sexta-feira, 3 de junho de 2011
Muito além das feiras
Petrolina (PE) – A literatura de cordel vive. Não tanto nas feiras populares, onde por décadas foi vendida e cantada como principal fonte de entretenimento e informação, mas em lugares insólitos, como a internet e a novela das seis. A universidade, reduto da erudição, também se curvou aos folhetos. Desde os anos 1970, a academia tem abrigado pesquisadores interessados em compreender seu valor artístico, cultural e sociológico. Parte importante deles foi reunida ao longo da semana passada pelo 1º Congresso Regional Sobre o Cordel (ConCordel). As atividades, que incluiram palestras, apresentações e minicursos, terminaram ontem com palestra de Arnaldo Saraiva, professor da Universidade do Porto (Portugal), sumidade no assunto.
Promovido pela Faculdade de Ciências Aplicadas e Sociais de Petrolina e apoiado por uma dezena de instituições, o evento foi idealizado pelo professor Genivaldo Nascimento, que mantém um grupo de estudos de cordel e há tempos sonhava em reunir intelectuais e artistas. A abertura com J. Borges, na última segunda-feira, foi um dos pontos altos. O mestre da xilogravura fez palestra sobre a importância do cordel na sua vida, tendo inclusive declamado A chegada da prostituta no céu, da forma como fazia para vender seus cordeis nas feiras de Bezerros. O cantador Chico Pedrosa e cordelistas do Crato (CE) completaram a frente de criadores.
Além de Genivaldo, que tratou da mudança de mídias, a professora Elisabet Gonçalves Moreira apresentou uma comparação do cordel com o “corrido” mexicano; a pesquisadora Maria Alice Amorim falou sobre o cordel “desmaterializado” pela internet; pós-doutor em literatura, Hélder Pinheiro problematizou o cordel como instrumento de ensino. Ele entende o desprezo de parte da academia pelo assunto não como preconceito, mas como desinformação. “Há uma tradição letrista onde o popular é visto como algo sem valor estético. Mas as duas são patrimônios imateriais e podem ser encontradas juntas, nas obras de Guimarães Rosa e Ariano Suassuna”.
Com vasta experiência no assunto, Maria Alice Amorim (ela fará curadoria para a próxima Fenearte, que terá como tema o universo do cordel) e Arnaldo Saraiva dizem não se lembrar de um evento acadêmico exclusivamente voltado para o tema. “No que me consta, em Pernambuco, não há outro grupo de estudos sobre cordel ligado a uma faculdade de ensino superior”, constata Maria Alice.
Saraiva, que tem respeitada coleção de cordeis que remonta há quatro séculos, disse que este universo ainda é desconhecido. “Quando visitei o Brasil pela primeira vez, apenas pesquisadores estrangeiros se interessavam pelo cordel. Somente nos anos 1970, alguns universitários brasileiros quiseram estudá-lo”.
(Diario de Pernambuco, 28/05/2011)
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