça, normalmente fabricada nas usinas de cana, adentrou o norte de Minas Gerais.
Apesar de em 2008 ter sido aplaudido nos festivais de Locarno, Berlim e Rio de Janeiro (onde ganhou prêmio de melhor documentário), somente agora o longa de Pedro Urano entra no circuito nacional, um mercado difícil, em que os filmes mais interessantes quase não chegam ao público. No Recife, ele estreia sexta-feira no Cinema da Fundação e tem sessão especial hoje, com a presença do diretor.
Em seus melhores momentos, Estrada Real da Cachaça gera o efeito “road-movie”, por promover uma imersão em outra realidade, oculta em pequenas trilhas. Um universo invisível aos olhos de quem passa pelas rodovias. Para chegar a ele, é preciso sujar o pé de barro e adentrar pequenos vilarejos e antigos campos de mineração. É preciso seguir as pegadas dos tropeiros que no século 18 por ali passaram. Eis o reencontro com o Brasil colonial, onde a cachaça surge como principal combustível da corrida do ouro.
O filme recolhe fragmentos desse passado, registrados em película Super 16mm, que na montagem se mistura com imagens de arquivo. Especialistas (que só aparecem no final) pontuam a viagem, feita de encontros com personagens que contam, cantam e compartilham histórias e aforismos em torno da cachaça. Como este: “Cachaça limpa a memória, por isso vamos beber”.
Estrada Real da Cachaça é também uma viagem através da arte de construir imagens, ofício que Urano se dedica com mérito há pelo menos dez anos. Como diretor de fotografia, seu trabalho vem sendo reconhecido e premiado em filmes como Diário de Sintra (RJ), Superbarroco (PE), Áurea (RJ), Babás (SP), Ensolarado (MG), Praça Walt Disney (PE) e Faço de mim o que quero (PE). Agora é hora de conferir seu primeiro voo 100% autoral. A viagem é das boas.
Entrevista // Pedro Urano: "Há um interesse político em tornar visível essa história"
Você parece ter curtido muito fazer esse filme. Sempre gostou do tema?
Gosto de cachaça, não há como negar. E o filme também é a materialização desse gosto, mas tampouco se resume a isso. Não se trata de simples apologia, algo de que a cachaça não precisa. O filme é uma viagem no espaço e no tempo, um percurso, um caminho– uma estrada. A cachaça foi o meio que encontrei para acessar o imaginário do brasileiro. Um documentário através da cachaça.
Há cinco anos, você fez um curta sobre a Estrada Real. Foi um estudo para o longa. Há quanto tempo trabalha nesse projeto?
Depois de algum tempo pesquisando em casa, surgiu a necessidade de ir a campo. Tinha feito poucos filmes como diretor e precisava me convencer de que havia filme e de que era capaz de realizá-lo, para então seduzir ao projeto produtores, equipe e etc. A ideiaera conhecer lugares e situações, tirar algumas fotos, fazer uma pesquisa de imagens e sons. Pouco antes de viajarmos, comprei uma câmera de vídeo e resolvi levá-la comigo: serviria com um bloco de notas audiovisual. Quando voltamos pra casa, surpreendi-me com o material que havíamos rodado. Havia assistido há pouco ao Notas para uma Oréstia Africana, do Pasolini, um filme belíssimo que trabalha com essa ideiade ‘estudo preparatório’ para a realização de um outro filme, e resolvi montar um curta, que se chamou Estudo Etílico para Construção de uma Estrada Real. Não é uma versão menor do Estrada Real da Cachaça. Não há nenhuma imagem ou som comum aos dois filmes.
Você poderia contar a história da cachaça de várias formas. O que te levou à Estrada Real?
A história da Estrada Real surgiu de uma curiosidade muito grande sobre como Minas Gerais foi capaz de assumir a posição de destaque que inegavelmente possui hoje quando o assunto é cachaça. Afinal, Minas não é uma região com tradição no cultivo da cana-de-açúcar como são Rio, Bahia e Pernambuco, por exemplo. Então, por que Minas? A resposta a esse enigma surgiu quando encontrei um caminho calçado de pedras no interior do estado. Aquela 'estrada largada no meio do mato’, como alguém diz no filme, parecia sugerir que essa proeminência mineira se devia em grande parte à cultura bandeirante (e mais tarde tropeira) que descobriu, fundou e desenvolveu as chamadas Minas Gerais. Os bandeirantes e tropeiros, saídos de Paraty ou do Vale do Paraíba paulista sabiam que no sertão só se entra acompanhando da cachaça. E o filme, assim, se tornou também a história desse caminho, principal eixo de interiorização e desenvolvimento do país desde então.
Buscar a presença da cachaça na cultura brasileira a partir do recorte geográfico Minas-RJ não seria reducionista? O mapa também passa pelo nordeste...
Você tem razão. O mapa da produção e consumo da cachaça também passa pelo nordeste. E pelo norte, centro-oeste, sul... Cachaça se produz e consome em todo o território brasileiro. Quando comecei, pensava em viajar o país inteiro, mas logo percebi que essa vontade colocava em risco a efetiva conclusão do projeto. O Brasil é um país continental, e acabei por realizar esse recorte geográfico que é um pouco até onde conseguíamos chegar de carro. Com a descoberta das estradas reais a coisa encontrou uma direção e acabou se materializando assim: um filme sudestino. O norte e o sul de Minas, o quadrilátero ferrífero, o Vale do Paraíba paulista e o sul fluminense reuniam uma diversidade incrível de paisagens e situações mas, estranhamente, possuíam algo em comum.
O filme viaja de Minas ao RJ, no que parece ser a contramão do surgimento da estrada. Qual foi a intenção?
É a contramão do surgimento das estradas e da ocupação do território, mas é o sentido do escoamento da produção mineral, das riquezas, desde o século 18 até hoje. Além disso, a cachaça foi o primeiro produto industrial brasileiro a desbancar seus concorrentes no mercado internacional, tornando-se símbolo de um país que ainda não existia. Não é por acaso que tenha sido muito utilizada quando da elaboração de uma certa ideia de Brasil (por vezes extremamente estereotipada)pensada para seduzir estrangeiros. A cachaça sempre esteve presente na construção de uma auto-imagem ‘tipo exportação’ do país. Vi sentido no caminho apontar para o outro, para o oriente, o desconhecido, o mar. A colônia era toda voltada pra Europa, afinal. Mais do que isso, no entanto, percorrer o caminho nesse sentido permitiu que o filme materializasse uma busca pelas origens da cachaça, do país, do brasileiro. “A coisa começou em Paraty, então é lá que vamos terminar!”, pensei.
A fotografia (muitas paisagens e cores fortes) e as sequências de produção da cachaça, são lindas. Fale sobre essa concepção, de como ela é útil ao filme.
Isso aí foi fruto da pesquisa de imagens de que falei há pouco. Desde o início, coloquei-me a questão de quais eram as imagens e sons do filme que sonhava construir. É uma questão que me acompanha. Estou sempre a fazê-la quando começo um projeto. Prefiro trabalhar com imagens e sons a trabalhar simplesmente com um texto. Essa é a diferença do que fiz para uma reportagem, seja ela boa ou ruim. Claro que há falas no filme, mas essas falas não esgotam seu interesse no conteúdo do que está sendo dito. O que quero dizer é que durante toda conversa ou entrevista, havia uma preocupação constante com o tom de voz, o ritmo, enfim, com a materialidade sensorial de cada fala. Um ótimo exemplo disso é a sequência que, durante a montagem, chamávamos de tropeiro-fantasma (o filme tem muitos fantasmas). Acontece lá pelo meio do filme, quando começamos a falar sobre a atividade mineradora na atualidade. Ouvimos um discurso pausado, um tom de voz baixo, algo clandestino, vez por outra pontuado por explosões típicas da prospecção de minérios. Essa foi uma entrevista que fizemos no alto de uma montanha, logo após o pôr-do-sol. A serenidade do lugar e daquela hora do dia condicionaram o estado de espírito do entrevistado e isso me pareceu um contraponto interessante ao que estava sendo dito. Ou seja: há o discurso verbal, mas não é ele sozinho que estrutura a narrativa. Não é um filme puramente racional, ele mobiliza mais de um sentido. É um filme sensual, sensorial, endereçado ao corpo do espectador como um todo. Trata-se também de comunicar a experiência da viagem, as mudanças na paisagem, nos ambientes acústicos. O filme, que tem como patrono Exú, senhor dos caminhos e amante da branquinha, é também um filme sobre o movimento.
Você também trata das condições de quem trabalha na usina e nos minérios e de como essas pessoas vivem atualmente. Há um interesse político de denúncia?
Há um interesse político de colocar a atualidade em perspectiva. Tentar entender como chegamos a ser o que somos hoje – qual foi nosso percurso até aqui. A extração do minério de ferro é a atualização da atividade mineradora, que começou no século 18 e só se intensificou desde então. Com a diferença de que ouro se encontra em veios e o minério é a montanha inteira. Algumas das montanhas que orientavam bandeirantes e tropeiros na direção das minas já não existem mais: seguiram por trem até o porto para alimentar o crescimento chinês. Ainda exportamos minério in natura, sem beneficiamento algum. Isso sem falar no custo ambiental da atividade. Não se trata de denúncia, até porque estamos falando de algo público e notório, nem de se colocar contra o desenvolvimento ou a atividade mineradora. Trata-se justamente de tornar visível essa realidade.“A arte não representa o visível, ela torna visível” (Paul Klee). E então colocá-la em discussão: esse é o modelo de desenvolvimento que queremos?
O filme é sobre memória, e nisso as imagens de arquivo tem papel importante. Como foi executar essa parte do trabalho?
Teve uma coisa legal durante a pesquisa que é o seguinte: uma das principais fontes de informação sobre o período colonial são os relatos dos viajantes europeus que visitaram o Brasil. E esses senhores produziam aquarelas e desenhos que, quando voltavam pra Europa, transformavam em gravuras que eram publicadas acompanhadas de textos que justamente descreviam o que estava ali representado. Vi nesses livros proto-documentários extremamente subjetivos, muitas vezes fantasiosos, que me sugeriram uma abordagem poética para o filme. Afinal, o material mais, digamos, histórico a que se tinha acesso eram quase como relatos de sonhos! Esse tipo de abordagem mais criativa vinha muito a calhar também pois estava trabalhando com um passado pré-cinema, pré-fotográfico e não me seduzia a ideia de trabalhar com pranchas ilustradas num filme tão comprometido com o movimento. Foi aí que decidi criar imagens de passado, filmando em super 8 e trabalhando a película para que a textura da imagem comunicasse essa distância temporal. A maior parte das imagens de arquivo do filme fui eu mesmo que rodei, inclusive recriando alguns desenhos de Rugendas e Debret.
O longa está pronto desde 2008, foi duas vezes premiado e exibido em vários festivais. Por que é difícil conseguir espaço no circuito comercial?
Essa é uma pergunta para distribuidores e programadores de salas de cinema. Uma pergunta que deve ser feita. Eu apostaria em duas respostas: há poucas salas para o filme autoral brasileiro e o preço do ingresso é demasiado caro. Cinema é meio de comunicação de massa, arte para a multidão. Não pode resumir seu alcance somente aos estratos mais abastados da população. Do jeito que está, é inviável.
Como fotógrafo, você tem participado de vários filmes pernambucanos. Alguma atração especial pelo cinema feito aqui?
Por uma série de fatores como o apoio do Estado, uma aposta na distribuição dos recursos (e não na concentração, como é o caso do Rio) e, principalmente, pela existência de realizadores extremamente talentosos, o cinema pernambucano está, já há alguns anos, na vanguarda da criação cinematográfica do país. Há muito filme bom sendo produzido por aí, e é uma felicidade fazer um bom filme. Por isso, espero ter a oportunidade de ainda fazer muitos filmes em Pernambuco.
Em quais projetos tem trabalhado ultimamente?
Estou finalizando meu próximo documentário de longa-metragem, chamado simplesmente HU. É um documentário inteiramente filmado no monumental e inconcluso prédio modernista do Hospital Universitário da UFRJ, um edifício dividido ao meio: metade hospital, metade ruína. É um filme sobre o modus operandi da coisa pública no Brasil, sobre como o Estado funciona no país e sobre a importância que de fato damos a coisas tão fundamentais como a saúde e a educação públicas. Após décadas de abandono, a metade vazia do prédio sofreu um abalo estrutural e foi implodida em dezembro do ano passado. Nosso documentário se tornou assim a única imagem daquele lugar. O filme fica pronto no segundo semestre desse ano. E tem também os filmes que vou realizar como fotógrafo que, afinal, é minha ocupação predileta e principal.
(Diario de Pernambuco, 28/06/2011)
quinta-feira, 23 de junho de 2011
Qual o futuro das salas de cinema?
Nos últimos meses, os cinemas tem oferecido um cardápio bem mais diverso do que os tradicionais filmes de ficção e documentários. Entre as opções estão óperas, balé, teatro, shows e eventos esportivos. Neste fim de semana, por exemplo, o público de 35 cidades brasileiras poderá assistir a uma apresentação em 3D do grupo Foo Fighters. Antecede o documentário Back and forth, de James Moll, que perpassa a história da banda desde sua fundação em 1995 (após o fim do Nirvana) à gravação do novo álbum, Wasting light. O “combo” doc/show será exibido em 75 salas - UCI Kinoplex Recife no circuito.
A ascensão dos novos conteúdos nas salas de cinema tem se tornado possível com a digitalização gradual do parque exibidor, aliado ao poder de mobilização das redes sociais. Ao perceber o potencial desse mercado, os empresários Fábio Lima e Marco Aurélio Marcondes criaram a MovieMobz, a primeira distribuidora a oferecer filmes sob demanda. “Já estávamos trabalhando com cinema independente e começamos a diversificar com óperas e musicais”, conta Fábio, que trabalha com cinema digital desde 2003, quando fundou a Rain Networks.
O primeiro grande projeto foi a exibição de Iron Maiden - Flight 666 em 103 salas de dez países, com ocupação média de 98%. O recorde foi batido ano passado, com a volta do doc-show U23D, que já havia sido exibido em 2007. “Naquela época o Brasil só tinha 20 salas em 3D, hoje são mais de 300”, diz Lima. A diversificação do conteúdo levou a distribuidora a retirar o “movie” do nome. Hoje, antes de ser empresa, a Mobz se apresenta como conceito. “Há uma audiência específica para cada produto e cabe a nós adequar os lançamentos ao tamanho do público. Isso é mais inteligente do que não lançar só porque não se trata de um blockbuster”.
Na prática, o sistema é simples. Através do site Mobz.com.br, o público escolhe o que quer assistir - as opções atuais vão da temporada do Metropolitan Opera (ao vivo, via satélite) a filmes do catálogo Hollywood Classics. Quando uma cota mínima é atingida, os ingressos são vendidos, on-line ou na bilheteria dos cinemas parceiros, que adequam as sessões em horários periféricos. “Pelo menos por enquanto, os cinemas dão prioridade ao blockbuster. Esperamos que isso se equilibre no futuro”, diz Lima.
No Recife, a Mobz faz parceria com grupo UCI / Ribeiro. Entre os eventos ao vivo, o Ballet Bolshoi tem rendido o melhor público: 61% para O quebra nozes e 68% para o Don Quixote. Com 30 anos de experiência no mercado, o programador Pedro Pinheiro acredita que a tendência é o crescimento do público e opções de conteúdo alternativo. “É uma programação importante para formar novas plateias”.
A nova arena virtual - O cinema, que nasceu como atração de circo, aos poucos volta às origens. As sessões eram abrigadas sob tendas, onde se projetavam teatro, dança e outras maravilhas da natureza e do progresso. A entrada custava um níquel - daí os primeiros cinemas serem chamados Nickelodeons. Hoje, o preço subiu (no Recife, óperas chegam a R$ 50) e a tecnologia permite transmissões ao vivo em alta resolução.
Mas, com os conteúdos via internet e equipamentos cada vez maiores, melhores e mais baratos, por que as pessoas ainda vão ao cinema? “Há no ser humano o hábito de se encontrar”, acredita Fábio Lima, da Mobz. “O filme pode ser assistido a qualquer momento, mas nos conteúdos especiais, principalmente ao vivo, a sala replica uma experiência de arena que dificilmente seria possível em casa”.
Lima vê uma nova dinâmica para os cinemas do futuro, que oferecerão uma combinação de conteúdos massivos (blockbuster) e segmentados (produtos independentes ou regionais). “Como os filmes rapidamente estão disponíveis para download, talvez eles fiquem menos tempo em cartaz, ou seja, cada vez mais, megaestreias terão períodos curtos de exibição”.
O parque exibidor já se adequa à demanda. De acordo com Lima, de 2.700 salas brasileiras, 300 são digitais e 50 estão equipadas para eventos ao vivo. Nos próximos meses, ele planeja investir na ópera e, em setembro, na reestreia de clássicos. Teatro ao vivo, a Copa 2014 e jogos em rede estão entre ambições futuras. Com data marcada estão exibições comemorativas dos 50 anos de Bonequinha de luxo e os 40 anos de O poderoso chefão.
Faça a programação
Eventos
Foo Fighters - Wasting light 3D (hoje e amanhã)
MET Opera - Lucia di Lammermoor (02/07)
MET Opera - Chance: o Conde Ory (09/07)
MET Opera - Ifigênia em Tauris (16/07)
MET Opera - Don Carlo
U2 3D
Orquestra Filarmônica de Berlim 3D
ESPN 3D - Final UEFA Champions League
Filmes
Bonequinha de luxo, de Blake Edwards (16/09)
De volta para o futuro, de Robert Zemeckis (21/10)
O poderoso chefão, de Francis Ford Coppola (23/03/2012)
Os pássaros, de Alfred Hitchcock
Tragam-me a cabeça de Alfredo Garcia, de Sam Peckimpah
Edward Mãos de Tesoura, de Tim Burton
Três homens em conflito, de Sergio Leone
(Diario de Pernambuco, 24/06/2011)
Coluna de lançamentos, bastidores e "eu indico" da semana
A montanha dos sete abutres (Ace in the hole, EUA, 1951), de Billy Wilder. 111 minutos. Paramount.
Esta severa crítica ao jornalismo traz Kirk Douglas como repórter obstinado pela reportagem que o recolocará no mainstream da imprensa. A oportunidade surge quando um homem soterrado poderia ser retirado em vida, e só não é porque Douglas manipula a ambição e vaidade alheias para explorar ao máximo a notícia. Isso, aliado à atitude das autoridades e família da vítima que lucra com o circo armado, nos leva aos verdadeiros abutres que dão nome à montanha.
Cisne negro (Black swann, EUA, 2010). De Daren Aronofsky. 113 minutos. Fox.
A tortura física e psicológica que Nina (Natalie Portman) sofre na mão do coreógrafo (Vicent Cassel) a leva para o mesmo mal-estar que Aronofsky quer transferir a quem assiste ao filme. Cotada para protagonista da nova peça da companhia, O lago do cisne, Nina interpreta o Cisne Branco com inigualável técnica e precisão. Mas para conseguir o papel, ela precisa incorporar o comportamento sexual e imprevisível do Cisne Negro, qualidades que sua rival Lily (Mila Kunis) mostra ser bem mais desenvolta. A perfeição, descobre Nina, tem seu preço.
O discurso do Rei (King’s speech, Inglaterra, 2011). De Tom Hooper. 118 minutos. Paris Filmes.
Sem a ótima performance de Colin Firth como o príncipe que para ser rei precisa superar a gageira, o filme de Hooper dificilmente chegaria ao Oscar. Não há nada de mais nas intrigas de poder por trás da coroa, ou na caracterização de época, os anos 1930-40. O núcleo forte da trama está na relação de George não com a esposa e futura Rainha Elisabeth (Helena Bonham Carter) mas com seu irreverente terapeuta (Geoffrey Rush), que busca curar seu paciente pela via emocional.
EU INDICO
Recomendo Ensaio de orquestra (Prova d'orquestra, Itália, 1978), de Federico Fellini. O filme se passa inteiramente em um ensaio de uma sinfônica, mostrando os conflitos entre o maestro e os músicos, a vaidade de cada músico e como a “personalidade” dos instrumentos tem a ver com quem os toca. No meio de tudo isso, os músicos fazem uma greve contra o maestro. É bem engraçado.
Ricardo Chacon, músico
Bastidores
Recife frio - Após vencer o Grande Prêmio do Cinema Brasileiro como melhor curta-metragem de 2010, Recife frio entra em cartaz em sete capitais, dentro da programação da Sessão Vitrine. O curta de Kleber Mendonça Filho antecede a produção gaúcha Morro do céu, de Gustavo Spolidoro. Pena que a cidade que inspirou o filme ficou fora do circuito.
Menestrel - Dirigido por Wilson Freire, o documentário Galo Preto - O menestrel do coco será lançado amanhã, às 19h, no Nascedouro de Peixinhos. Histórias não faltam para o coquista, que enfrentou altos e baixos em seus 75 anos de vida, 63 de carreira. A programação ainda traz shows de Coco Raízes de Arcoverde e Coco de Mazurca.
Abre - O Festival de Veneza, que começa em 31 de agosto, definiu qual será seu filme de abertura: The ides of march, dirigido e estrelado por George Clooney. Além disso, foram anunciados uma homenagem a Al Pacino e os presidentes do júri oficial e mostra Orizzonti, respectivamente, Daren Aronofsky (Cisne negro) e Apichatpong Weerasethakul (Tio Boonmee).
"Carros 2" dá volta ao mundo e traz espionagem para as pistas
Foi dada a largada para mais uma produção Disney / Pixar. De olho no feriadão, Carros 2 entra hoje em cartaz em 655 salas no Brasil - 14 delas no Recife. A antecipação do calendário de férias, onde o desenho estaria mais à vontade, se mostra prudente. A nova produção de John Lasseter não teria fôlego para competir com Transformers (estreia dia 1º), Harry Potter (15) e Capitão América (29). O primeiro Carros estreou em 1º de julho de 2006 e, nos Estados Unidos (onde venceu o Globo de Ouro), foi a segunda maior bilheterias do ano. No Brasil, foi a quinta.
Se comparado ao primeiro, Carros 2 é sem dúvida um produto tecnicamente superior. Cinco anos se passaram entre os dois longas e, no mundo da computação gráfica da Disney/Pixar, isso significa estar em outro planeta. Em 3D, os cenários estão mais realistas, principalmente nas sequências de corrida e perseguição. Um mundo mais-que-perfeito, habitado por carros vivos, que agem como humanos.
O roteiro da continuação, escrito por John Lesseter (diretor) e Brad Lewis (co-diretor), se mostra mais elaborado. Fere, no entanto, o espírito da história anterior, um elogio à amizade e valores tradicionais. Com muita ação, o desenho agora aposta em fórmulas dos filmes de espionagem internacional. O foco continua na amizade entre Relâmpago McQueen e o carro-guincho Mate. Ela é abalada durante campeonato mundial em prol de uma nova fórmula de biocombustível, capaz de abolir a necessidade de petróleo. Mas a caipirice de Mate atrapalha McQueen. Nos bastidores, uma trama maior mobiliza agentes secretos contra organização a favor do petróleo.
O problema é que, se Carros 1 investe na importância de desacelerar e prestar atenção nos habitantes da cidadezinha de Radiator Springs, tudo está mais rápido e frenético em sua continuação. A história se desenvolve entre pistas de corrida no Japão, Itália e Inglaterra, onde o McQueen se esforça para vencer um exibido modelo de F-1.
Sem querer, Mate se torna protagonista de uma trama maior, que envolve uma máfia internacional de combustíveis. Tudo ocorre tão rapidamente que a pertinência do debate sobre o biocombustível como alternativa para o petróleo termina sendo apenas uma boa desculpa para os maiores de 18 anos assistirem a um desenho animado sem culpa. O tema “adulto” tampouco complica a vida das crianças, que devem se divertir com o sobe-e-desce das pistas.
O som original é sempre uma boa opção, e duas salas do Recife (Kinoplex Casa Forte e Recife) oferecem cópias legendadas com vozes de Owen Wilson, Michael Caine (como Finn, o carro-espião), John Turturro (Francesco) e pontas de Franco Nero, Sophia Loren e Vanessa Redgrave. Já a versão nacional traz como destaque as vozes de Emerson Fittipaldi, Luciano do Valle e Claudia Leitte, como carro-mulher brasileiro, Carla Veloso. O curta Férias no Havaí, que antecede o longa, mostra personagens de Toy Story ajudando o casal de bonecos Barbie e Ken. Poderia ser uma atração a mais, mas não chega a tanto.
Uma brasileira na Pixar - Carlos Saldanha é celebrado como o brasileiro mais famoso do mundo dos desenhos animados. Mas o criador de Rio e diretor de Era do gelo partes 2 e 3 não está só. São vários brasileiros contratados por estúdios norte-americanos. Uma das mais experientes é a paulistana Nancy Kato. Há mais de uma década ela se juntou à equipe da Pixar Animation Studios, na Califórnia.
Um dos efeitos básicos de um desenho animado é também um dos mais difíceis de ser criado: o movimento, que provoca a ilusão de que os personagens estão vivos. O talento de Nancy está a serviço do departamento de animação, onde ela participou de desenhos famosos como Toy story 2, Monstros S.A., Os Incríveis, Ratatouille, WALL-E e Up - Altas aventuras. Pelo trabalho em Carros, foi premiada em 2007 pela Visual Effects Society. Ela também participa de Brave, novo projeto do estúdio, com estreia prevista para julho de 2012.
O projeto mais recente a ganhar sua dedicação é Carros 2. Com exclusividade para o Diario, Nancy revela detalhes de seu ofício na Pixar e particularidades de seu mentor, John Lasseter.
Entrevista // Nancy Kato: “John Lasseter é maravilhoso, um rei da animação”
Como começou sua carreira de animadora?
Me formei em arquitetura e fui para Nova York fazer mestrado em computação gráfica. Estudei dois anos e de lá arrumei emprego em Los Angeles. Quando mandei meu portfólio para Pixar, trabalhava na Rhythm’n’Hues Studios, de Los Angeles, onde fazia efeitos para filmes como Expresso polar e comerciais como o urso polar da Coca-cola. Em 1999 fui chamada como freelancer para trabalhar em Toy Story 2. Em Monstros S.A. já estava contratada.
Com quais personagens você trabalhou em Carros 2?
Trabalhei mais com McQueen e Mate, mas também com outros personagens. O departamento de animação é bem grande, são mais de cem animadores responsáveis por toda a parte de movimentar os desenhos.
E quantos animadores foram mobilizados?
À medida que foi chegando o deadline, mais pessoas foram incorporadas. Como o John Lasseter assumiu a direção durante esse processo, o projeto passou por mudanças. No total, foram 70 animadores.
E como é trabalhar com John Lasseter?
Ele é maravilhoso, um rei da animação e por isso mesmo todo mundo tem um pouco de medo. Todos os dias revisamos o material numa pequena sala de cinema, com ele no meio e os animadores em volta. De forma tranquila e confiante, ele faz comentários sobre cada cena. Ele é muito claro com as ideias, sabe exatamente o que quer, mas também aceita boas ideias.
Carros 2 trouxe novos desafios?
É uma animação mais simples de fazer porque os personagens não tem braços ou pernas. Isso, em termos de controle, é mais simplificado. E ao mesmo tempo desafiador, porque é difícil fazer personagens atuar com poucos parâmetros. A limitação faz você procurar soluções simples e que transmitam a ideia. É mais rápido de animar, mas precisa trazer personalidade para personagens mais duros, sem tanta flexibilidade.
No desenho, os automóveis têm vida, falam e agem como seres humanos. Como eles ganham personalidade?
Assistimos vídeos dos atores enquanto gravam as vozes dos personagens. No caso de Owen Wilson, que faz a voz de McQueen, assistimos seus filmes e levamos sua expressão facial para os persoangens.
Então quando a cena é desenhada o diálogo já está gravado?
Sim. Começamos a partir do som. Antes disso, o departamento de layout, faz a coreografia, pensa os movimentos de câmera, a duração das cenas e os diálogos. A partir daí desenhamos os personagens. Claro que se algum movmento de câmera não interagir com o desenho, dá para adequar de acordo com a dinâmica do personagem.
O primeiro Carros foi lançado em 2006. O que pode ser antecipado sobre a continuação?
O primeiro é mais norte-americano, voltado para o interior do país, é mais familiar. Os personagens principais continuam, agora com alguns novos. E a história tem mais ação, espionagem, aventura, é uma viagem pelo mundo. Mas os principais pontos continuam, como a amizade entre McQueen e Mate.
Você passou pelas duas fases da Pixar, antes e depois de ter sido comprada pela Disney. O que mudou?
Não mudou muita coisa, a não ser que agora temos o Silver Pass, um passe livre para visitar o parque. Eles respeitam muito a Pixar, nos deixam à vontade, sem impor um jeito Disney às produções. Pelo contrário, eles querem levar a cultura da Pixar para a Disney.
Há muitas mulheres trabalhando com animação na Pixar?
As mulheres correspondem a 10% do departamento. Na parte de desenvolvimento de roteiros, a parcela é menor ainda. Acho que é cultural, desde crianças, os meninos são muito ligados às histórias em quadrinhos. Aqui, as mulheres atuam mais como produtoras.
O que você achou do Rio de Carlos Saldanha?
Conheço ele, é um bom amigo. Adorei o filme, achei um bom retrato do Rio. A animação dos pássaros é o mais difícil e ficou bem bacana.
(Diario de Pernambuco, 23/06/2011)
terça-feira, 21 de junho de 2011
Meia-noite em Paris é um sucesso
Meia-noite em Paris chegou ao circuito comercial na última sexta-feira, um mês após abrir o Festival de Cannes. Rapidez incomum, considerando que o público brasileiro já teve que esperar mais de um ano para assistir outros filmes do diretor. A agilidade da distribuidora, que por coincidência se chama Paris Filmes, se mostrou acertada. A Paris de Woody Allen não é apenas adorável. É um sucesso de bilheteria.
Em seu fim de semana de estreia, 130 mil brasileiros assistiram Meia-noite em Paris. O filme está em cartaz em 93 salas, o que totaliza uma média de 1.350 pessoas por cópia. Somente no Recife, 3.705 bilhetes foram vendidos. Várias sessões estavam lotadas. “Nas praças em que eu trabalho, nunca vi um Woody Allen entrar tão forte assim”, diz Pedro Pinheiro, programador do grupo UCI / Ribeiro. “No Rio de Janeiro, nossos cinemas somaram público ode 14.393 pessoas”. Há 40 anos no ramo, Jaime Tavares, diretor de programação da Paris Filmes, confirma este como o filme de Allen mais bem aceito no país.
Com o devido respeito aos que ficaram de fora, é um prazer registrar que, ao menos por um fim de semana, dezenas de salas de shopping estiveram 100% ocupadas por gente atraída por um filme quase artesanal, distante da lógica blockbuster. O elenco liderado por bons atores (Owen Wilson, Rachel McAdams) e a ponta de luxo da primeira-dama Carla Bruni pode explicar somente parte deste sucesso. O grande feito de Meia-noite em Paris é tornar simples e acessível o que Woody Allen tem de melhor - texto afiado, humor inteligente e a narrativa despojada. E chegar a esse nível não é pra qualquer um.
Através de Allen, parte do público terá o primeiro contato com Ernest Hemingway, T.S. Elliott, Man Ray, Scott Fitzgerald, Gertrude Stein, Luis Buñuel e Cole Porter. São eles a quem o roteirista e aspirante a escritor (Wilson) encontra na madrugada, na informalidade de festas e mesas de bar. A visão idealizada do passado não é fantasia escapista, mas uma “terapia” que leva a Gil perceber o fracasso de seu noivado. Que ele não nasceu na época errada. Talvez, no país errado (os EUA). O passado como divã para o presente.
Desprezado pela noiva (McAdams) e ofuscado pelo pedantismo de seu rival (Michael Sheen), Gil encontra na turma dos anos 1920 a oportunidade de se reencontrar. O filme (e nós) estamos do seu lado. Uma bela defesa da necessidade do sonho, de se encantar pelo mundo e da arte como (re)invenção.
(Diario de Pernambuco, 21/06/2011)
segunda-feira, 20 de junho de 2011
Cenas de demolição explícita
Nos últimos tempos, o cinema local tem sido pródigo em questionar os descaminhos do Recife enquanto projeto de cidade. Ninhos antigos, de Osman Godoy, é o mais novo manifesto nesse sentido. O documentário será exibido hoje, às 19h, no Cinema da Fundação (Derby). O média-metragem (40 minutos) é a contribuição de Godoy para um projeto maior, coordenado pelo professor de arquitetura Denis Bernardes, dedicado a estudar as moradias da capital pernambucana entre 1850 e 1930.
Em seu melhor momento, a produção refaz o percurso filmado nos anos 1920 pelos pioneiros do cinema Ugo Falangola e J. Cambieri. Diálogo vital com Veneza americana, concebido para mostrar um Recife moderno, desprovido de traços coloniais. Godoy, que se lançou no cinema durante o ciclo do Super 8, revisita essas imagens como forma de refletir o destino da cidade e valorizar seu registro, sua memória.
“Fiz amizade com Denis Bernardes quando na produção do documentário Caneca e a confederação do equador”, conta Godoy. Dali surgiu a ideia de fazer a pesquisa Recife em transformação - modos de morar e construir, aprovada pelo Funcultura, da qual participou um grupo de arquitetos e a socióloga Márcia Mansur, que conduziu as entrevistas. “Quis fazer um filme que mostrasse o sentimento da equipe, que localizou casas prestes a ser demolidas, conversou e sentiu o drama dos moradores. Pensei neste documentário sobre educação patrimonial como uma tentativa quixotesca de barrar esse processo”.
Entre os depoimentos estão o da arquiteta Amélia Reinaldo, da escritora Luzilá Gonçalves (que abriu sua casa no Poço da Panela) e o de Dona Virgínia Azevedo, de 78 anos, que nasceu Rua da Hora e acompanhou sua história. Do interior de uma loja de roupas, onde compra uma camisola, ela mostra onde ficava a casa de Mário Mello e, andando na calçada, se surpreende ao encontrar uma farmácia onde, diz ela, há dois meses havia uma casa.
“As pessoas vão se rendendo. As construtoras fazem propostas irrecusáveis. Os idosos resistem, mas até certo ponto. Depois abandonam suas casas não só por dinheiro, mas porque os vizinhos já se foram, os familiares mais novos se mudaram para Boa Viagem”, diz Godoy. Há um tom de lamento, o de que, salvo exceções, a inexorável marcha do progresso passa por cima do patrimônio arquitetônico. Imagens como as da demolição de um casarão histórico, falam mais alto do que qualquer palavra.
O diretor não estará na exibição de hoje, pois está no Festival de Cinema de Jericoacoara (CE), onde foi convidado para ser membro do júri. O representa sua filha Hanna Godoy, produtora do filme, e Denis Bernardes, que conversam com o público depois da sessão.
(Diario de Pernambuco, 20/06/2011)
sexta-feira, 17 de junho de 2011
Elogio ao cinema
Estreia hoje, no Cinema da Fundação, Chantal Akerman, de cá (Brasil, 2010), de Gustavo Beck e Leonardo Luiz Ferreira. A princípio, o documentário diz respeito a poucos. São 61 minutos de entrevista com diretora belga de filmografia poderosa, mas pouco conhecida no Brasil. No entanto, o longa interessa a todos os que gostam de cinema e da arte como forma de compreender a vida.
Conduzida em inglês, a conversa com Chantal repassa seus anos de formação, preferências estéticas, influências e hábitos pessoais. O método de abordagem adotado pelos diretores é pouco convencional. Durante a conversa com Chantal, duas câmeras foram utilizadas. Uma enquadra a diretora de frente, ponto de vista clássico do cinema documental. Outra foi posicionada na antesala, de onde, oculta, registra tudo do lado “de cá”. O filme utiliza imagens desta, em plano único, fixo, sem montagem ou qualquer outra interferência no fluxo da entrevista.
Assim, deslocado do espaço de interação “oficial”, o filme se constroi. Em palavras, gestos e expressões de Chantal (entrevistador e a equipe ficam fora de quadro). No suntuoso salão do Centro Cultural Banco do Brasil (RJ), enquadrado de forma a desenhar uma “tela dentro da tela”. Na fotografia, que valoriza paredes, portas e corredores, tão importantes quanto a personagem. No plano único e de longa duração, que força o espectador a tomar consciência do transcorrer do tempo. Recursos que remetem a filmes da diretora, como Jeanne Dielman, de 1975.
Passado o estranhamento inicial, o filme flui. Diretor de A casa de Sandro (2009), Beck justifica o passo atrás (ou ao lado) como fundamental para oferecer espaço a personagem, “e permitir que o tempo do filme viesse dela”. Conseguiu. É um belo tributo à Chantal Akerman. E à arte de fazer cinema.
quinta-feira, 16 de junho de 2011
Coluna de lançamentos, bastidores e "eu indico" da semana
Bravura indômita (True grit, EUA, 2011). De Joel e Ethan Coen. 110 minutos. Paramount.
Não é um remake (há versão prévia para o cinema estrelada por John Wayne), mas uma nova adatpação do romance em que garota de 14 anos (Hailee Steinfeld) encomenda aos xerifes Rooster Cogburn (Jeff Bridges) e LaBoeuf (Matt Damon) a morte do assassino de seu pai. Menos western e mais fábula, a força do filme está na formação da garota no mundo da violência, amparada na figura do pai e do herói.
Identidade paranormal (Shelter, EUA, 2010). De Måns Mårlind, Björn Stein. 112 minutos. California.
O título vem na esteira do sucesso de Atividade paranormal, mas um filme não tem nada a ver com o outro. Estrelado por Julianne Moore, temos aqui o drama de uma mãe / psiquiatra que questiona a absolvição de criminosos acusados de dupla identidade. Seu pai a apresenta para um caso ainda mais desafiador, o de um assassino que abriga (daí o título em inglês) múltiplas identidades. A partir daí, ela precisa rever sua crença no divino e no demoníaco.
Filme socialismo (Film-socialisme, França, 2010). De Jean-Luc Godard. 101 minutos. Imovision.
Aos 80 anos, um dos grandes diretores da Nouvelle Vague e do cinema mundial continua em forma e nos oferece mais um contundente manifesto de liberdade criativa e de crítica ao comportamento humano. Foco no questionamento aos hábitos burgueses durante cruzeiro no Mediterrâneo, que passa pelo Egito, Palestina Odessa, Hellas, Nápoles e Barcelona. O cinema de Godard prescinde da lógica formal para se moldar ao pensamento. Vale cada fotograma.
Eu indico
“Adaptação (Adaptation, EUA, 2002), de Spike Jonze. Comentei sobre esse filme com Bactéria, ex-Mundo Livre S/A, e falamos bastante sobre cinema. Gosto de tantos filmes, mas esse tem um universo muito bem costurado com as orquídeas, por isso me chamou a atenção. O começo do longa é justamente no set de Quero ser John Malckovich, do mesmo diretor. Bem interessante”
Clayton Barros, da banda Os Sertões
Bastidores
Repressão - Relatos de 24 mulheres que foram presas políticas entre 1969 e 79 estão registrados no documentário Vou contar para meus filhos, que será exibido hoje (para convidados) e amanhã (aberto ao público), no Cinema Apolo (Recife Antigo). A direção é de Tuca Siqueira.
Alexina - Entre os dias 16 e 27 deste mês, Cláudio Bezerra e equipe estarão em Cuba para rodar o documentário Alexina, sobre a militante das ligas camponesas Alexina Crespo (foto), viúva de Francisco Julião, hoje com 84 anos de idade. Por problemas de saúde, ela não poderá retornar à ilha onde viveu exilada com os filhos. Um deles, Anatólio Julião, revisitará os lugares e pessoas com as quais a família conviveu nos anos 1960. O diretor de fotografia será Roberto Chile, há mais de 20 anos o fotógrafo oficial de Fidel Castro.
Spielberg - Principal estreia nos Estados Unidos, o filme Super 8 marca a volta de Steven Spielberg ao universo da ficção-científica juvenil. É dele a produção executiva do longa que se passa em 1979, quando um grupo de amigos pré-adolescentes de pequena cidade usam a câmara supracitada para uma brincadeira que acaba virando coisa séria. A direção é de J.J. Abrams, que já deu interessantes demonstrações de competência em Star Trek, Missão impossível 3 e na série Lost.
Cine PE - Na última terça-feira, realizadores pernambucanos entregaram à BPE Produções, organizadora do Cine PE, documento coletivo com uma série de sugestões para o próximo festival. O próximo encontro, este de trabalho, será em 19 de julho.
Varilux - No Recife, o Festival Varilux esteve com praticamente todas as sessões lotadas no Cinema da Fundação. O evento cresceu e talvez seja hora de ocupar outras salas da cidade. O problema é que não há tantas opções: poucos cinemas contam com exibição digital na cidade.
(Diario de Pernambuco, 16/06/2011)
terça-feira, 14 de junho de 2011
De volta aos clássicos
Heitor Villa-Lobos. Elomar. Roberto Corrêa. Ney Matogrosso. Xangai. Paulinho da Viola. Sivuca. Geraldo Azevedo. Quando a gravadora Kuarup fechou as portas, em 2005, deixou um catálogo poderoso, mais de 200 títulos à deriva. A boa notícia é que eles estão de volta, em novo tratamento de áudio, ou seja, 100% remasterizados.
Desde o início do mês, os dez primeiros álbuns chegaram ao mercado, graças a uma parceria da nova diretoria da Kuarup com a Sony Music, que faz a distribuição. De acordo com Arthur Fitzgibbon, consultor artístico e um dos sócios da Kuarup, a união com a Sony foi essencial. “É importante para a Sony, que agrega valor histórico com um catálogo alta qualidade artística. Com a estrutura que ganhamos em troca, conseguimos chegar em lojas que de outra maneira nunca chegaríamos”.
A primeira leva de CDs inclui pérolas como os clássicos Os choros de câmara e A floresta do Amazonas, de Heitor Villa-Lobos. Outros registros importantes são Renato Teixeira, Pena Branca & Xavantinho, registro ao vivo de clássicos da música caipira; Noites Cariocas ao vivo no Municipal, com participação de Altamiro Carrilho, Paulo Moura e Paulinho da Viola; Sempre Jacob tributo ao mestre Jacob do Bandolim; Rolando Boldrin e Renato Teixeira; Renato Teixeira Ao Vivo no Rio; e Noites cariocas - 15 anos depois. Da MPB recente, Vander Lee teve o álbum No balanço do balaio relançado. Cada lote terá um álbum novo. Neste está o bom Deixe com o destino, da estreante Luciana Pires.
O processo de remasterização, conduzido pelo especialista Carlos Savalla, levou em conta a preservação das características originais. “Ao mesmo tempo se adequou a uma sonoridade mais moderna, que permite audição em cinco canais. O timbre original das gravações foi mantido, mas parece que elas foram feitas ontem”.
Fitzgibbon pretende manter o perfil da gravadora, com foco na música brasileira, erudita, instrumental e de raiz. “Não se vende mais como há 10 anos. A única maneira viável de existir em 2011 é procurar o equilibrio entre valor artístico e comercial. Temos gravações superimportantes de Villa-Lobos mas sabemos que elas não têm o apelo comercial de Renato Teixeira, que tem os discos mais procurados”.
De olho nas novas dinâmicas do mercado musical, a Kuarup volta também como agenciadora, editora. E oferece empresariamento e licenciamento de marca. “O que mais motivou a retomada foi trazer de volta um catálogo que muito importante, mas isso só foi possível adaptando a gravadora às novas demandas”. O reemergente mercado de vinil está nos planos e alguns títulos em breve retornarão em suporte analógico.
(Diario de Pernambuco, 14/06/2011)
segunda-feira, 13 de junho de 2011
O homem que pensou as cidades
Nos anos 1920, um imigrante ucraniano chegou ao Brasil. Quando saiu de Odessa, Gregori Warchavchik era apenas mais um jovem a fugir das convulsões sociais do Leste Europeu. Ao chegar em São Paulo, encontrou uma cidade tomada pelo vigor das vanguardas culturais. Com os auspícios de Lúcio Costa e Mário de Andrade, se tornou um dos nomes mais importantes da arquitetura modernista brasileira.
A história de Warchavchik está contada no livro Warchavchik - fraturas da vanguarda (Cosac Naify, 552 páginas, R$ 95), que será lançado hoje, às 19h, na Livraria Cultura (Paço Alfândega - Recife Antigo). Além do texto, rico em detalhes biográficos e históricos, seu autor, o arquiteto e filósofo José Lira organizou 359 ilustrações e 25 projetos redesenhados especialmente para a edição.
A obra é o mais detalhado estudo a respeito do arquiteto, peça-chave para entender o pensamento que por décadas regeu o conceito das cidades. Dois de seus pupilos, Luiz Nunes e Burle Marx, ecoaram essas ideias no Recife, em obras como as praças da Madalena e Casa Forte, o Hospital do Derby, a Escola Alberto Torres (Tejipió), a sede do IAB (antigo Pavilhão de Óbitos) e a insuspeita caixa d’água do Alto da Sé, em Olinda. Sem falar de Garanhuns, que abriga um dos maiores e mais preservados casario modernista do país.
Professor da Faculdade de Arquitetura e Urbanismo da Universidade de São Paulo, Lira justifica a volta aos clássicos a partir de motivações bem contemporâneas. “Sou nascido no Recife e cada vez que eu retorno à cidade fico mais assustado com o congestionamento, problemas de saneamento, má conservação urbana, sujeira e, por outro lado, o surgimento de mais avenidas, carros e novos condomínios. Se os arquitetos não se posicionarem em novas propostas, em algum momento a cidade e o meio-ambiente vão se manifestar de maneira negativa. Não é problema não só do Recife, nem só dos arquitetos. Mas é algo que devemos nos preocupar”.
Entrevista>> José Lira: “Warchavchik se faz modernista no Brasil”
O que te levou à obra de Warchavchik?
Em 1997 desenvolvi uma tese sobre como o processo cultural no Recife ressoava em temas arquitetônicos a partir da relação entre modernistas e regionalistas, onde Gilberto Freyre surgiu com muita força. Logo depois comecei a estudar a biblioteca de Mário de Andrade, onde a relação entre arquitetura e cultura se tornou mais visível. O trabalho sobre Warchavchik começou efetivamente em 2005, quando desenvolvi o primeiro manuscrito da tese de livre docência.
Como foi feita a pesquisa?
Basicamente, ela foi feita junto ao acervo do próprio Warchavchik, cujos desenhos foram doados à FAU e as fotografias estão com sua família. Na Europa, o processo foi entrecortado pois não existe relação diplomática sólida entre a Ucrânia e o Brasil. Em Odessa tinha dois ou três contatos sólidos que me ajudaram a perceber o ambiente cultural em que ele se formou. Eles estavam fascinados com o fato de um odessita ter ficado famoso no Brasil. Também descobri que ele tinha estudado arquitetura numa escola de lá, informação que nem o próprio Warchavchik revelou em vida.
Warchavchik trouxe ao Brasil influências do modernismo europeu?
Minha tese é que ele se faz modernista no Brasil. Há mitos em torno de Warchavchik, que para o bem, apontam para ele como o estrangeiro superior, que traz o novo para o Brasil. E para mal, afirmam que ele não fez mais do que importar o modernismo. Meu trabalho mostra que a passagem da Europa para o Brasil é mais complexa. Não há quaisquer evidências de uma atuação de vanguarda em sua vida pregressa. Ele veio ao Brasil à procura de trabalho, e não porque tinha uma missão a cumprir. Aqui, no círculo dos modernistas brasileiros, ele entra em contato com as revistas europeias, ou seja, do Brasil ele descobre a Europa.
Naquela época, o que significou a chegada da arquitetura modernista para as cidades brasileiras?
Ainda que o significado cultural do modernismo tenha sido imenso, sua presença na arquitetura era muito reduzida. Havia ressonância na imprensa e alguns círculos intelectuais, mas o impacto urbanístico foi pequeno se comparado aos anos 1950, quando a arquitetura moderna brasileira estava consolidada.
O modernismo continua presente na arquitetura contemporânea?
Sim, estamos falando de uma geração que conseguiu dar novo sentido à cidade. Isso ressoa na contemporânea como um exemplo de ousadia, de sintonia com seu tempo, de inquietação com as rotinas. Do ponto de vista de produção, também há conceitos que subsistem, sobretudo num país como o Brasil, que de um lado produziu uma cultura arquitetônica moderna sólida, heterogênea, das mais emblemáticas do mundo. Apesar disso, ela não conseguiu resolver alguns problemas que se propôs, como a produção de habitações econômicas, o estabelecimento de padrões vitais para a moradia, de valores mínimos para a existência, questões atuais num país com déficit habitacional gigantesco.
O que podemos aprender com os arquitetos modernistas?
Warchavchik é filho de uma geração que percebeu a importância dos arquitetos saírem dos escritórios, e das questões corporativas para pensar na produção da cidade, do espaço, de oferecer respostas às necessidades básicas da sociedade. Hoje os arquitetos, engenheiros e as pesquisadores de mercado trabalham com critérios muito mesquinhos, que desrespeitam o patrimônio histórico e ambiental. No Recife, por exemplo, que tem solo extremamente poroso e irrigado, isso repercute em caos e pode, no futuro, culminar em destruição.
Um dos desafios da cidade moderna é a verticalização vertiginiosa, de apropriação parasitária, proveniente de investimento especulativo que não respeita princípios mínimos de racionalidade urbanística, ambiental, cultural, que destrói o solo urbano, recursos ambientais e leva a congestionamentos brutais. Claro hoje há outros poderes atuantes, mas naquele tempo já havia a incorporação imobiliária e os modernistas encontraram respostas muito criativas para a verticalização da cidade. A geração atual de arquitetos poderia olhar mais atentamente para arquitetos no Recife, como Delfim Amorim, Lúcio Estelita, Acassio Vorsoi, Maurício Castro, que produziram arquiteturas valiosas no centro da cidade. Quem no Recife teria a ousadia de pensar soluções de uso misto, como os edifícios comerciais e residenciais? Ou apartamentos de tamanhos muito diferentes no mesmo projeto? São soluções ousadas, que revelam uma visão de sociedade, espaço urbano e doméstico mais cosmopolita.
(Diario de Pernambuco, 13/06/2011)
Essa planta gera polêmicas
Desdobrada em marchas e demais formas de ativismo, a descriminalização da maconha tem sido pauta recorrente da socidade. Nos últimos meses, a imprensa vem repercutindo opiniões, como a do ex-presidente Fernando Henrique Cardoso, que no documentário Quebrando o tabu admitiu o conservadorismo de seu governo e hoje afirma ser contra o uso de violência para reprimir o consumo da planta. “A gente tem de sacudir a sociedade”, disse FHC.
O assunto desperta reações inflamadas. Nesta segunda-feira, um evento no Recife não deve ser menos polêmico. Primeiro às 14h, quando o antropólogo baiano Sérgio Vidal ministrará uma oficina de autocultivo de cannabis no hall do Centro de Artes e Comunicação da UFPE. Depois, às 20h, ele lança o livro Cannabis medicinal - introdução ao cultivo indoor (158 páginas, R$ 29,90), na Rua Mamede Simões, 144 - Boa Vista (próximo à Assembleia Legislativa).
Legalmente respaldado, o autor encontrou na defesa do uso medicinal uma brecha para poder discutir abertamente o cultivo da maconha, no que ele afirma ser o primeiro livro brasileiro sobre o assunto. “Ler não é crime. É como um livro sobre cirurgia, todo mundo pode ler, mas quem pode fazer é o cirurgião”, diz Vidal, que há oito anos se dedica a pesquisar o tema e prepara um outro para breve, com a história da cannabis.
“O Brasil tem um histórico de cultivo”, conta. “No fim do século 18, havia um empreendimento oficial da coroa portuguesa, a Real Feitoria do Linho Cânhamo. No Império, havia um decreto que proibia as pessoas de recusar ceder as terras para cultivar o cânhamo. Em menos de cem anos, mudou completamente a relação com a planta. Mas hoje o governo pode autorizar seu uso medicinal. Temos uma lei federal dando suporte para isso”.
Vidal avalia o momento como favorável para uma mudança de mentalidade. “O que o Fernando Henrique fala não é nenhuma novidade, mas ele tem um papel importante porque sua imagem atinge pessoas que normalmente não ouviria nenhum pesquisador. Não adianta a lei mudar se alguém vai chamar a polícia se ver um pé de maconha na varanda do vizinho. Em termos de lei o Brasil está avançado,no papel, mas na prática o usuário continua apanhando na rua”.
(Diario de Pernambuco, 13/06/2011)
domingo, 12 de junho de 2011
Cordel peleja com o tempo
Resistente às intempéries, a literatura de cordel segue a existir. Nascido na Península Ibérica, o livreto, facilmente reconhecido pelo formato de bolso, poucas páginas, xilogravura à frente e títulos incomuns, há muito não é editado em lugar algum do mundo, a não ser no Brasil, onde tem sido incorporado pelo cinema, música, artes plásticas, teatro. E chega ao século 21 preservando sua forma original de papel e tendo seu discurso apropriado pelos seus supostos algozes, as emissoras de rádio, TV e internet.
O tradicional folheto Historia de João de Calais. Impresso em Lisboa, no século 19, ganhou versão recente em Mossoró (RN), em 2007, com ilustração de Jô Oliveira. Eis a curiosa longevidade do cordel brasileiro. Se, até os anos 1950, cumpriu a função de jornal do matuto, hoje migrou para o asfalto da cidade e endereços da web com novos temas, contextos, formas e autores.
Editoras revelam que a venda de folhetos tem crescido nos últimos meses. “O mercado vai bem, estamos conquistando espaço e evidência”, diz Ana Ferraz, sócia de Ivan Maurício na Editora Coqueiro. Com sede no bairro de Campo Grande, no Recife, a editora comemora este ano duas décadas de atividade, mil títulos no catálogo e quase 4 milhões de cópias vendidas. Somente O peido que a nega deu, de José Costa Leite, soma 10 mil cópias vendidas.
Ana acredita que a novela Cordel encantado contribuiu para aumentar o interesse pelo produto. “A quantidade de encomendas subiu radicamente”. No último Cine PE, a Petrobras contratou a Coqueiro para rodar 50 mil cópias com adaptações de filmes brasileiros famosos. Ana diz que a maioria dos clientes é de outros estados e que 97% dos pedidos são feitos via internet. Convites de casamento e festas de aniversário no formato dos livrinhos também têm boa saída.
“O cordel vive um momento melhor. Virou objeto de pesquisa. E temos uma boa safra de bons cordelistas, escolarizados”, diz Marcelo Soares, que desde 1997 mantém a Folhetaria Cordel, em Timbaúba, interior pernambucano. Seu best seller é Fim de semana em casa de pobre, escrito por José Soares (pai de Marcelo) em 1974, com 20 mil exemplares vendidos. “A informática facilitou muito as publicações, agora o próprio poeta pode fabricar e a rede mundial ampliou o acesso”.
Ana enxerga mudança também no perfil do público. Novos tempos, novos leitores. “Antigamente era a classe média baixa. Hoje fica difícil definir, mas posso garantir que passa por um público mais elitizado, estudantes, professores, pesquisadores. No interior talvez seja diferente, ainda se encontram cordelistas cantando como Costa Leite, que continua nas feiras aos 83 anos”.
Uma arte em extinção? - Com o advento da imprensa, que adaptou a tradição da poesia oral, o folheto de cordel começou a circular na França, Espanha e Portugal para depois, com a colonização, chegar ao Brasil e outros países da América Latina. Segundo o pesquisador Arnaldo Saraiva, da Universidade do Porto, o registro mais antigo desta modalidade de literatura remonta às folhas volantes do século 16.
Em sua passagem pelo Recife, onde já expôs sua coleção de cordéis portugueses, Saraiva foi convidado para participar do 1º Congresso de Cordel, promovido há 15 dias pela Faculdade de Ciências Aplicadas e Sociais de Petrolina. Considerado um dos maiores especialistas no assunto, ele desenhou um amplo panorama histórico do cordel no mundo, mas não foi otimista quanto a seu futuro no Brasil.
“Ele morreu em todas as partes do mundo”, disse, durante palestra. E afirma que, como o suporte papel define o conteúdo, o folheto virtual é outra coisa. “A internet será um golpe mortal. Se por um lado ela é um canal de divulgação, por outro banaliza e descaracteriza o cordel. E os poetas hoje são universitários que imitam essa linguagem”.
Pesquisadores brasileiros discordam. Hélder Pinheiro, da Universidade Federal de Campina Grande, não vê problema no novo contexto de produção e distribução. “O cordel não morreu no Brasil porque ainda tem ressonância social. Indiferente ao meio em que ele se manifesta, o importante é que a poesia permanece”.
Na contramão do digital, um grupo de cearenses fundou a Academia de Cordelistas do Crato, que há 20 anos produz folhetos em prensa de tipos móveis e xilogravuras talhadas em pedaços de umburana, tal qual se fazia antigamente. O método tradicional é atrelado à organização interna que, aos moldes das academias de literatura erudita, estipulou regras estéticas e comportamentais.
Autora do livro No visgo do improviso ou a peleja virtual entre cibercultura e tradição, Maria Alice Amorim diz que uma realidade não exclui a outra e que hoje se observa uma arte de formas clássicas que se movimenta para um fenômeno em processo. “Não posso dizer que o cordel acabou porque mudou a relação com o campo. Traduzido para outros códigos artísticos, ele interage com outras culturas, ganha complexidade e isso faz com que o discurso permaneça”. O assunto rende. Na próxima quarta, às 19h, Maria Alice e um grupo de cordelistas conversam sobre o tema na Livraria Cultura (Paço Alfândega).
O editor Marcelo Soares, da Folhetaria Cordel, diz que antes de publicar um autor é preciso avaliar alguns critérios. “O poeta precisa ter um trabalho consistente, mostrar preocupação com a qualidade do verso, ser melódico e ter métrica, oração e rima”. Ou seja, no papel ou na web, só os bons sobrevivem.
Cordel na internet
Ciberteca de Cordel
www.cibertecadecordel.com.br
Corda Virtual
www.interpoetica.com/site/index.php?/corda-virtual
Academia Brasileira de Literatura de Cordel
www.ablc.com.br/index.htm
Editora Coqueiro
www.onordeste.com/blogs/index.php?id_user=18
Folhetaria de Cordel
www.marcelosoares.org
Marco Cibernético
www.josehonorio.com.br
sábado, 11 de junho de 2011
Espelho da civilização
Em 1810, uma jovem negra de formas generosas e incomuns fascinou e chocou a sociedade europeia. Empregada de uma família holandesa na África do Sul, ela foi trazida a Londres sob promessas de riqueza, mas acabou como atração de circo, onde era apresentada como animal raro. Na França, se tornou objeto de entretenimento sexual da nobreza e chamou a atenção dos cientistas, que encontraram nela semelhanças com os símios. Morta em indigência, foi vendida para um museu que, até 1985, expôs seu esqueleto, cérebro e órgãos genitais em formol, além de servir de forma para estátua usada para aulas de medicina.
Eis a história da Venus Hotentote, trazida para o cinema pelo diretor tunisiano, radicado na França, Abdellatif Kechiche. Vênus negra (Venuus noire, França, 2010) será exibido amanhã no Festival Varilux (Cinema da Fundação) e é preciso certo estômago para assistir às 2h40 de projeção. As cenas de racismo explícito são grotescas. E o sofrimento de Saartjie “Sarah'” Baartman não tem fim.
A tortura se estende na relação espectador-filme. As sequências de circo e apresentações em palácios parisienses são mostradas em tempo real, nos obrigando a assistir a humilhação da pobre mulher. Imagem emblemática, uma senhora europeia monta na Vênus como um cavalo, ambas com seios à mostra. Em catarse coletiva, suas nádegas e vagina são oferecidas para quem quiser tocar.
São cenas chocantes, inimagináveis nos dias atuais. Mas das entrelinhas surge um incômodo, talvez porque o racismo continua em outras formas, não tão explícito nem disfarçado por discursos politicamente corretos. Em diferentes níveis, a cultura negra continua em alta na Europa, sempre ávida por produtos exóticos.
Vale ressaltar o belíssimo trabalho de fotografia, que confere dignidade ao corpo negro da atriz cubana Yahima Torres. É um nítido contraponto à forma com que a carne branca é mostrada: flácida, azeda, corrompida. Gente disposta a aplaudir qualquer bizarrice feita a quem atribuem inferioridade. E de se espantar quando estes demonstram ser tão ou mais humanos. É o monstruoso como espelho da civilização.
(Diario de Pernambuco, 11/06/2011)
quinta-feira, 9 de junho de 2011
Coluna de lançamentos da semana + notas de bastidores
Trabalho interno (Inside job, EUA, 2010). De Charles Ferguson. 109 minutos. Sony.
Oscar de melhor documentário, temos aqui um minuncioso levantamento dos motivos da crise econômica mundial de 2008. A investigação remonta aos anos 1980, e aponta para as relações viciadas entre instituições financeiras, acadêmicos, políticos e a grande mídia. Desprovido da sanha manipulatória de Michael Moore (Tiros em Columbine), Ferguson coloca na parede figurões que normalmente aparecem sorridentes nas páginas do jornalismo econômico. Bom ver gente assim suar frio.
Tetro (EUA/Itália/Espanha/Argentina, 2009). De Francis Ford Coppola. 127 minutos. Imovision.
Obra pessoal e universal sobre família, foco nas obsessões de poder entre pais e filhos. Filme jovem, experimental, de bela fotografia preto-e-branco e colorida, que reflete seu momento criativo, de produção independente. Trata de família ítalo-americana com poderoso patriarca, tema que alçou Coppola à fama com a saga dos Corleone e diz respeito à sua própria história. Tetro (Vincent Gallo) tem seu exílio em Buenos Aires interrompido quando o Benny (Alden Ehrenreich) aparece de repente, para cobrar satisfação.
Zé Colmeia (Yogi Bear, EUA, 2010). De Eric Brevig. 80 minutos. Warner.
Do design analógico para o digital, o longa preservou a dinâmica do personagem sedentário, cuca fresca e guloso. Mesmo sem chamar o vigia florestal (Tom Cavanagh) de “seu gualda”, o mesmo vale para o fiel escudeiro Catatau. Ursos de animação, eles roubam cestas de piquenique no mundo real - e um dos pontos fortes do filme está nessa interação. Eles precisam impedir prefeito ganancioso de lotear o Parque Jellystone. E nele não se deve mexer. Faz parte da nossa memória afetiva.
Bastidores
Rock Brasília - Pródiga nos anos 1980, a cena rock de Brasília está retornando no cinema. Mês que vem, Vladimir Carvalho (foto) apresenta o doc Rock Brasília, com entrevista inédita que fez com Renato Russo e depoimentos atuais de integrantes de quatro bandas: Legião Urbana, Plebe Rude, Capital Inicial e Paralamas do Sucesso. Não bastasse, semana passada começaram as filmagens de Somos tão jovens, sobre a formação da Legião. A direção é de Antonio Carlos da Fontoura.
Música - O Curta Doze e Meia continua programação de filmes sobre música. Hoje são cinco: Se liga na parada... Ou um abraço (PE), de Michelle de Assumpção; A estória de Clara Crocodilo (SP), de Cristina Santeiro, sobre Arrigo Barnabé; Do Morro? (PE), de Mykaela Plotkin e Rafael Montenegro, sobre o cantor João do Morro; Última fábrica (RJ), de Felipe Nepomuceno, sobre a Polysom, última fábrica de discos de vinil da América Latina; e O mundo é uma cabeça (PE), de Bidu Queiroz e Cláudio Barroso , sobre o manguebeat. No auditório do Centro Cultural Correios (Recife Antigo). Entrada franca.
Casa Amarela - O Cineclube Coliseu (Sesc Casa Amarela) exibe hoje, às 19h, o drama brasileiro O baiano fantasma (Brasil, 1984), de Denoy de Oliveira. No filme, José Dumont é um migrante nordestino que vai a São Paulo para melhorar de vida, mas acaba em quadrilha que vende proteção pessoal às pessoas. Classificação: 14 anos. Entrada franca.
Caruaru - Diretor Neco Tabosa faz seleção de atores para João Heleno, seu próximo curta, a ser rodado em Caruaru. Atores parecidos com Paul McCartney, John Lennon, Yoko Ono devem mandar fotos e videos para elencofilmejoaoheleno@gmail.com.
(Diario de Pernambuco, 09/06/20110
sexta-feira, 3 de junho de 2011
Febre do Rato ataca em Paulínia
Cláudio Assis esteve em Paulínia para o lançamento o festival, que selecionou seu novo filme
Foto: Aline Arruda / AgênciaFoto
Paulínia (SP) – Lançado na manhã de ontem, o Festival Paulínia de Cinema 2011 começa no próximo dia 7 de julho com uma seleção, no mínimo, interessante. Uma das fitas em competição diz respeito aos pernambucanos, mais diretamente, ao Recife: Febre do rato, de Claudio Assis.
Este, que será o primeiro longa em preto-e-branco do cineasta, completa trilogia criativa realizada com o fotógrafo Walter Carvalho (eles já haviam trabalhado imagens monocromáticas no curta Texas Hotel). Aliás, seu irmão, Vladimir, concorre com o documentário Rock Brasília – era de ouro, sobre o período em que Brasília pulsava com mais de 200 bandas. Também competem os longas de ficção Meu país, de André Ristum (SP), O palhaço, de Selton Mello (RJ), Onde está a felicidade?, de Carlos Alberto Riccelli (SP), Os 3, de Nando Olival (SP) e Trabalhar Cansa, de Juliana Rojas e Marco Dutra (SP). Todos inéditos, com a ressalva de que o último acaba de ser exibido na mostra Un certain regard do Festival de Cannes. O filme de abertura será Corações sujos, adaptação de Vicente Amorim para livro de Fernando Moraes.
A boa programação pode aumentar ainda mais a importância do festival, que com apenas quatro anos, já figura entre os maiores do país. E para isso não basta dinheiro do rico ICMS de Paulínia, mas vontade e competência. Este ano, há algumas mudanças no formato do evento, que agregou o Paulínia Fest, três dias de shows após os filmes, em frente ao suntuoso Theatro Municipal. Na programação, Rita Lee, Caetano Veloso, Gilberto Gil, Seu Jorge e Vanessa da Mata. O número de curtas dobrou – agora são doze, mais três curtas locais, exibidos conjuntamente com um longa documentário e um de ficção, diariamente. A curadoria é coletiva, feita por funcionários da prefeitura.
Durante a exibição de trechos dos filmes, o recorte dado a Febre do rato chamou atenção por ser o único com imagem monocromática e pelo tom, melancólico e sem diálogos. “Fiz de propósito, mas o filme tem uma surpresa e é bem vivo. Como Amarelo manga, ele capta a pulsação do Recife”, disse Cláudio Assis, que antes de lançar o filme comercialmente (pela Imovision), pretende inscrever o filme no Festival de Brasília e aguarda resultado do edital de distribuição do Polo Cinematográfico de Paulínia.
Todos os diretores e produtores estavam na coletiva, conduzida pelo secretário de cultura de Paulínia, Emerson Alves. A euforia estava estampada em suas feições – além da visibilidade para seus filmes, o melhor ganha prêmio de R$ 250 mil. Fica claro que um festival de cinema de primeira linha está integrado a uma política maior de investimento na cultura, o que inclui a formação de uma competente orquestra jovem. “o cinema atrai a maioria das atenções, mas estamos desenvolvendo várias atividades para a formação de um pólo cultural em Paulínia, disse o secretário. Após a coletiva, ele informou ao Diario que 2,5% do orçamento municipal é direcionado para a cultura, o que equivale a R$ 35 milhões. Um bom exemplo para a nossa Ipojuca, onde também há uma refinaria de petróleo como fonte de impostos.
A declaração mais ilustrativa talvez seja a de Sérgio Ajzemberg, um dos organizadores do festival de música. “Paulínia não é feita só de fábricas e da refinaria. Ela precisa de alma, os cidadãos precisam se ver em diferentes manifestações”.
Lista completa dos selecionados (com valores da premiação):
Longas de Ficção
1. Febre do Rato, de Cláudio Assis (PE)
2. Meu País, de André Ristum (SP)
3. O Palhaço, de Selton Mello (RJ)
4. Onde Esta a Felicidade ? , de Carlos Alberto Riccelli (SP)
5. Os 3, de Nando Olival (SP)
6. Trabalhar Cansa, de Juliana Rojas e Marco Dutra (SP)
Documentários
1. A Cidade de Imã, de Ronaldo German (RJ)
2. A Margem do Xingu, de Damià Puig Auge (SP)
3. Ela Sonhou que Eu Morri, de Matias Bracher Mariani (SP)
4. Ibitipoca, Droba Pra Lá, de Felipe de Barros Scaldini (MG)
5. Rock Brasília – era de ouro, de Vladimir Carvalho (DF)
6. Uma Longa Viagem, de Lúcia Murat (RJ)
Curtas Nacionais
1. A Grande Viagem, de Caroline Fioratti (SP)
2. Acabou-se, de Patricia Baia (CE)
3. Café Turco, de Thiago Luciano (SP)
4. O Cão, de Abel Roland (RS)
5. O Cavalo, de Joana Guttman Mariani (SP)
6. O Pai Daquele Menino, de Lemos Arthuso (SP)
7. Off Making, de Beto Schultz (SP)
8. Polaroid Circus, de Marcos Mello e Jacques Dequeker (RS)
9. Qual Queijo Você Quer?, de Cíntia Domit Bittar (SC)
10. Tela, de Carlos Nader (SP)
11. Trocam-se Bolinhos por Histórias de Vida, de Denise Machi (RS)
12. Uma Primavera, de Gabriela Amaral Almeida (SP)
Curtas Regionais
1. Argentino, de Diego Costa
2. 3x4, de Cauê Nunes
3. Adeus, de Alessandro Barros
PRÊMIOS
O Festival distribuirá, por meio de sua premiação oficial, um total de R$ 800 mil aos vencedores das diversas categorias, como segue:
Filmes de longa-metragem
Melhor Filme ficção: R$ 250 mil
Melhor Documentário: R$ 100 mil
Melhor Diretor ficção: R$ 35 mil
Melhor Diretor Documentário: R$ 35 mil
Melhor Ator: R$ 30 mil
Melhor Atriz: R$ 30 mil
Melhor Ator coadjuvante: R$ 15 mil
Melhor Atriz coadjuvante: R$ 15 mil
Melhor Roteiro: R$ 15 mil
Melhor Fotografia: R$ 15 mil
Melhor Montagem: R$ 15 mil
Melhor Som: R$ 15 mil
Melhor Direção de arte: R$ 15 mil
Melhor Trilha Sonora: R$ 15 mil
Melhor Figurino: R$ 15 mil
Especial Júri: R$ 35 mil
Filmes de curta-metragem - Nacional
Melhor filme: R$ 25 mil
Melhor Direção: R$ 15 mil
Melhor Roteiro: R$ 10 mil
Filme de curta-metragem - Regional
Melhor filme: R$ 25 mil
Melhor Direção: R$ 15 mil
Melhor Roteiro: R$ 10 mil
Prêmios do Júri Popular
Melhor longa ficção: R$ 25 mil
Melhor documentário: R$ 15 mil
Melhor curta metragem nacional: R$ 5 mil
Melhor curta-metragem regional: R$ 5 mil
(Diario de Pernambuco, 03/06/2011)
Amarga poesia da grande cidade
Estamos juntos (Brasil, 2011) traz um apanhado de situações inusitadas, vividas por Carmem (Leandra Leal), médica recém-formada, que chega do interior para fazer residência em hospital público da capital paulista. Após conquistar sete prêmios principais no último Cine PE, o longa de Toni Venturi chega hoje nos cinemas, onde ocupa raro espaço reservado a filmes “médios”, ou seja, capazes de vender mais de 100 mil ingressos, mas sem o apelo de um blockbuster.
Em ambientes fechados e predominantemente escuros, o filme faz uma investigação sobre o comportamento humano na cidade grande, ou melhor, como uma grande cidade pode condicionar essas relações.
À trama: Carmem mora com um homem que age como amante e consultor sentimental (não há indicações seguras sobre seu papel em sua vida), vivido por Lee Thayor. Ele acompanha de perto a aproximação de Juan (Nazareno Casero), saxofonista argentino que divide apartamento e projeto musical com o amigo em comum, Murilo (Cauã Reymond), gay assumido, classe média alta, que almeja carreira de DJ e o coração de Juan. A convite da enfermeira-chefe (Debora Duboc), Carmem se torna médica voluntária para prevenção de DST numa ocupação de sem-tetos. As coisas vão de mal a pior quando ela descobre estar com doença grave.
Para construir sua narrativa, Venturi convocou uma equipe poderosa: Lula Carvalho (fotografia), Hilton Lacerda (roteiro), Renata Pinheiro (arte). O resultado é um filme competente, bonito de ver, que explora as fragilidades e o lado obscuro da gana em viver.
(Diario de Pernambuco, 03/06/2011)
Muito além das feiras
Petrolina (PE) – A literatura de cordel vive. Não tanto nas feiras populares, onde por décadas foi vendida e cantada como principal fonte de entretenimento e informação, mas em lugares insólitos, como a internet e a novela das seis. A universidade, reduto da erudição, também se curvou aos folhetos. Desde os anos 1970, a academia tem abrigado pesquisadores interessados em compreender seu valor artístico, cultural e sociológico. Parte importante deles foi reunida ao longo da semana passada pelo 1º Congresso Regional Sobre o Cordel (ConCordel). As atividades, que incluiram palestras, apresentações e minicursos, terminaram ontem com palestra de Arnaldo Saraiva, professor da Universidade do Porto (Portugal), sumidade no assunto.
Promovido pela Faculdade de Ciências Aplicadas e Sociais de Petrolina e apoiado por uma dezena de instituições, o evento foi idealizado pelo professor Genivaldo Nascimento, que mantém um grupo de estudos de cordel e há tempos sonhava em reunir intelectuais e artistas. A abertura com J. Borges, na última segunda-feira, foi um dos pontos altos. O mestre da xilogravura fez palestra sobre a importância do cordel na sua vida, tendo inclusive declamado A chegada da prostituta no céu, da forma como fazia para vender seus cordeis nas feiras de Bezerros. O cantador Chico Pedrosa e cordelistas do Crato (CE) completaram a frente de criadores.
Além de Genivaldo, que tratou da mudança de mídias, a professora Elisabet Gonçalves Moreira apresentou uma comparação do cordel com o “corrido” mexicano; a pesquisadora Maria Alice Amorim falou sobre o cordel “desmaterializado” pela internet; pós-doutor em literatura, Hélder Pinheiro problematizou o cordel como instrumento de ensino. Ele entende o desprezo de parte da academia pelo assunto não como preconceito, mas como desinformação. “Há uma tradição letrista onde o popular é visto como algo sem valor estético. Mas as duas são patrimônios imateriais e podem ser encontradas juntas, nas obras de Guimarães Rosa e Ariano Suassuna”.
Com vasta experiência no assunto, Maria Alice Amorim (ela fará curadoria para a próxima Fenearte, que terá como tema o universo do cordel) e Arnaldo Saraiva dizem não se lembrar de um evento acadêmico exclusivamente voltado para o tema. “No que me consta, em Pernambuco, não há outro grupo de estudos sobre cordel ligado a uma faculdade de ensino superior”, constata Maria Alice.
Saraiva, que tem respeitada coleção de cordeis que remonta há quatro séculos, disse que este universo ainda é desconhecido. “Quando visitei o Brasil pela primeira vez, apenas pesquisadores estrangeiros se interessavam pelo cordel. Somente nos anos 1970, alguns universitários brasileiros quiseram estudá-lo”.
(Diario de Pernambuco, 28/05/2011)
Coluna de lançamentos, bastidores e "eu indico" da semana
O mágico (L’Illusioniste, França, 2010). De Sylvain Chomet. 99min. PlayArte.
O estilo característico do diretor de Bicicletas de Belleville a serviço de roteiro inédito de Jacques Tati, que antes de morrer o enviou à filha que nunca conheceu. Daí o tom melancólico na história do ilusionista que perde espaço nos teatros de Paris, pega a estrada e ganha a admiração de uma jovem escocesa. Não por acaso, o velho mágico se parece com Mr. Hurlot, notório alterego de Tati. Em tempos de animação digital, o tema casa belamente com o traço feito à mão de Chomet e é uma reflexão que se estende para o próprio cinema.
Inverno da alma (Winter’s bone, EUA, 2010). De Debra Granik. 100 minutos. Califórnia.
Após o sumiço do pai, garota de 17 anos (Jennifer Lawrence) precisa cuidar irmãos mais novos e da mãe com problemas mentais. Para piorar a situação, se o pai não aparecer em uma semana, a família perde a casa. A seca paisagem rural, habitada por pessoas violentas e miseráveis, torna o contexto desolador. O filme surge desse contraste, entre o drama particular da protagonista e a dura realidade ao seu redor.
Eu indico
“Recomendo Rockers (EUA, 1978), de Ted Bafaloukos. A atuação fica por conta dos mestres do reggae roots jamaicano. Os músicos e produtores não são atores, mas é aí que está a graça. Além de ser um registro único de grandes talentos, é um recado direto as grandes gravadoras e o mercado fonográfico de como ideias simples e geniais, compostas, produzidas, fabricadas e distribuídas por quem as faz, podem chegar ao grande público praticamente sem intermediários. É o lema do punk levado pro mundo esfumaçado da ilha caribenha mais famosa de todo o planeta: faça você mesmo!”
Bruno Pedrosa, DJ
Bastidores
Cannes - Os principais filmes exibidos no Festival de Cannes estreiam nos próximos meses no Brasil. Anote as datas: 7 de junho, Meia-noite em Paris, de Woody Allen; 24 de junho, A árvore da vida, de Terrence Malick; 5 de agosto, Melancolia, de Lars Von Trier; 4 de novembro, O garoto de bicicleta, de Luc e Jean-Pierre Dardenne; e 25 de novembro, de La piel que habito, de Pedro Almodóvar.
São Paulo - O curta Praça Walt Disney, de Renata Pinheiro e Sérgio Oliveira, foi eleito o melhor da 4ª Mostra Marília de Cinema, no interior de São Paulo. Recife frio, de Kleber Mendonça Filho, ganhou na categoria melhor direção, fotografia e projeto gráfico.
Homenagem - A obra dos cineastas Marcelo Gomes e Karim Ainouz ganha mostra na Casa de América, em Madri. Até sábado, serão exibidos quatro longas-metragens dos diretores.
Curso - Inscrições abertas para o workshop Documentário Criativo, promovido pelo curso de Cinema de Animação das Faculdades Integradas Barros Melo (AESO). O ministrante é o roteirista, diretor e especialista em análise de scripts Gualberto Ferrari. O curso será em julho e custa R$ 250.
Ouro Preto - A 6ª Mostra de Cinema de Ouro Preto anunciou ontem sua programação. De Pernambuco, participam Acercadacana, de Felipe Calheiros; Aeroporto, de Marcelo Pedroso; Janela molhada, de Marcos Enrique Lopes; Praça Walt Disney, de Renata Pinheiro e Sérgio Oliveira; e Mens sana in corpore sano, de Juliano Dornelles. O tema deste ano é a Chanchada e o cineasta Carlos Manga será homenageado. O CineOP será entre 15 e 20 de junho.
Pernambucanos premiados - Como era de se esperar, Tropa de Elite 2 foi eleito nas principais categorias do Grande Prêmio do Cinema Brasileiro. Mas a cerimônia realizada anteontem, no Rio de Janeiro, também foi dos pernambucanos: O homem que engarrafava nuvens, de Lírio Ferreira, venceu na categoria documentário e Recife frio (foto), de Kleber Mendonça Filho, foi premiado como o melhor curta-metragem de 2010. Palmas para eles.
Vurto - Marcelo Pedroso (Símio Filmes) e Felipe Peres Calheiros (Asterisco) acabam de lançar o site Vurto, para divulgar vídeos curtos, feitos para a internet. O primeiro trabalho se chama Engravatados, assinado por Pedroso e Milena Times, uma visão crítica ao chamado auxílio-paletó recebido por deputados estaduais. O endereço: www.vurto.com.br.
DocTV - Abertas as inscrições para o DocTV América Latina III, que vai selecionar um projeto de documentário de cada um dos 14 países envolvidos no projeto. Regulamento no site da Secretaria do Audiovisual do Ministério da Cultura. Até 14 de julho.
(Diario de Pernambuco, 26/05 e 01/06/2011)
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