quarta-feira, 28 de dezembro de 2011
2011-2012: cinema em franca ebulição
O ano de 2011 foi intenso para o cinema, que sem dúvida refletiu o processo de transição mundial. Dado o panorama de eventos políticos, sociais e econômicos, não deixa de ser sintomática a recorrência de superproduções escapistas como Harry Potter, Amanhecer e Transformers, que ocuparam os cinemas do mundo com a mesma sanha imperialista de uma incursão no Oriente Médio.
A estratégia deve crescer em 2012, principalmente com as franquias O espetacular Homem-Aranha, Batman - O Cavaleiro das Trevas ressurge, A era do gelo 4, Madagascar 3, O legado Bourne, G.I. Joe 2, Homens de Preto 3, Os Vingadores e Motoqueiro Fantasma 2. Grandes diretores apresentarão novas obras, a começar por Steven Spielberg (Cavalo de guerra), Guy Ritchie (Sherlock Holmes 2), Peter Jackson (O Hobbit) , Clint Eastwood (J. Edgar, com Leonardo DiCaprio), David Fincher (Homens que não amavam as mulheres, com Daniel Craig), Ridley Scott (Prometheus), Ang Lee (The life of pee) e David Cronenberg (Um método perigoso).
Em 2012, o 3D ganhará o reforço dos mestres Spielberg e Peter Jackson, que assinam As aventuras de Tintim, com estreia de janeiro; em fevereiro, é a vez de Martin Scorsese com A invenção de Hugo Cabret; em março, Wim Wenders faz tributo à coreógrafa Pina Bausch. Star Wars, Titanic, Procurando Nemo e A Bela e a Fera serão relançados, devidamente adaptados à técnica.
Eventos como a primaveira árabe, a crise financeira europeia e o drama político-social na Rússia pouco afetaram as produções norte-americanas. A grande exceção é Margin Call - O dia antes do fim, drama corporativo com Kevin Spacey e Jeremy Irons sobre o crash de 2008 (ainda inédito no Recife). No mais, a preferência foi por conflitos do passado, como a guerra fria (Missão Impossível 4) e a Segunda Guerra (Capitão América e X-Men - Primeira classe). Já os alienígenas nos deixariam em paz não fossem o nostálgico Super 8 e o horroroso Lanterna verde. E por falar em heróis, além dos X-Men, os melhores momentos vieram de personagens não-originários dos quadrinhos: Besouro Verde de Michel Gondry e Sucker Punch, de Zack Snyder.
2011 também foi o ano de Woody Allen, que Meia-noite em Paris, filme mediano e adorável, bateu seu recorde de bilheteria no Brasil. Ao contrário das produções hollywoodianas, o escapismo dourado de seu alter-ego (Owen Wilson) faz todo o sentido, pois leva à libertação. Terrence Malick é outro grande destaque do ano. Com A árvore da vida, ganhou a Palma de Ouro em Cannes, tirada das mãos de Lars Von Trier, que não conseguiu fazer graça com o nazismo e foi expulso do festival. Mesmo sem o prêmio máximo do cinema mundial, Melancolia se impõe como melhor filme do ano. Não somente pelos atributos estéticos (principalmente a fotografia e a atuação de Kirsten Dunst), mas pela pertinência filosófica que melhor traduz o espírito de nossa época.
Sim, coube ao cinema europeu e asiático escancarar as contradições do presente. De Isto não é um filme, manifesto do iraniano Jafar Panahi enclausurado pelo governo de seu país, a A pele que habito, prospecção psicológica de Pedro Almodóvar sobre o fetiche da cirurgia plástica. De Cópia fiel, em que Kiarostami expõe as fragilidades do jogo afetivo-social, preso a papéis pré-definidos, ao russo Um sábado inocente, em que funcionários de Chernobyl não conseguem fugir do desastre enquanto se embriagam numa festa de casamento. Após o desastre de Fukushima, o filme ganhou estranha atualidade. Como diria Buñuel: a realidade é bem maior que os olhos podem enxergar.
Cinema nacional se multiplica
Dos dez maiores mercados do país, o Recife é o que mais prestigia o cinema nacional. De acordo com o portal de análise do mecado FilmeB, 19,5% do público da capital pernambucana assistiram a filmes brasileiros em 2011. Prova de que a vitalidade da produção nacional não está somente no potencial criativo dos filmes independentes, que neste ano tiveram mais espaço no latifúndio exibidor graças ao projeto Vitrine. Está também na capacidade de atrair muita gente para as salas de cinema.
No cinema comercial, comédias e melodramas predominam. Com um público de 3,5 milhões, De pernas pro ar, de Roberto Santucci, é a maior bilheteria do ano. Cilada.com, Qualquer gato vira-lata, O homem do futuro, Bruna Surfistinha e Assalto ao Banco Central também ultrapassaram a marca de um milhão de espectadores. A tendência deve se repetir em 2012, em filmes como As aventuras de Agamenon, o repórter, com Marcelo Adnet e Luana Piovani; E aí, comeu?, com Bruno Mazzeo; Tainá 3 – A origem; e À beira do caminho, de Breno Silveira.
Se, por um lado, Tropa de Elite 2 e seus 11 milhões de espectadores se confirmaram como caso isolado, a boa nova é que, entre tantos filmes com os dois pés no entretenimento televisivo (e por isso tachados de “globochanchadas”), fomos surpreendidos pela sensível viagem cinematográfica de O Palhaço, escrito, dirigido e estrelado por Selton Mello, que ano que vem estrela as comédias Reis e ratos e Billi Pig.
Dois grandes nomes do Brasil apresentam novos trabalhos no mercado internacional: Fernando Meirelles, com 360, e Walter Salles, com On the road. De pernambuco, Era uma vez Verônica, de Marcelo Gomes e Febre do rato, de Cláudio Assis, são duas prováveis produções a ter carreira internacional, assim como Praia do Futuro, de Karim Aïnouz. Também vêm aí, A hora e a vez de Augusto Matraga, com Fernanda Montenegro, João Miguel e José Wilker (em 2012, Wilker estreia como diretor em Giovanni Improtta); Xingú, de Cao Hamburger; Corações sujos, de Vicente Amorim; e Paraísos artificiais, de Marcos Prado, com produção de José Padilha.
Nos 15 anos de morte de Renato Russo, os fãs da Legião Urbana não podem reclamar. Neste ano, ganharam o documentário do mestre Vladimir Carvalho Rock Brasília – Era de ouro. E, ano que vem, estreiam Faroeste Caboclo e Somos tão jovens, a cinebiografia de Russo. Os dez anos de morte de Cássia Eller também serão lembrados em documentário de Paulo Henrique Fontenelle (Loki). E Raul Seixas ganha o filme O início, o fim e o meio, de Walter Carvalho.
Em Pernambuco, o cenário não poderia estar melhor. Com o novo edital do audiovisual (R$ 11,5 milhões), a produção deve se fortalecer. Começamos 2012 com três longas em 35mm na agulha: Verônica, Febre do rato e O som ao redor, de Kleber Mendonça. E 2011 certamente ficará na memória dos cinéfilos que, nos 40 anos de Laranja Mecânica puderam assistir a todos os filmes de Stanley Kubrick no São Luiz, um luxo só equiparado à mostra promovida em Paris, pela cinemateca francesa.
Maiores bilheterias (Brasil)
1. Rio
2. Amanhecer - parte 1
3. Harry Potter e as relíquias da morte - parte 2
4. Os Smurfs
5. Piratas do Caribe
6. Enrolados
7. Transformers: o lado oculto da lua
8. Carros 2
9. Velozes e furiosos 5
10. Capitão América: o primeiro vingador
Fonte: Filme B
Os dez melhores de 2011 (estrangeiros)
1. Melancolia, de Lars Von Trier
2. Tio Boonmee que pode recordar de suas vidas passadas, de Apichatpong Weerasetakhul
3. Cópia fiel, de Abbas Kiarostami
4. A pele que habito, de Pedro Almodovar
5. A árvore da vida, de Terrence Malick
6. O lutador, de David Russell
7. Homens e Deuses, de Xavier Beauvois
8. Super 8, de J.J. Abrams
9. Meia noite em Paris, de Woody Allen
10. X-Men - primeira classe, de Matthew Vaughn
Os dez melhores de 2011 (nacionais)
1. Trabalhar cansa, de Marco Dutra e Juliana Rojas
2. Estrada para Ythaca, de Luiz e Ricardo Pretti e Guto Parente
3. O Palhaço, de Selton Mello
4. Avenida Brasília Formosa, de Gabriel Mascaro
5. Estrada Real da Cachaça, de Pedro Urano
6. Pacific, de Marcelo Pedroso
7. As canções, de Eduardo Coutinho
8. Ex-isto, de Cao Guimarães
9. Transeunte, de Erick Rocha
10. O céu sob os ombros, de Sérgio Borges
(Diario de Pernambuco, 28/12/2011)
sexta-feira, 23 de dezembro de 2011
Missão: impossível – Protocolo fantasma
A cada cinco anos, Mission: impossible gera um novo tomo. Fã declarado da serie original, Tom Cruise diz que assumiu a produção desde a primeira parte da franquia porque ninguém estava fazendo filmes de ação da maneira que ele gostaria. Ou talvez que não o evidenciasse tanto como herói infalível. Em Missão: impossível - Protocolo fantasma, ele posa até de James Bond, um 007 norte-americano, elegante e sem sutilezas.
A primeira novidade é o upgrade tecnológico. Várias referências à antiga série estão no novo filme, como a missão recebida via telefone público. Só que desta vez, a clássica autodestruição da mensagem ocorre somente após um empurrãozinho do astro, condescendente com os métodos antigos, apesar do parabrisa touch de sua BMW futurista. iPads, iPhones e iMacs surgem a rodo, diz o diretor Brad Bird, sem que a produção recebesse um centavo da Apple.
Missão: impossível – Protocolo fantasma estreia com o mundo em ebulição: Europa em crise econômica, Rússia e Oriente Médio em enfrentamentos políticos. No entanto, o pano de fundo do filme se reduz à nostálgica guerra fria. A missão da vez é impedir o extermínio nuclear, a partir de códigos escondidos nos subterrâneos do Kremlin. Tomado pela insanidade, um agente está determinado a deflagrar uma bomba atômica.
Geralmente o IMF (Impossible Mission Force) age sem a chancela oficial da Casa Branca. Acaso capturados, o governo nega conhecimento de suas ações. Agora o grupo atua por conta própria, pois perde qualquer relação com os Estados Unidos, após o incidente em Moscou.
Envolvido em trama tão retrô, Cruise arrisca não atingir o upgrade mais cobiçado: o de sua imagem como astro de ponta. Mas ele se esforça. Para impedir o desastre, encara desafios como escalar o prédio mais alto do mundo, em Dubai. Para depois descer correndo, na vertical. Leva tiros, enfrenta o fundo do mar, explosões, carros que capotam em tempestade de areia.
Na série televisiva dos anos 1970, o foco estava no trabalho em grupo, capaz de superar as mais difíceis missões. Espetacular e inverossímil, a franquia se esforça para equalizar esse mesmo equilíbrio, mas a ação sempre gira em torno de Cruise, que pilota carrões e contracena com musas como parceira boa de briga Paula Patton e a femme fatalle Léa Seydoux, espiã mercenária que atira com elegância de passarela.
A via é de mão dupla. Enquanto valoriza destinos turísticos do mundo, Cruise traz para si a exuberância arquitetônica das cidades, reduzidas a um adorno para a sanha auto-afirmativa de personificação do sucesso. Tudo arriscado, excitante e resolvido no ultimo minuto. Como culto a Cruise e entretenimento sem compromisso, é bom programa. Convém não esperar mais do que isso.
(Diario de Pernambuco, 23/12/2011)
sexta-feira, 16 de dezembro de 2011
Cinema em transição
O processo de transição do cinema analógico para o digital está quase chegando ao fim. De acordo com a revista francesa Cahiers du Cinema, em 2015 a película, que no último século foi o padrão, estará definitivamente fora do mercado de produção e exibição comercial. A extinção do suporte fotoquímico, no entanto, não deve ser motivo de choro ou comemorações. Por falta de padrões e normas, o cinema digital dificilmente chega aos olhos do público em condições aceitáveis. Sem falar que a realidade brasileira ainda esta longe do ideal: menos de 20% do circuito de exibição está equipado com projetores digitais.
Especialista no assunto, diretor de fotografia e um dos fundadores da Associação Brasileira dos Cinematografistas (ABC), Carlos Ebert está no Recife para uma oficina de cinematografia digital, focada no uso cada vez maior de câmeras fotográficas que filmam em HD, como a Cannon 5D. Aproveitando a presença do mestre na cidade, ele conduzirá o debate A transição no cinema – no fazer e no exibir, hoje, as 19h30, no Cinema da Fundacao (Derby), com entrada franca.
Carlos Ebert tem nas credenciais o filme O bandido da luz vermelha, de Rogério Szgarnzela, cultuado por várias gerações. Entre os trabalhos mais recentes estão os curtas da Trilogia do esquecimento, de Rodrigo Grota, cujo último tomo, Haruo Ohara, acumula 27 prêmios. Outro trabalho recente, Rivelino, ganhou prêmio especial do júri em Gramado. “Sou muito procurado pelos jovens. Eu gosto deles, porque trazem problemas novos, indagações diferentes. Do pessoal da minha geração, já sei tudo o que posso esperar”.
Entrevista >> Carlos Ebert: "O público no Brasil não reclama, aceita tudo”
O cinema analógico acaba mesmo em 2015?
Em 2015, não sei, mas algumas notícias indicam que sim. A mais recente é que os fabricantes de câmeras fotoquímicas só produzirão sob encomenda.
Se a tecnologia permite, por que isso não aconteceu antes?
A captação e a projeção eram os últimos baluartes do sistema fotoquímico, todo o resto já é feito em digital. O que atrapalhou um pouco a transição foi a crise nos EUA e agora na Europa. Digitalizar as salas é um investimento alto.
Filmar em 35mm se tornará luxo, um capricho para poucos?
Vai virar uma exceção, alguns cineastas não vão abrir mão, pois tem algo geracional, de hábito, que não se consegue se desvencilhar. David Lynch e, no Brasil, Fernando Meirelles, já declararam que não pretendem mais trabalhar com filmes fotoquímicos. Acredito que a maioria fará o mesmo, principalmente quem cresceu assistindo TV e jogando videogame. O (Abbas) Kiarostami rodou Cópia fiel com uma Red One. Não é um grande equipamento, e mesmo assim não senti nenhuma perda de qualidade artística ou técnica. Não há mais diferença de qualidade entre cinema digital analógico. Talvez de textura, um aspecto inerente à natureza da imagem. Os pontos que formam a imagem fotoquímica são randômicos, distribuídos aleatoriamente dentro do frame, o que gera uma textura que se movimenta, parece estar viva. Enquanto a digital é uma malha fixa de pixels. Tudo isso pode ser comparado, a impressão subjetiva não. É como comparar pintura de aquarela com a técnica em acrílico.
A aparência “imperfeita” do 35mm se tornará recurso de linguagem para o cinema digital, como se faz na musica com o ruído dos discos de vinil?
Sim, programas fazem essa metamorfose, provocam vibrações do quadro e até os riscos, a sujeira. Agora, a natureza da imagem nunca vai ser igual. Dá pra mimetizar, mas não passa de um simulacro.
Alguns diretores ainda preferem exibir seus filmes em 35mm porque a projeção digital pode ser algo imprevisível. Como superar esses problemas?
Com uma normatização. O problema é que nem as projeções em 35mm cumprem a norma técnica. Vou ao cinema com meu equipamento de medição de luz, e aluminância da tela sempre está abaixo, a imagem com diferença de foco do cento pra borda da tela. O cinema digital começou nesse caos. O sistema brasileiro não segue o padrão universal, o DCI. Estamos na terra de ninguém. Isso nos levou ao manifesto da ABC, para apontar direções e dar parâmetros mínimos para o filme chegar aos olhos do espectador com o mínimo de qualidade.
E quais são os parâmetros mínimos?
Cada etapa tem os seus. Na captação, o Full HD é aceito como cinema digital, mas mundialmente, precisa ter no mínimo 2.048 linhas, que é o famoso 2K. Quando começaram a digitalizar salas comerciais, a resolução era 720x1.440, que é abaixo do Blu-Ray. Até hoje usam um codec que é uma variante do Windows Media Player. Isso gera todos os tipos de problema. Na Mostra de São Paulo, por exemplo, fiquei desesperado quando assisti a um filme em que trabalhei. Naquele dia, todos os curtas foram exibidos com problemas. Hoje, grandes festivais só aceitam inscrições de filmes digital no padrão DCI.
E o público, como pode se orientar?
O público no Brasil não reclama, tende a aceitar tudo. Não existe a cultura de exigir pelo que pagou. Os exibidores sabem disso e tiram proveito. Não achamos que outros formatos de qualidade inferior sejam eliminados, mas sim, existir em outro lugar, não em uma sala que cobra R$ 20 pela entrada. Se não, as pessoas vão passar a ver filmes em casa, alguns equipamentos cada vez mais baratos, com qualidade muito melhor do que a média das salas de cinema.
(Diario de Pernambuco, 16/12/2011)
quinta-feira, 15 de dezembro de 2011
Para ele, nada é impossível
Rio de Janeiro – A capital carioca recebeu ontem a première brasileira de Missão impossível – Protocolo fantasma. É a única cidade da América Latina a ser colocada no mapa de lançamento desta superprodução de US$ 140 milhões. A consequência direta é que não dá pra chegar à esquina sem topar com cartazes de Tom Cruise de capuz, caminhando em sua direção, determinado a resolver algo misterioso e importante. Ele está no Brasil, depois de passar por mais dez cidades, entre elas algumas que serviram de cenário para o quarto filme da franquia. O Rio seria uma delas, mas foi substituído por Moscou. A nova lógica de marketing de Hollywood colocou a nave-mãe por último. Somente amanhã os EUA assistirão pela primeira vez o longa, que estreia mundialmente no dia 21.
A atriz Paula Patton, o DJ holandês Tiesto, o diretor Brad Bird e Brian Burk, um dos produtores ao lado de Cruise e J.J. Abrams, também estão na cidade para o evento, que estendeu tapete vermelho para Cruise ser tietado por quatro mil fãs no complexo de salas Cinepolis Lagoon. O tratamento especial para mercados emergentes como China, India e Brasil se explica na ponta do lápis: atualmente, são poucas as produções hollywoodianas que se pagam 100% com bilheteria norte-americana. De acordo com a assessoria de imprensa da Paramount Pictures, que distribui o longa, o mercado brasileiro se equipara ao do México, e isso não é pouco. Ainda não há número oficial, mas o circuito brasileiro deve ser ocupado em mais de 750 salas.
Curiosamente, a turnê pelo globo espelha o roteiro no filme, que começa em Budapeste e termina nos EUA. Na noite de terca-feira, o Diario de Pernambuco assistiu a sessão para a imprensa, em generoso digital IMAX. A maior parte da ação está concentrada na Rússia, Emirados Árabes e Índia. Em Dubai, Cruise chega a escalar o maior prédio do mundo com as mãos. Na Rússia, corre enquanto o Kremlin explode. Não faltam carros destruídos e mulheres bonitas, como Léa Seydoux (Meia noite em Paris),
a femme fatalle que atira com elegância de passarela.
Sucessor de Brian de Palma, John Woo e J.J. Abrams, que dirigiram os filmes anteriores, Bird é responsável por animações de sucesso, como Ratatouille e Os incríveis. Em coletiva ontem à tarde, ele disse que a experiência com animação ajudou a filmar algumas sequências de ação. “Devido ao porte do projeto e a rapidez com que ele foi realizado, só consegui pré-visualizar metade das sequências, como a da tempestade de areia. Tivemos que improvisar a outra parte, e minha experiência com animação ajudou nisso”.
Perguntado sobre referências e a autoralidade do projeto, Bird diz que buscou fazer uma homenagem à série original nas cenas de abertura, em que flashes da trama aparecem junto dos créditos. “Com recursos apropriados, podemos fazer o que quiser em qualquer mídia. Em uma animação, podemos imitar a realidade. Ao vivo, a espontaneidade é maior”. Para o produtor Bryan Burk, a marca de Bird está nos planos longos e coreografados, com elementos de comédia. Antes de terminar a coletiva, Burk adianta que Star Trek 2, sua próxima produção, começa a ser rodada mês que vem em Los Angeles.
Responsável pela discotecagem no tapete vermelho, Tiesto já havia trabalhado
com a música da série Piratas do Caribe. “Talvez por isso me chamaram”. Quando
começou o projeto, tinha dúvidas sobre o resultado, por se tratar de uma música tão
conhecida. “Não sabia se terminaria bem, mas no final funcionou porque encontrei a
batida certa”.
* O repórter viajou a convite da Paramount Pictures
(Diario de Pernambuco, 15/12/2011)
quarta-feira, 14 de dezembro de 2011
Tom Cruise no Brasil
Tom Cruise está no Brasil para promover o lançamento de seu novo filme, Missão impossível – Protocolo fantasma. Baseado na série televisiva que fez sucesso nos anos 1970, o quarto longa-metragem da franquia iniciada em 1996 estreia mundialmente no próximo dia 21.
Missão impossível – Protocolo fantasma foi exibido ontem à noite, em sessão para jornalistas. Nele, Ethan Hunt precisa evitar uma catástrofe nuclear arquitetada por um agente que acredita no extermínio como a solução para a humanidade. Para impedir o plano, ele conta com equipe da qual faz parte a agente Jane (Paula Patton). A femme fatalle Léa Seydoux (Meia noite em Paris) faz parte do elenco como uma espiã mercenária.
Hospedados no Copacabana Palace, Tom Cruise e Paula Patton (Preciosa, Hitch) serão vistos pelo publicamente às 19h, no tapete vermelho no complexo Cinepolis Lagoon, quando Missão impossível – Protocolo fantasma será exibido em sessão para convidados. O evento terá transmissão ao vivo pelo site www.missionimpossible.com.
Um pouco antes, à tarde, o diretor Brad Bird falara com a imprensa. Sucessor de Brian de Palma, John Woo e J.J. Abrams, que dirigiram sequencias anteriores, Bird se tornou conhecido por assinar as animações Rattatoulle e Os incríveis. O DJ Tiesto, também falará sobre seu trabalho como compositor da trilha sonora, que adapta a música original de Lalo Shifrin.
O Rio de Janeiro foi escolhido por Cruise, também produtor do longa, e a distribuidora Paramount, como uma das dez cidades estratégicas para o sucesso do filme, que permanece inédito nos Estados Unidos. Algumas delas, como Mumbai, Dubai e Moscou, serviram de locação para o filme, que também viaja para Budapeste.
Como nos outros filmes da franquia, a ação gira em torno de Tom Cruise, que protagoniza nas vertiginosas sequencias de ação, como a que ele escala, com ajuda de luvas tecnológicas, o maior edifício do mundo, em Dubai. Outros desafios surgem e, claro, só Cruise pode superá-los. Ao público, cabe acompanhar e se entreter com as peripécias do astro, que aos 50 anos, continua procurando adrenalina.
Mulher prendada no cangaço
Nascida em 8 de março de 1911, Maria Gomes Oliveira, a Maria Bonita, foi a primeira mulher a entrar para o cangaço. Mais que companheira de Lampião, uma das maiores lendas do Nordeste. “Ela é a mulher de guerra mais representada simbolicamente pelo povo brasileiro. Bonita, divertida – adorava dançar – e prendada: boa na agulha e nas linhas”, afirma e o historiador Frederico Pernambucano de Mello, que hoje, às 19h, realiza a palestra Maria Bonita: a mulher e o nome, no Museu do Estado (Graças).
Esse deve ser o último evento comemorativo do centenário de Maria Bonita em 2011. Como a cereja do bolo, o historiador contará a origem de seu nome. “Vou defender uma tese baseada em informações reveladas em 1983, por Melchiades da Rocha, o jornalista que primeiro cobriu a morte de Lampião, em 1938, quando trabalhava para o jornal A Noite e a revista A Noite Ilustrada”, diz Frederico.
O Diario de Pernambuco, à época dirigido por Aníbal Fernandes, produziu uma das fotos mais emblemáticas de Maria Bonita, a quem intitulava de Madame Pompadour do Cangaço. No entanto, o apelido que a eternizou veio de mais longe. Frederico afirma que Maria Bonita foi assim batizada pela imprensa carioca, que se inspirou em romance homônimo de Júlio Afrânio Peixoto. “Quando entrevistei Melchiades ele estava com mais de 80 anos. Me explicou a origem do nome e disse que, para checar a veracidade, bastava checar o livro, publicado em 1914 e o filme adaptado, de 1937”.
Autor de diversos estudos sobre o cangaço - o mais recente, Estrelas de couro - estética do cangaço (Escrituras), foi publicado em 2010 - Frederico analisa a alcunha de Maria Bonita como o recorrente processo da vida imitando a arte. “Ao contrário de Lampião, cujo vulgo parte da cultura popular sertaneja, Maria Bonita nasce da cultura urbana para depois invadir o Sertão, coroada pela opinião pública do Sudeste. É certo que a sujeição completa do nome pelo apelido se dá ainda em vida da Rainha do Cangaço, de maneira a não haver lugar para o Maria Gomes Oliveira, ou mesmo para cognomes anteriores”.
Maria Bonita encontrou seu Lampião em 1929, quando o bando circulava pelo Sertão da Bahia. Frederico detalha a geografia, de propriedade do casal José Gomes Oliveira e Maria Joaquina da Conceição, pais de Maria: “foi na sitioca da Malhada da Caiçara, vindo de mais uma visita de negócios”.
Após dois meses, Lampião levou a garota de 18 anos, recém-casada com um sapateiro. Pioneira, abriu caminho para outras mulheres entrarem no cangaço, uma delas quase tão famosa quanto Maria Bonita, a Dadá de Corisco. Frederico destaca a bravura, mas também a delicadeza do Rei do Cangaço como um dos fatores que a fizeram se encantar pelo pretendente. “Ninguém superava Lampião na máquina Singer de mesa”.
(Diario de Pernambuco, 14/12/2011)
terça-feira, 13 de dezembro de 2011
O homem e a cidade: realidade e invenção
Grande vencedor do Festival de Brasília 2010, o documentário mineiro O céu sobre os ombros, de Sérgio Borges, é a atração principal de hoje, na Expectativa 2012/Retrospectiva 2011 do Cinema da Fundação. O diretor estará na sessão, às 20h30, para conversar com o público. O filme trata do cotidiano de três pessoas anônimas, que moram em Belo Horizonte. Uma delas é uma transexual que vive entre a prostituição e cursos que ministra sobre sexualidade. Outra é um hare krishna, líder de torcida organizada. O terceiro é um africano que escreve livros, sem terminar nenhum.
O céu sobre os ombros é o primeiro longa de Sérgio, que vem chamando a atenção da crítica por sua narrativa incomum, que desperta dúvidas sobre a natureza do filme, entre a realidade e a invenção. Na aproximação com os personagens, abordados com leveza e intimidade por vezes invasiva e na forma como estes olham e habitam a cidade estão as maiores forças do projeto, assinado pela produtora Teia, uma das principais do cinema contemporâneo brasileiro.
Não deve ser acaso, mas sintonia, a proximidade estética com o trabalho do pernambucano Gabriel Mascaro, Avenida Brasília Formosa. Ambos compartilham do mesmo diretor de fotografia, o cearense Ivo Lopes de Araújo. E foram encartados na edição de novembro da revista Piauí, junto com análise acadêmica em artigo escrito pelo pesquisador Cézar Migliorin. Assim como o filme de Gabriel, há muito o que aprender com o de Sérgio. Cada estranhamento é uma chave, para portas que levam a boas surpresas. Ou, melhor ainda, a alguns mistérios.
(Diario de Pernambuco, 13/12/2011)
segunda-feira, 12 de dezembro de 2011
Criatividade é a moeda do futuro
Muito se fala que a criatividade é uma das maiores riquezas dos brasileiros. Pois ela se tornou a mais nova aposta de crescimento do país. Ao reunir cultura, tecnologia da informação, inovação e mercado, a economia criativa é a bola da vez para um país prestes a receber o Rio+20, Copa 2014 e Olimpíada 2016. Demorou, mas se tornou estratégica o suficiente para se tornar política de estado. Em Pernambuco, o governo do estado investirá R$ 11,25 milhões para colocar em prática um plano batizado Pernambuco Criativo.
A ideia é promover o diálogo entre música, cinema, moda, gastronomia e design de atividades como tecnologias de comunicação, desenvolvimento de software e games para construir novos modelos de negócio, como o crowdfunding e o ecodesign. Desde 2010, o Porto Digital tem convocado empresários, produtores e artistas para compor as diretrizes do projeto Porto Mídia. “É uma junção de esforços para agregar valor e inovação às cadeias tradicionais”, diz Verônica Sampaio, gerente de segmentos da Secretaria de Desenvolvimento Econômico.
De acordo com Verônica, o grande desafio é superar a falta de profissionalização. “Teremos um centro de referência de moda, um escritório de projetos criativos e cinco pólos de economia criativa. O primeiro será efetivado quando o Porto Digital ampliar o equipamento para Olinda e Jaboatão”.
A Secretaria de Cultura também tem seu próprio ponto de vista. “Nossa proposta é inclusiva”, diz Luciano Gonçalo, coodenador de economia criativa da Fundarpe. “Inovação não é, necessariamente, hi-tech. A economia criativa precisa focar em setores tradicionais, que precisam de maior aporte de recursos para gerar emprego e renda, respeitando a diversidade e identidade, para que não seja conduzida à mera mercantilização. As políticas têm que se adequar às realidades e ouvir as comunidades, para desenvolver com elas um modelo colaborativo e sustentável”.
Para aprofundar a discussão, foi organizado o 1º Encontro Criativo, que começa hoje no Teatro Hermilo Borba Filho (Cais do Apolo, Recife Antigo). Participam do evento especialistas, produtores e gestores públicos como Cláudia Leitão, chefe da recém-criada Secretaria de Economia Criativa do Ministério da Cultura. Ela vem ao Recife assinar o convênio para a abertura do Criativa Birô, que será o primeiro escritório de apoio a projetos criativos do Nordeste.
Entre os apoiadores do Encontro Criativo, estão o Consulado da Alemanha no Recife e o British Council (Inglaterra), que mantém com o Brasil acordos de cooperação. Convidado para conhecer a indústria criativa alemã (Berlim foi nomeada pela Unesco como uma das Cidades do Design), o professor da UFPE Hans Waechter diz que o polo têxtil do Agreste tem muito a aprender com o modelo germânico. “Berlim recebeu um megainvestimento para criação e comercialização de produtos voltados para a sustentabilidade. O mesmo pode ser feito em Pernambuco, pois o polo é marcado por desenhos sem criatividade, boa parte copiados e de ciclo muito rápido. O ideal é promover uma estrutura que traga benefícios sociais para todos os envolvidos”.
Depoimentos
"A economia criativa é o nosso futuro. Temos vocação para ser a Cidade da Música, mas em 11 anos de programa multicultural, o poder público não entendeu que não basta promover eventos. O Recife tem que ter uma rádio. Os gargalos são os mesmos, casas noturnas duram no máximo seis meses. Temos uma produção musical aplaudida nos principais palcos do mundo, mas absolutamente desconhecida na própria cidade. A Prefeitura do Recife é a maior contratante de shows do Norte-Nordeste, e ela paga às bandas um cachê que o mercado privado não consegue alcançar. Não forma público” - Paulo André Pires, produtor cultural
"A grande chave da economia criativa é a característica de integrar diversas áreas do conhecimento. Na produção de conteúdo, ela aproxima áreas como cinema, animação, música, games. Mesmo com todo o potencial que Pernambuco tem, essa convergência era algo evidente, mas até agora não aconteceu. Hoje há uma mudança radical de paradigmas de consumo e produção, o mercado se configura de forma peculiar. A partir de uma chancela institucional, é possível atrair investimentos e configurar uma cultura de fato sustentável, capaz de entender que mercado esse, bem mais abrangente o que pensamos” - Leo Falcão, cineasta
"Precisamos saber qual conceito será desenvolvido para inserir as culturas tradicionais no mercado. Não adianta estabelecer um processo de cima pra baixo, sem escutar os produtores culturais. Na Zona da Mata, temos uma rede estruturada, com rádio, editora, festival, agência de projetos. Em termos de economia criativa, estamos muito mais organizados que o Recife. É uma economia que se baseia na apropriação dos meios de produção pelas comunidades. Artista não é operário, é protagonista” - Afonso Oliveira, produtor cultural
Para redesenhar espaços públicos - A implantação do Criativa Birô no Recife será a primeira ação concreta para dinamizar e garantir infraestrutura para a economia criativa em Pernambuco. O escritório funcionará na Casa da Cultura, no bairro de Santo Antônio, e deve ser inaugurado em agosto de 2012. “Ofereceremos apoio e serviços de uma incubadora como assessoria técnica, jurídica e de gestão de estrutura e marketing, sem, no entanto, tutelar o projeto”, explica Luciano Gonçalo, coordenador de economia criativa da Fundarpe. “Queremos aprofundar relações e dar suporte técnico para as comunidades tradicionais conseguir autonomia e empoderamento. A ideia é facilitar a troca de experiências, a formação de coletivos e redes aonde elas estão inseridas”.
Presidente da Federação Nacional da Economia Criativa, Edgar Andrade passou os últimos quatro anos no Governo do Estado, onde agora atua como consultor. Ele diz que o papel da economia criativa é desenhar modelos que provoquem a melhoria na qualidade de vida para todos. “Segundo a Unesco, precisamos investir na reconstituição dos valores culturais, pois eles mantêm as cidades vivas e habitáveis, proporcionando bem estar, trabalho e lazer”.
Daí o conceito de cidades criativas, que possam contribuir na mudança de comportamento. “Elas promovem um efeito multiplicador absurdo. Não se trata de jogar artistas num bairro ou colocar uma banda na esquina, mas de redesenhar os espaços públicos. Condomínios artificiais não refletem a alma da cidade, mas sim, as praças. Uma experiência em construção é o projeto que juntou uma empresa de TI a outra de administração. Eles criaram uma narrativa de game, com experiências interativas, para um museu de São Paulo. Outro exemplo é o projeto The Fun Theory, que transformou uma escada do metrô de Estocolmo em um piano, para que os passageiros a utilizem na hora do rush. A ideia é procurar esse tipo de soluções aqui”.
Entrevista >> Lala Deheinzelin: "Recursos intangíveis são infinitos"
Especialista em economia criativa, a paulista Lala Deheinzelin tem atuado como palestrante, pesquisadora e consultora para diferentes organizações, como a Petrobras, Basf, BNDES e Unesco. No Recife, ela participa da abertura do Encontro Criativo hoje, às 19h, no Teatro Apolo. Na entrevista a seguir, fala sobre a importância do tema para a soberania do país.
Por que a economia criativa é estratégica?
Estamos na passagem da sociedade industrial para sociedade em rede. Na primeira, a riqueza e qualidade de vida é gerada a partir de recursos materiais, como terras, minérios e petróleo. A economia criativa tem o mesmo processo, só que em vez de trabalhar com recursos materiais, a riqueza é gerada a partir de recursos intangíveis, como a cultura e o conhecimento. Isso é estratégico porque os recursos materiais são finitos, enquanto os intangíveis são abundantes, infinitos e se multiplicam com o uso.
Qual o papel do governo nesse processo?
É o mesmo com relação ao pré-sal. O poço de petroleo só se justifica se puder gerar riqueza para todos. Todos os países onde se avançou na economia criativa tiveram apoio do governo, pois é preciso estrutura, criação de leis que a priorizem como estratégias de desenvolvimento. No Brasil, as leis são inadequadas ao século 21.
Que estratégias são essas?
Que levem ao desenvolvimento não da economia criativa, mas do país, através dela. As políticas ficam focadas na erradicação da miséria, mas não no reconhecimento das fontes de riqueza. Pernambuco é riquíssimo em diversidade cultural, mas não existe investimento no processo que a transforme em riqueza. No Brasil, quem mais se movimenta é o Rio e Pernambuco, mas o estado mais bem preparado ainda é a Bahia. Eles sabem que seu valor está na cultura e todos fomentam isso porque sabem que é o atrativo, a marca. É o que vai gerar negócios em qualquer área.
Por que outros países estão interessados na economia criativa brasileira?
São vários interesses. A visão positiva é que, para o mundo se desenvolver, é preciso acabar com a miséria. Outra, menos positiva, que precisamos ficar atentos, é que o intangível é um valor, um patrimônio. Já houve um processo de colonização dos bens tangíveis e pode estar em curso o mesmo processo para os intangíveis, a “matéria-prima” da vez. Tudo depende de como será conduzido, de como se estabelecem essas relações. A nossa grande questão é que ainda não temos parâmetros suficientes para medir o intangível. Por isso, ele continua invisível. Ou, porque é interessante para alguns, invisibilizado.
Saiba mais
Economia criativa é um conceito em evolução, baseado em conhecimento e recursos criativos potenciais para gerar crescimento econômico e desenvolvimento.
1. Pode estimular a geração de renda, criação de empregos e receitas de exportação, promovendo a inclusão social, diversidade cultural e desenvolvimento humano;
2. Abrange aspectos econômicos, culturais e sociais que interagem com a tecnologia, propriedade intelectual e turismo;
3. É um conjunto de atividades econômicas baseadas no conhecimento com uma dimensão de desenvolvimento e ligações transversais com a economia global;
4. É uma opção de desenvolvimento viável que pede respostas inovadoras e políticas multidisciplinares de ação interministerial.
Fonte: Conferência das Nações Unidas para o Comércio e Desenvolvimento
Programa do seminário Encontro Criativo 2011
Teatro Hermilo Borba Filho (Cais do Apolo, Bairro do Recife. Fone: 3355-3320)
Hoje
14h - Ambientes criativos e sustentabilidade na economia criativa, com Júlia Zardo (PUC-RJ).
19h - A economia criativa hoje e no futuro, com Cláudio Ferrário e Lala Deheinzein.
20h - Café-conversa com participantes do encontro.
Amanhã
9h - 2030 - Consumo e demanda de produtos culturais, formação, inclusão e diversidade, modelando novos cenários, com Lala Deheinzein, Paulo Miguez e Luciano Gonçalo (mediador).
11h - Empreendedorismo e inovação gerando novos negócios e influenciando mercados, com Júlia Zardo, Geber Ramalho e Edgar Andrade (mediador).
14h - Conceitos e desenvolvimento histórico das políticas públicas de economia criativa. Apresentação do Plano Nacional de Economia Criativa, com Claudia Leitão (da Secretaria Executiva de Desenvolvimento de Negócio do SDEC).
16h - Fomento, sustentabilidade, financiamento. Como estimular a cultura empreendedora e a profissionalização, com Tibico Brasil, Marina Gama, Leonardo Salazar e Roberto Abreu (da Secretaria Executiva de Desenvolvimento de Negócio do SDEC).
Quarta-feira
9h - Bacias criativas, consórcio de municípios para o desenvloimento da economia criativa no interior, com representantes do CIDSEM-GO, MinC e da sub-chefia da Presidência da República.
10h - Observatório da cultura e pesquisa de consumo dos espetáculos de teatro em Pernambuco, com Álvaro Santi e Célio Pontes.
14h - As experiências dos ecossistemas criativos em Pernambuco, Buenos Aires e Reino Unido, com Chico Saboya, Renata Camelo e Caroline Parkinson (Escócia).
16h - Pernambuco criativo - Ações em deselvolvimento, com Geraldo Júlio, Fernando Duarte e Márcio Stefanni.
(Diario de Pernambuco, 12/12/2011)
sábado, 10 de dezembro de 2011
Curta Maracatu atômico - Kaosnavial será exibido hoje em Tracunhaém
Antes de Chico Science, havia Jorge Mautner e os tropicalistas. É nessa fonte primeira que se sustenta o Kaosnavial, projeto cujo mais recente produto é o documentário Maracatu Atômico - Kaosnavial, que será lançado hoje, às 20h, abrindo a programação do Festival Canavial em Tracunhaém, com a presença do compositor. Amanhã é a vez de João Pessoa assistir ao curta, dirigido por Marcelo Pedroso (Pacific) e Afonso Oliveira.
O primeiro encontro entre Mautner e Zé Duda, mestre do Maracatu Estrela de Ouro de Aliança, aconteceu em 2006. Mautner nunca havia visto um maracatu rural em seu habitat, a Zona da Mata Norte. Ficou sem palavras quando, em meio a seu show em Nazaré da Mata, foi pego de surpresa com um “ataque” do Estrela de Ouro, que cruzou o palco várias vezes. Em 2009, o produtor Afonso Oliveira propôs ao compositor e seu parceiro, Nelson Jacobina, a criação da trilogia Kaosnavial, que rendeu um álbum e uma turnê-espetáculo. Agora, chega o filme, que até o carnaval será lançado em box CD/DVD.
O curta de Afonso e Pedroso abre com uma forte sequência em que um brincante da região fuma um cachimbo, em transe, em meio a uma queimada de cana-de-açúcar. Do belo e trágico cenário que se repete há séculos, corta para o casarão de Aliança, sede do maracatu e outras manifestações tradicionais como o caboclinho, coco, cavalo-marinho. O filme acompanha Zé Duda e Mautner, que, quando veste a gola de lantejoulas, transforma-se em “Jorge Malta”, como Zé Duda o rebatizou. “Parece que o conheço há cem anos, esse camarada”, diz o mestre.
Em programa de rádio local, Mautner explica sua filosofia do caos como um amálgama da cultura brasileira e conta que a babá que a criou era filha de santo. Ela dizia que seus pais tiveram vida cruel (foram perseguidos pelo nazismo). “Mas aqui encontraria irmãos”, disse.
Cinema - Afonso reuniu no curta-metragem os espaços em que os projetos se desenvolvem na Mata Norte, além do processo de criação do Kaosnavial. Em 2010, ele convidou Marcelo Pedroso para co-dirigir o curta. Foi quando começaram a discutir roteiro e formas de apresentar os artistas.
“A ideia sempre foi de um filme com estrutura simples, equipe pequena para preservar a atmosfera do lugar e das pessoas”, diz Pedroso. “Afonso é pilhado, tem muita energia e centenas de ideias por minuto. Então, a questão era encontrar um ponto de equilíbrio que desse conta de toda a vivência e o olhar que ele tem sobre a cultura da Zona da Mata”.
Além do filme, o Festival Canavial leva a Tracunhaém, neste sábado, as seguintes atrações: Moisés Lins e a Ciranda Alinhando Pensamentos; Santino e a Ciranda Popular; Biu Passinho e a Ciranda Pernambucana; Quinteto Violado; João Limoeiro e a Ciranda Brasileira; e Homem de Barro.
(Diario de Pernambuco, 10/12/2011)
quinta-feira, 8 de dezembro de 2011
Sufocante padrão de consumo
Representante brasileiro no último Festival de Cannes, Trabalhar cansa é um dos melhores filmes do ano e um caso à parte na recente produção nacional. Com a chancela dos festivais de Paulínia e Brasília, ele será exibido no Recife hoje, às 18h30, dentro da programação do Expectativa 2012/Retrospectiva 2011 do Cinema da Fundação.
Dirigido por Marco Dutra e Juliane Rojas, o longa utiliza recursos do cinema sobrenatural para desdobrar as dificuldades de uma família de classe média em decadência que se esforça para manter certo padrão de consumo.
O pai (Marat Descartes) acaba de ser demitido da empresa para a qual dedicou metade de sua vida adulta. A mãe (Helena Albegaria) abre um mercadinho. Enquanto luta para viabilizar o empreendimento, Abegaria (em ótima atuação) radicaliza na postura senhorial com os empregados, mesmo sem autoridade (ou conta bancária) para tanto.
A náusea que sentimos vem da condição de Descartes, que sente na pele o cinismo utilitarista dos departamentos de RH, ou do encanamento quebrado, que deixa o mercado com insuportável odor? São vários os ruídos estranhos. Eles representam o estado psicológico dos personagens ou algo misterioso, a ser revelado?
O olhar para as contradições e amarguras da vida social brasileira através da intimidade do núcleo familiar remete a filmes de Leon Hirzman (São Bernardo) e Sérgio Bianchi (Os inquilinos), mais longe ainda, à filmografia italiana do pós-guerra, Vittorio de Sica, Mario Monicelli.
Com um grande porém: o sentimento de revolta e mal-estar é construído com requinte estético e peculiaridades pouco comuns a produções engajadas. Uma narrativa fantástica que não se resume ao escapismo. Pelo contrário, se justifica por estar atrelada a uma observação afiada sobre o verniz de civilidade que, em nome da sobrevivência, é trocado pelo que há de cruel e selvagem nas relações humanas.
A estratégia remonta à escola surrealista, de Buñuel a David Lynch. Que de alienados, não têm nada. Tratar o irreal com naturalidade é metáfora precisa para retratar as contradições e a morbidez com que se estabelecem as relações.
(Diario de Pernambuco, 08/12/2011)
segunda-feira, 5 de dezembro de 2011
Safra de curtas tem seu janelão
Começa hoje o 13º Festival de Video de Pernambuco, a maior janela para a recente safra de curta-metragens produzidos no estado. São 50 filmes, em sessões diárias e gratuitas, até a próxima sexta-feira. Pelo segundo ano, o evento é realizado no Cinema São Luiz (Rua da Aurora, 184 - Boa Vista). E é a primeira vez desde que o majestoso cinema de rua se tornou propriedade pública.
Não é pouco. Além de ser o principal incentivador do audiovisual pernambucano e oferecer um dos melhores e mais generosos editais do país, o governo do estado agora oferece um espaço à altura da produção que patrocina. Falta modernizar o equipamento, é verdade. Como já foi dito antes, a maioria dos filmes com a logomarca da Fundarpe é realizado em suporte digital. O São Luiz, no entanto, não conta com tecnologia para exibi-los.
Por isso, o evento precisou alugar um projetor digital, o mesmo utilizado no Festival de Triunfo. Carla Francine, coordenadora de audiovisual da secretaria estadual de cultura, diz que ano que vem será aberta uma licitação para compra de um projetor próprio. “Agora que adquirimos o cinema, a prioridade é equipá-lo com o que há de melhor. Estamos todos empenhados nisso”.
O formato das exibições é o mesmo de sempre, com o detalhe de que a antiga Mostra Universitária agora se chama Mostra de Formação. Na Mostra Geral serão oferecidos R$ 40 mil em prêmios e comissão é formada por Ângela Prysthon, Germana Pereira e Rose Lima (júri Formação) e Francisco Baccaro, Isabela Cribari e Paulo Meira (júri Geral). Neste última, concorrem 40 curtas de cinco gêneros: documentário ficção, videoclipe, experimental e animação. Três concorrentes fazem parte do projeto Olhares sobre Lilith, livre adaptação da obra As filhas de Lilith, de Cida Pedrosa: Rosana, de Kátia Mesel; Wilma, de Eva Jofilsan; e Úrsula, de Luci Alcântara.
Na terça de manhã, haverá programação especial em parceria com o Dia Internacional da Animação, para 500 estudantes do ensino médio da rede pública, seguida de debate com realizador Marcos Buccini. Durante a semana, três oficinas serão oferecidas pelo festival, no período da manhã e tarde, na Fundação Joaquim Nabuco / Derby: Laboratório de Roteiros, com o cineasta Torquato Joel; Direção de Arte, com Silvia Macedo; e Realizando em 1 Minuto, com Alice Gouveia.
Outra boa notícia é que o espaço de convivência promovido pelo MediaLuna Gourmet no primeiro andar do São Luiz está de volta. A experiência funcionou bem durante o Janela Internacional. Festival não se resume a exibir filmes. Principalmente, deve proporcionar um ambiente de encontro e fluxo de ideias.
Seminário - Pela primeira vez, o Festival de Vídeo realiza o seminário Cinema: Mercado e Distribuição no Brasil. Será nos dias 15 e 16, no auditório do IPHAN (Palácio da Soledade, antigo Colégio Nóbrega - Boa Vista). “O governo tem feito um investimento crescente no audiovisual. Temos mais de 30 longas sendo produzidos no estado. Precisamos discutir estratégias de ocupação do mercado, de como fazer circular essa produção premiada em festivais, bem cotada pela crítica, mas que não está nas salas de cinema”, diz Carla. Para aprofundar o assunto, estarão no Recife o distribuidor Jean-Thomas Bernardini (Imovision), Sérgio Sá Leitão (RioFilme), Paulo Sérgio Almeida (FilmeB), Adhemar de Oliveira (Arteplex), entre outros, além de Kleber Mendonça (realizador, produtor e programador do Cinema da Fundação), João Jr (REC Produtores Associados), Isabela Cribari (produtora e realizadora), Mannu Costa (presidente da ABD/PE) e do secretário de cultura do estado, Fernando Duarte.
Programação
Segunda
19h | Mostra Competitiva de Formação
Fulô de açucena, de Marcos Carvalho
Sem energia, de Tiago Rocha
Quarteto simbólico, de Josias Teófilo
No caminho de claranã, de Marcos Carvalho
Bexiga, de Felipe Almeida e Vinicius Gouveia
Estella, de Priscilla Andrade
20h | Mostra Competitiva Geral
Café Aurora, de Pablo Polo
Setembro, de Pedro Severien e Rodrigo Campos
Grace, de Geórgia Alves
Mãe do mundo, de Ayla Alencar
Acercadacana, de Felipe Peres
O macaco e o rabo, direção coletiva dos alunos da disciplina animação digital
To doidão, de Alessandro Guedes
Solar dos Príncipes, de Bruno Mendes e Henrique Eduardo
16° Andar, de Celso Vinicius Sales
Vou tirar você da cara, de Ana Olívia Godoy, Danielle França e Jean Santos
Terça
9h | Mostra Especial CineCabeça / Dia Internacional da Animação
Mostra Nacional de Cinema de Animação 2011
19h | Mostra Competitiva
de Formação
Case, de Adalberto Oliveira
Marcha das vadias, de Gabriel Parente, Ramon Dias e Caio Cagliani
A fome, de Luciano Monteiro
Os atores, de Adalberto Oliveira, Benjamin Ruschi, Carol Correia, Gabi Saegesser, Jéssica Coelho e Klaudya
20h | Mostra Competitiva Geral
Com paixão, de Alexandre Lucena
A ponte, de José Cahue
Sha-layam!, de Neco Tabosa, Marcelo Lyra, Beto Figueiroa, Raphaela Spencer, Renato Spencer, Rafa Medeiros, Tom Cabral e Jr. Black
Rosana, de Kátia Mesel
Vou Estraçaiá, de Tiago Leitão
No Limite, de Adalberto Oliveira
Coração Delator, de Júlia Araújo e Nathália D’Emery
Frotteurismo já – Monstro Amor, de Grilo
Turno da noite, de Henrique Spencer
Calma Monga, calma!, de Petrônio de Lorena
Quarta
19h30 | Mostra Competitiva Geral
Cavalo-marinho: no passo da brincadeira, de Clecio Sobral e Magda Negromonte
O baile de Betinha, de Chiarina Maria Beloto
A rapadura é nossa, de Maria Filomena
A saudade de Severina, de Shivo
Erickson Luna, de Osman Godoy
FEIJAM- Resistência %2b Cultura Popular, de José Diniz
Velho Samba da Ilha, de Chico Egídio
Coco de improviso e a poesia solta no vento, de Natália Lopes
Quinta
19h30 | Mostra Competitiva Geral
Dia estrelado, de Nara Normande
Palavra plástica, de Léo Falcão
Zip, de Felipe de Araújo, Marlon David e Túlio Bonagura
Úrsula, de Luci Alcântara
Vendo meu voto: tratar aqui, de Lia Letícia
Homem-Planta, de Pedro Severien e William Paiva
Pelos muros, de Igor de Lyra
A festa de Isaac, de Ianah Maia
Corpo líquido, de Ana Lúcia Diniz e Alan Tonello
Saudade do mundo, de Bidu Queiroz
Ciclo do ser, de Paulo Leonardo
Wilma, de Eva Jofilsan
Sexta
20h | Cerimônia de Premiação
(Diario de Pernambuco, 05/12/2011)
sábado, 3 de dezembro de 2011
Delicadas texturas musicais
Eles já cantaram, gravaram, fizeram participações em apresentações um do outro. Mas um show inteiro, só para os dois, é a primeira vez. Hoje e amanhã, Alaíde Costa e Gonzaga Leal cantam juntos novamente. O motivo é festivo: comemorar o aniversário dos dois, sagitarianos. Gonzaga é de 1º de dezembro e Alaíde nasceu no dia 8. Juntos, prepararam o show Porcelana, uma viagem pelo cancioneiro nacional, de Dolores Duran a Tom Jobim e Chico Buarque, de Johnny Alf a Zé Miguel Wisnick. Será na Casa de Seu Jorge (Encruzilhada), às 21h.
Os dois intérpretes cultivam admiração mútua. “Alaíde é minha amiga há 20 anos. Meu pai, que era fã dela, me apresentou. Fui me afeiçoando ao repertório, principalmente através de Cida Moreira”, conta Gonzaga. “Ela, como Marlene, são duas cantoras decisivas na minha formação musical. Até porque são mais intérpretes do que cantoras, no sentido de entender o canto, de se apropriar do texto para fazer a canção”.
A preparação para o show que nasce hoje vem de cinco anos atrás, quando Alaíde esteve no Recife pela última vez. “Pensamos em comemorar nossos aniversários, no Recife ou São Paulo. Decidimos que seria aqui. Queremos viajar e gravar um álbum em cima desse repertório”. Gonzaga e Alaíde se apresentam com banda de três músicos: Alex Sobreira (violão, arranjos e direção musical), Adilson Bandeira (sax e clarinete) e Tomás Melo (percussão).
Entre os momentos especiais do reencontro, está Estrada do Sertão, composição de João Pernambuco e Hermínio Belo de Carvalho, que será cantada em dueto. “Quando comecei minha carreira queria gravar Estrada do Sertão, mas descobri que Alaíde já a havia gravado. Quando ouvi a música, desisti”, diz Gonzaga. Agora, o círculo se fecha.
A intensidade de Alaíde no palco se aproxima não só de Dolores Duran e Elizeth Cardoso, como com divas da música negra norte-americana. “Gosto muito de Sarah Vaughan e Billie Holiday, mas se há uma ligação, é intuitiva, não consciente”. Das novas vozes da MPB, prefere não emitir opinião. “Nem sempre sei quem está cantando. Na época em que comecei, dava para identificar imediatamente. Agora ficou meio difícil”.
(Diario de Pernambuco, 03/12/2011)
Os dois intérpretes cultivam admiração mútua. “Alaíde é minha amiga há 20 anos. Meu pai, que era fã dela, me apresentou. Fui me afeiçoando ao repertório, principalmente através de Cida Moreira”, conta Gonzaga. “Ela, como Marlene, são duas cantoras decisivas na minha formação musical. Até porque são mais intérpretes do que cantoras, no sentido de entender o canto, de se apropriar do texto para fazer a canção”.
A preparação para o show que nasce hoje vem de cinco anos atrás, quando Alaíde esteve no Recife pela última vez. “Pensamos em comemorar nossos aniversários, no Recife ou São Paulo. Decidimos que seria aqui. Queremos viajar e gravar um álbum em cima desse repertório”. Gonzaga e Alaíde se apresentam com banda de três músicos: Alex Sobreira (violão, arranjos e direção musical), Adilson Bandeira (sax e clarinete) e Tomás Melo (percussão).
Entre os momentos especiais do reencontro, está Estrada do Sertão, composição de João Pernambuco e Hermínio Belo de Carvalho, que será cantada em dueto. “Quando comecei minha carreira queria gravar Estrada do Sertão, mas descobri que Alaíde já a havia gravado. Quando ouvi a música, desisti”, diz Gonzaga. Agora, o círculo se fecha.
A intensidade de Alaíde no palco se aproxima não só de Dolores Duran e Elizeth Cardoso, como com divas da música negra norte-americana. “Gosto muito de Sarah Vaughan e Billie Holiday, mas se há uma ligação, é intuitiva, não consciente”. Das novas vozes da MPB, prefere não emitir opinião. “Nem sempre sei quem está cantando. Na época em que comecei, dava para identificar imediatamente. Agora ficou meio difícil”.
(Diario de Pernambuco, 03/12/2011)
quinta-feira, 1 de dezembro de 2011
Um brinde ao que interessa
Lars Von Trier, Terrence Malick, Pedro Almodóvar. 2011 foi um belo ano para o cinema. A partir de amanhã, a Expectativa / Retrospectiva promovida pelo Cinema da Fundação passa a limpo o que de melhor esteve em cartaz e antecipa filmes inéditos na cidade, ou no Brasil. A combinação é poderosa. São 15 dias de evento, quase 40 filmes, entre longas e curtas. Algumas sessões são mais imperdíveis do que outras, por exemplo, a do novo Eduardo Coutinho, As canções. Ou a de três recentes provas de renovação criativa no cinema brasileiro, que tiveram boa circulação em festivais internacional: o paulista Trabalhar cansa e os mineiros Os residentes e O céu sobre os ombros.
“A essência do evento é chamar atenção para o que virá e o para o que passou de bom durante o ano. É mais uma oportunidade para ver ou rever filmes que valem a pena”, explica Luiz Joaquim, que divide com Kleber Mendonça Filho o ofício de programar o Cinema da Fundação. Ele conta que o evento começou em 1998, no início da atual gestão da sala. “Era somente retrospectiva, com 14 filmes. Em 1999, foram 24. Em 2000, começamos a trazer filmes que iriam estrear . Em 2001, mais da metade era novidade”. Dos longas deste ano, 19 são inéditos e 11 já foram vistos na cidade. Melancolia, de Trier, é o filme mais visto do ano no Cinema da Fundação.
Amanhã, são três bons motivos para ir ao cinema: Meia-noite em Paris, o maior sucesso de Woody Allen no Brasil; o iraniano Isto não é um filme, feito durante a prisão domiciliar de Jafar Panahi, um manifesto metalinguístico sobre liberdade e também uma aula de cinema; e Triângulo amoroso, novo longa de Tom Tykwer, que em 1998 renovou o cinema alemão com Lola rennt (Corra, Lola, corra).
Dos diretores de outros estados, apenas Sérgio Borges (O céu sobre os ombros) estará presente. Coutinho foi convidado, mas a sessão coincide com a estreia de As canções, no Rio e São Paulo. Fica para a próxima. Dos realizadores locais, apenas Renata Pinheiro e Sérgio Oliveira (Praça Walt Disney) não estarão, pois viajam para o Festival de Havana. O curta será exibido na quinta-feira, dia 8, junto com Ela morava na frente do cinema, de Leonardo Lacca e [projetotorresgemeas], de autoria coletiva. A primeira leva de pernambucanos virá na terça-feira (6): Di Melo - o imorrível, de Alan Oliveira e Rubens Pássaro; Corpo presente, de Marcelo Pedroso; e Mens sana in corpore sano, de Juliano Dornelles.
Mas o que une obras tão díspares como os hollywoodianos Super 8 e Planeta dos macacos, com o drama alemão sobre integrantes do grupo de Baader Meinhof, Se não nós quem?, videoclipes do R.E.M., e os recentes curtas locais? Joaquim explica que o critério é o respeito à diversidade do cinema. “Se for interessante, a gente coloca”.
Programa
sexta, 2 dez
17h30 - Meia-noite em Paris
19h30 - Isto não é um filme
21h10 - Triângulo amoroso
sábado, 3 dez
17h - A árvore da vida
19h50 - O porto
21h40 - Amores imaginários
domingo, 4 dez
16h20 - Late bloomers: o amor não tem fim
18h20 - Se não nós, quem?
20h50 - Isto não é um filme
segunda, 5 dez
17h - Medianeras
19h - Hermilo no Grande Teatro do Mundo
21h - Melancolia
terça, 6 dez
17h - Amores Imaginários
19h - O planeta dos macacos
21h - Curtas PE 1 (debate)
quarta, 7 dez
17h10 - R.E.M
18h50 - Super 8
21h - Balada do amor e do ódio
quinta, 8 dez
16h30 - O porto
18h30 - Trabalhar cansa
20h30 - Curtas PE 2 (debate)
sexta, 9 dez
15h50 - Balada do amor e do ódio
18h - Super 8
20h10 - O último dançarino
sábado, 10 dez
16h40 - Criança da meia-noite
18h50 - As canções
20h40 - O porto
domingo, 11 dez
16h - Caminho para o nada
18h20 - Adeus o primeiro amor
20h30 - As canções
segunda, 12 dez
15h50 - Lola
18h10 - Uma doce mentira
20h20 - A criança da meia-noite
terça, 13 dez
18h40 - Mulher à tarde
20h30 - O céu sobre os ombros
quarta, 14 dez
17h10 - Melancolia
19h40 - Trabalhar cansa
quinta, 15 dez
17h20 - Árvore da vida
20h - Porta a porta (debate)
sexta, 16 dez
16h20 - Medianeras
18h10 - A pele que habito
20h30 - Conto chinês
sábado, 17 dez
17h10 - Conto chinês
19h - O moinho e a cruz
20h50 - Isto não é um filme
(Diario de Pernambuco, 01/12/2011)
terça-feira, 29 de novembro de 2011
A mordida do vampiro
Tem sido cada vez mais recorrente o circuito de exibição brasileiro ter metade das salas ocupadas por um único filme. Somente este ano, tivemos três: em abril, o desenho Rio, de Carlos Saldanha, estreou em 1.024 salas; o último Harry Potter, 915; agora, assistimos à quarta sequência da saga Crepúsculo, Amanhecer - Parte 1, chegar a 1.100 salas do país. Além da onipresença, o blockbuster se tornou a maior abertura da história brasileira - somente no primeiro fim de semana, 1,721 milhão de pessoas assistiram ao romance dos vampiros.
É sem dúvida uma relação bem sucedida entre distribuidores, exibidores e público. No entanto, se duas produções do mesmo porte forem lançadas ao mesmo tempo, teremos de 2.225 salas exibindo dois filmes. No mínimo, uma anomalia. Seria esta uma prática de mercado razoável, ou uma ocupação vampiresca?
Daqui por diante, o parque exibidor receberá lançamentos cada vez maiores e por menos tempo em cartaz. É a forma encontrada pela indústria para obter lucro máximo e driblar a pirataria. Talvez por isso, nos Estados Unidos, a queda na bilheteria de Amanhecer foi de 76% entre as duas primeiras semanas, a maior entre todos os filmes da série. Enquanto alguns comemoram, outros setores reagem. Em seu blog, a Associação Brasileira dos Críticos de Cinema (www.abraccine.wordpress.com) publicou uma série sob o título “O Crepúsculo do circuito brasileiro”.
Luiz Zanin, crítico do Estadão e presidente da Abraccine, diz que a Argentina cobra imposto progressivo sobre megalançamentos. Aos defensores da não-regulamentação, pergunta: “Não se dão conta de que uma ocupação militar do mercado, como essa, é que é o verdadeiro atentado à livre circulação das (outras) obras?”
Programador do Cinema da Fundação, Kleber Mendonça Filho lembra do modelo francês, que direciona parte das grandes bilheterias para o cinema nacional. “A ideia é tão boa que não vejo sendo usada no Brasil. Imagine, todos torcendo para Amanhecer deixar R$ 40 milhões para a produção local”. Enquanto os vampiros invadiam o circuito comercial, o Cinema da Fundação colocou em cartaz três filmes nacionais, ao mesmo tempo. A partir de sexta, serão 40 produções em dez dias, na Retrospectiva 2011/Expectativa 2012.
“Claro que nunca é bom metade da nação ser coberta por um único filme”, avalia Kleber. “O público pode até gostar, mas o efeito é o de uma escola onde as pessoas são direcionadas para determinada visão de mundo. É como decretar que todo o país vai comer McDonald’s. Do ponto de vista da cultura, não é nada saudável. Mas pode parecer ingenuidade pensar em cultura quando o que existe é o mercado”.
Doutor em sociologia, o professor da UEPB Luciano Albino diz que Hollywood está monopolizando um mercado cada vez maior e ao mesmo tempo, reduzido para a concorrência. “É assim em outros setores da economia, como o automobilístico. Grandes empresas controlam o mercado. Junto com esses produtos está se consumindo uma carga simbólica, um indissociável padrão ideológico. Concorrer com esse padrão é complicado. Mais fácil é juntar-se a ele, como a Globo vem fazendo”.
São pontos estratégicos, que apontam para questões de supremacia. Será que o público de fato escolhe o que vai assistir no cinema? Responde o pensador francês Jean Baudrillard: “a liberdade e a soberania do consumidor não passam de mistificação”.
Blockbusters como aliados?
No mercado há 30 anos, o programador dos complexos UCI Ribeiro Pedro Pinheiro diz que não é comum um filme atrair tanto público fora do período de férias ou feriado prolongado. Ao contrário dos críticos, ele vê os blockbusters como aliados dos demais filmes. “Eles subsidiam os demais. Avatar, por exemplo, subsidiou o mercado 3D e a abertura de novas salas. Isso ajuda os filmes que virão depois. Este ano, Woody Allen bateu recorde de público porque havia mais salas, para ele e para os filmes nacionais. Um bom exemplo é O palhaço, que entrou em 500 salas e fez 1 milhão de espectadores”.
Kleber Mendonça discorda. “Amanhecer traz luxo e riqueza para o mercado, mas não significa que pode ter expansão da variedade. O parque exibidor aumenta para exibir a mesma coisa. Nos anos 1990, o Recife tinha oito salas para Hollywood e nenhum espaço para outros filmes. Hoje temos 44 salas e continua a mesma coisa. Recife é cidade estranha pois tem base de cultura muito forte e o circuito continua pobre, não reflete o perfil de cultura da cidade. Mas público é como água, sempre vai achar maneira de ir atrás do que gosta”.
(Diario de Pernambuco, 29/11/2011)
segunda-feira, 28 de novembro de 2011
Cabeça na animação, raízes em Pernambuco
Um dos animadores de Happy feet 2 está no Recife. Alemão radicado na Austrália, Matthias Reiche veio à cidade por motivos bastante pessoais: sua esposa é pernambucana e o casal quer que o filho seja brasileiro. Enquanto isso, Matthias segue trabalhando com animação digital. Diz que quer conhecer a cena local e fazer contatos no Porto Digital. “Tenho visto boas animações na TV. Na Austrália isto não é tão comum”.
A Austrália tem crescido como set de cinema. Matthias cita dois grandes exemplos: Matrix e Superman. Diz que os cineastas Baz Luhrman (Moulin Rouge), Philip Noyce (Salt) e George Miller (Happy feet 1 e 2) continuam os maiores nomes do país. E Miller, por muito tempo mais conhecido como diretor da trilogia Mad Max, o mais influente do mercado de desenhos animados. Os estúdios se multiplicam. Há cinco anos, diz Matthias, era apenas um. “Hoje são quatro. Em 2012, serão oito”.
Para realizar Happy feet 2, Miller fundou seu próprio estúdio, o Dr. D, sediado em Sydney. Ano que vem, o diretor deve realizar lá seu Mad Max 4: Fury Road. Happy feet 2 foi praticamente todo feito lá, exceto a sequência inicial, em que a câmera faz um megazoom, do globo terrestre ao vale dos pinguins, e da gravação das vozes, feita em São Francisco, nos Estados Unidos. Seiscentas pessoas foram mobilizadas, de diferentes partes do mundo, sob a direção de arte de Rob Coleman, o mesmo da nova trilogia Star wars.
Durante um ano e meio, Matthias fez parte da equipe que adaptou o movimento de dançarinos de carne e osso para a reduzida estrutura física dos pinguins digitais e transferiu os personagens para diferentes pontos do quadro. “Como editor de animação, recebo o script com os diálogos e as indicações de movimento e preciso tornar crível, fazer o público acreditar que eles não são feitos por humanos, mas por um pinguim”. Com 30 pessoas, a equipe processou cerca de 900 cenas.
São imagens produzidas em escala industrial, onde pouco se vê da mão dos trabalhadores. Mesmo sem tanta liberdade criativa, Matthias conseguiu emplacar detalhes fora do roteiro, como um pinguim bebê que consegue escapar de ser “atropelado” por um Leão Marinho. “O diretor achou engraçado e decidiu manter. Como em qualquer fábrica, são pequenos momentos de diversão”.
Mensagem duvidosa - Happy feet 2 se passa no gelo da Antártida e foi produzido por um estúdio australiano. No entanto é um típico produto norte-americano, que nos últimos anos vem alimentando certa obsessão por pinguins. Em 2006, quando surgiu o desenho que deu origem a esta sequência, já havia Madagascar, que gerou sua própria leva de pinguins. E, um ano antes, o documentário francês A marcha dos pinguins já quebrava recordes de bilheteria. Este ano, antes da volta dos aves dançarinas, Jim Carrey foi ofuscado por outras, em Os pinguins do papai.
Com efeitos realistas, Happy feet 2 é uma bela incursão ao Polo Sul em 3D. A naturalidade dos movimentos se soma a detalhes impressionantes. Há bonitas sequências de dança, que parodiam as produzidas pela indústria de entretenimento. Numa delas, encontramos os felizes pinguins-imperadores, até que uma geleira isola o vale e os impedem de buscar comida.
Cabe a Mano (voz original de Elijah Wood, no Brasil, de Daniel Oliveira), agora um pinguim crescido, seu filho Erik (Yago Machado) e seus primos e amigos Ramon (Robin Williams/Guilherme Briggs) e Amoroso (Robin Williams/Sidney Magal) salvarem a pátria. Incompreendido por não querer dançar como todos, Erik foge e, incentivado por um estranho pinguim voador e de bico colorido, está determinado a voar também. O pai vai buscá-lo de volta, mas a relação está comprometida.
Paira em Happy feet 2 um discurso moral duvidoso, já encontrado em outros desenhos, como Toy story 3. A estratégia não vem de hoje. Vendido como diversão para a família e munido de efeitos digitais impressionantes, os bichinhos reproduzem o modo de vida, valores e padrões da sociedade de consumo.
A sensação de ser diferente e buscar o desconhecido ou desejar o inalcançável são vistos não como legítimos, mas como desvarios da juventude. Ou alucinações, como a do camarão que adquire consciência e desvia do grupo para descobrir que sua espécie não passa de comida para peixes. O mundo é um lugar inóspito para quem ousa ficar longe da asa da mãe, a não ser quando extremamente necessário. Aí, o perigo se torna desafio. Os desviados logo aprendem a lição: assumir “quem você é” e aceitar aqueles que o reconhecem como tal. Estes estão livres para dançar, em alegre conformismo.
(Diario de Pernambuco, 28/11/2011)
domingo, 27 de novembro de 2011
Filme que vale uma vida
George Harrison não foi somente o “Beatle quieto”. Dos quatro, era o que mais evitava contato visual. E quando o fazia, revelava um olhar misterioso. Na sequência inicial do documentário Living in material world, oculto por flores, ele mira a câmera. É justamente essa a imagem que convenceu Martin Scorsese a dirigir a produção, a convite da viúva do músico. Apesar de recluso e discreto, Harrison queria dirigir o filme da vida dele, mas faleceu antes disso. Após assistir No direction home, sobre a vida e obra de Bob Dylan, Olivia Harrison decidiu confiar o material ao cineasta.
O resultado é uma incursão em imagens de arquivo e depoimentos tão longo e instigante quanto a feita com Dylan. Há inclusive o momento Like a Rolling Stone, em que Scorsese reconstrói o contexto até que explode no áudio a canção mais conhecida de Harrison (sem os Beatles), My sweet lord. É o ponto culminante, síntese dos mundos que ajudou a conciliar, o da cultura pop com o do movimento Hare Krishna. À época, tanto a música quanto o álbum triplo All things must pass (1970), foram ao topo das paradas.
Depoimentos de amigos e familiares ajudam a entender a busca artística e espiritual do músico. Inicialmente tímido perante as personalidades desenvoltas de John, Paul e Ringo, o talento de George fluiu aos poucos, em composições cada vez mais elaboradas. Ele tinha apenas 15 anos quando John e Paul o chamaram para o The Quarrymen, mas depois da temporada na Índia e a amizade com Ravi Shankar, ninguém mais o via como o caçula.
Isso fica claro quando os Beatles estão mais próximos do fim. Nas sessões do Álbum branco, conta George, como ninguém levou a sério While my guitar gently weeps, ele convidou Eric Clapton, no que se tornou a primeira interferência externa na banda. Na mesma época, quando Ringo se sente preterido e resolve sair, ele decora o estúdio com flores, e o baterista fica. Em Abbey road, como se sabe, foi generoso e se despediu com Something e Here comes the sun, as duas melhores canções do álbum.
Momentos controversos não são evitados por Scorsese. Ao tratar do episódio em que perdeu a esposa para Clapton, o diretor ouviu o guitarrista. “Quando disse que estava apaixonado por Patty, ele disse: ‘fique com ela’”. Ele ficou e, disse Clapton, George se enfureceu.
Terry Gilliam e Eric Idle, do grupo Monty Phyton, também deram depoimentos interessantes. No fim dos anos 1970, George se envolve na produção de dois filmes do grupo de comediantes anarquistas: The Rutles: all you need is cash (ácida paródia dos Beatles) e A vida de Brian, pelo qual penhorou a casa para completar o orçamento. Conta Idle que no lançamento dos Rutles, os Pythons confundiram muita gente ao se passar pelos próprios Beatles. George estava lá, mas passou despercebido.
Talvez fosse isso o que sempre quis, ficar longe dos holofotes. Dizer que estar no topo do showbiz e desfrutar da fama não passam de ilusões do mundo material. Sua música, não. Esta permanece.
(Diario de Pernambuco, 27/11/2011)
sábado, 26 de novembro de 2011
Da palavra à imagem
O escritor paulista Marçal Aquino está no Recife. O motivo é dos melhores, uma conversa sobre cinema e literatura. Quem promove é a 2ª Mostra Sesc de Literatura Contemporânea. O evento será hoje, às 19h, no salão de eventos do Sesc Santa Rita, com entrada franca. Autor de 13 livros e dezenas de roteiros para cinema e TV, Marçal esteve na cidade pela última vez em 2009, a convite da Bienal do Livro. Agora volta para tratar de questões relativas à adaptação da palavra à imagem. Entre os escritores brasileiros, é o mais tarimbado no assunto. E um dos poucos que adaptam o próprio trabalho para o cinema.
Seu currículo inclui os roteiros de todos os filmes de Beto Brant (Os matadores, Ação entre amigos, O invasor, Crime delicado e o recente Eu receberia as piores notícias dos seus lindos lábios), além de Nina e O cheiro do ralo, de Heitor Dhalia. Para a TV, é responsável (com Fernando Bonassi) pelo seriado global Força-tarefa. A parceria deu certo. Já preparam outra série policial, que estreia ano que vem.
Formado em jornalismo - daí a familiaridade com o mundo cão e situações limite, Marçal não vê conflito entre as atividades. Diz que sua prioridade sempre foi a literatura. “É a minha casa. Me preparei para isso a vida inteira, é efetivamente o que gosto de fazer. Os roteiros são meu ganha-pão. Não fosse isso, estaria trabalhando em alguma redação”.
Marçal diz que, a não ser como espectador, nunca quis nada com o cinema. Entrou por acaso. “Em matéria de atividade economicamente inviável, já basta a literatura”, brinca. “Enquanto Beto filmava Os matadores, encontraram dificuldade na adaptação e eu disse o que faria se fosse o roteirista. Não tinha experiência nenhuma, só um curso na faculdade”.
A sintonia com Beto Brant, de quem não se diz roteirista, mas “parceiro de aventuras cinematográficas”, vem de um pouco antes. “Ele quis adaptar um livro meu. Não deu certo, mas nos aproximamos e estabelecemos uma relação de amizade. Ele é muito afetado pela literatura, todos os filmes dele têm base literária. Meu trabalho é criar condições para que ele realize o seu trabalho”.
Como cinéfilo, usa o pouco tempo livre para assistir à produção sul-coreana. “No momento, na minha opinião, ninguém faz cinema como eles”. Não são violentos demais? “Não tanto quanto Sam Peckimpah (Meu ódio será tua herança) ou Gaspar Noé (Irreversível). O que me atrai neles é a próximidade à história em quadrinhos”.
E é justamente pelos quadrinhos, sua primeira paixão, que se explica a força imagética da prosa de Marçal. “Dizem que minha ‘literatura visual’ tem a ver com o trabalho como roteirista, mas meu primeiro impulso artístico vem dos quadrinhos, que é o cinema estático. Já cheguei a desenhar, mas hoje sou só leitor. Meu trabalho é a palavra”.
Atualmente, além de trabalhar para a Globo, o escritor se dedica ao próximo livro, Como se o mundo fosse um bom lugar. Sobre ele, nem uma palavra. “Decidi não falar sobre o que está sendo feito. Não é superstição. Vou descobrindo o livro na medida em que escrevo. Quanto mais certezas eu tiver, pior”.
(Diario de Pernambuco, 26/11/2011)
sexta-feira, 25 de novembro de 2011
Cinema, cidade e solidão
O cinema independente tem sido pródigo ao refletir sobre a desordem urbana das grandes cidades. A produção argentina Medianeras - Buenos Aires na era do amor virtual, de Gustavo Taretto, é uma bela investigação de como o tema incide nas relações e subjetividades que produzem o sentimento de estar só, mesmo na multidão. A boa carreira em festivais (somente em Gramado, foram três prêmios principais) contribuiu para que o filme chegasse ao circuito nacional. No Recife, conseguiu janela na programação do Cine Rosa e Silva, programada por Carol Ferreira.
Medianeras é mais uma prova da vitalidade do cinema argentino contemporâneo. A sequência inicial deflagra recortes da paisagem urbana de Buenos Aires, em instigante montagem costurada pela voz do protagonista (Javier Drolas), jovem webmaster de tendências depressivas e que passa 99% da sua vida na internet. Ele chama atenção para as “irregularidades éticas e estéticas” da cidade, que se expande “sem planejamento, como nossas vidas”.
Medianera, o próprio filme explica, é a parede sem janelas dos edifícios, geralmente mofadas ou usadas como outdoor publicitário. Em um desses prédios está a arquiteta vivida por Pilar Lopez de Ayala (a bela falecida de O estranho caso de Angélica, de Manoel de Oliveira), arquiteta recém-separada que tenta se readaptar à casa em que morou há quatro anos. O exercício de “procurar beleza onde não existe”, nas medianeras, levará ao encontro, à religação?
Uma sequência em desenho animado, referências diretas a Onde está Wally?, e o espírito de melancolia pop fazem do filme uma ode à juventude viciada no mundo online - e pouco à vontade fora dele. No entanto, a maior influência do filme está em Woody Allen, assumida quando uma sequência inteira de Manhattan (1979) preenche a tela. Buenos Aires não é Nova York. Mas para o cinema, isso é o que menos importa.
(Diario de Pernambuco, 25/11/11)
quarta-feira, 23 de novembro de 2011
Divertida viagem no tempo
Guitarrista Kid Andersen e Rick Estrin, no palco de Garanhuns
Rick Estrin & The Nightcats estão de volta. Acabaram de chegar de Buenos Aires para apenas duas apresentações no Brasil. Em março passado, eles foram a principal atração do Garanhuns Jazz Festival, onde fizeram um dos shows mais divertidos do ano. Agora é a vez do Recife, onde tocam hoje, às 22h, no encerramento do Oi Blues by Night 2011, no Spirit Music Hall (Rua do Futuro, 821. Fone: 3241-9446).
O que se verá hoje é coisa rara por aqui. Geralmente, os “bluseiros” norte-americanos tocam no país acompanhados por músicos brasileiros, nunca a banda completa. No grupo desde sua formação, em 1976, Rick Estrin lidera os Nightcats desde 2008, quando o guitarrista Little Charlie se aposentou. Em seu lugar está o prodígio Kid Andersen. Completam a banda Lorenzo Farrel (baixo e teclado) e J. Hansen (bateria).
Nascido em 1950, em San Francisco, ao contrário de seus colegas, o então adolescente Estrin não se envolvia com a música de Jimi Hendrix, Janis Joplin e Jefferson Airplane. “Os primeiros shows que me emocionaram foram de Muddy Waters, Buddy Guy e Howlin’ Wolf. Decidi me mudar para Chicago, onde fui chamado para tocar por Lowell Fulson (um dos principais nomes do blues dos anos 1940-50)”, diz. Ainda nos anos 1970, Estrin tocou com Muddy Waters, até que com Little Charlie fundou o Nightcats. Após 30 anos de carreira, o que o mantém na estrada? “Estou muito velho para o crime”, brinca.
Ao ouvir o álbum Twisted, lançado pela conceituada Alligator Records, fica evidente o talento de Estrin como compositor, cantor e músico (ele toca gaita diatônica e cromática). Ao vivo, a experiência se completa com a força da performance. Seu show é um bem-humorado passeio pelos diferentes estilos de blues e rock dos anos 1950. Apesar do blues ter nascido do lamento negro nos campos de algodão, Estrin acredita que também é alegria: “blues é vida, e como tal, alcança todas as experiências humanas. Alegre ou triste, ele faz as pessoas se sentirem melhor”.
Com seu topete aerodinâmico, óculos e bigodinho, Estrin é antes de tudo um entertainer, e como tal, criou um personagem para si (chega a tocar com a gaita dentro da boca) e é respeitado por gaitistas de todo o mundo, como Flávio Guimarães, produtor da turnê latino-americana do grupo. Antes do show, Guimarães se apresenta com a Uptown Band e a Handmade Blues Band faz show acústico. Ingresso: R$ 30 (homem) e R$ 20 (mulher).
(Diario de Pernambuco, 23/11/2011)
terça-feira, 22 de novembro de 2011
Fascinante técnica de animação
O Recife comporta um novo festival de cinema? Sim, o Brasil Stop Motion. É o primeiro e único evento do país e um dos poucos do mundo dedicado à essa técnica de animação tão antiga quanto o cinema. A programação traz filmes do mundo todo e começa hoje, às 19h30, no Cinema São Luiz, com homenagem ao artista uruguaio Walter Tournier, que vem à cidade apresentar uma mostra de oito curtas. E termina no sábado, com cerimônia de premiação e exibição do curta pernambucano Dia estrelado, de Nara Normande.
“A produção de Pernambuco chegou a um nível de complexidade que se reflete no panorama de eventos. Se por um lado temos grandes festivais como o Cine PE e o Janela Internacional de Cinema, é importante ter espaço para nichos específicos”, diz Paulo Cunha, organizador do festival, ao lado de Ana Farache e Clara Angélica.
Hoje, outra mostra especial traz dois títulos do estúdio polonês Se-Ma-For, duas vezes vencedor do Oscar de melhor curta de animação. Amanhã, é a vez da OQO, da Galícia (Espanha), e do início da mostra competitiva, com 51 animações. Pelo menos um programa, intitulado Narrativas do Medo (na próxima quinta), é proibido para menores. Nele está a animação belga As gêmeas da Rua Sunset, tenebrosa fábula às avessas sobre gente que come criancinhas.
Na quarta, se destacam dois trabalhos do holandês Johan Rijpma. Em Tegels, ele fotografa milhares de lajotas das calçadas para simular movimento. E Tape generations experimenta o mesmo com rolos de fita adesiva. No mesmo programa, Fábio Yamaji (O divino, de repente) apresenta O planeta dos boi-peixes, que com apenas um minuto de duração revisita o clássico Planeta dos macacos.
Na sexta, cinco produções pernambucanas serão exibidas, destaque para o inédito Lol fight, de Alan Tonello, livre apropriação do girl power de Tarantino em Kill Bill. E Brecha, de Júlia Araújo e Nathália D’Emery, uma bem-humorada subversão da sexualidade dos bonecos Barbie e Ken.
Além de Tournier, o Uruguai está representado pela diretora, artista plástica e ilustradora Laura Severi, que, às 10h de hoje, faz palestra na Unicap (Boa Vista).
Com orçamento de R$ 47 mil, é uma façanha um evento render tantas atividades. Patrocinado pelo Funcultura, o Brasil Stop Motion está sendo viabilizado com apenas um terço do montante proposto à Fundarpe. “Como esta é a primeira edição, o orçamento atravessou o teto estabelecido pelo edital”, conta Clara Angélica, que buscou apoio com as prefeituras do Recife e Olinda, além da iniciativa privada.
(Diario de Pernambuco, 22/11/2011)
sexta-feira, 18 de novembro de 2011
Canavial expande fronteiras
Otto e Quinteto Violado em Vicência. Chico César e Silvério Pessoa em Nazaré da Mata. Tribo de Jah em Goiana. Estas são apenas os nomes principais do Festival Canavial 2011, que pela primeira vez cruza as fronteiras da região da Zona da Mata e se envereda pelo Sítio Histórico de Olinda e João Pessoa, na Paraíba. Nos próximos 23 dias, o evento traz mais de 60 atrações para oito cidades, com entrada franca.
A programação começa hoje, em Vicência, com o seminário Celebração da Consciência Negra - Matriz Africana e Brasilidade e apresentação da Orquestra 15 de Novembro. Será às 14h, no Ponto de Cultura Poço Comprido. A etapa em Goiana começa amanhã e traz, a partir das 19h Nova Goiana, o Caboclinho Tapuia Canindé, Sete Flexas, Pretinhas do Congo e Coco da Yá.
No último fim de semana, dias 10 (Olinda) e 11 de dezembro (João Pessoa), a atração principal será a dupla Jorge Mautner e Nelson Jacobina, que apresenta o show Maracatu Atômico – Kaosnavial com Afonjah, Mestre Zé Duda e o Maracatu Estrela de Ouro. Além do show, haverá a estreia do filme Maracatu Atômico – Kaosnavial, dirigido por Afonso Oliveira e Marcelo Pedroso, da Símio Filmes.
Além do rol de ilustres visitantes, o Festival Canavial reúne boa parte dos artistas sediados na Zona Mata, a saber: Ticuqueiros, João Limoeiro, Italo Pay e a Zabumba Mundi, Toadas de Pernambuco, Cavalo Marinho Mestre Batista, entre outros. Em Tracunhaém (dias 5 e 6), por exemplo, além da programação de shows, haverá oficina de ciranda com o Mestre Genivaldo, da Ciranda Girassol do Amor (Condado).
Outra novidade da edição 2011 é que a programação de cinema cresceu e se tornou um evento autônomo, a Mostra Canavial de Cinema (leia matéria na página 2). Isso não exclui as sessões do cineclube Cinemata, marcadas para os dias 19 e 20, em Vicência. Programação completa no site www.festivalcanavial.com.br.
Curtas-metragens no canavial - Começa amanhã a Mostra Canavial de Cinema, o primeiro evento do gênero sediado na Zona da Mata Norte pernambucana. Durante os próximos nove dias, onze curta-metragens serão exibidos em seis cidades: Goiana, Condado, Tracunhaém, Nazaré da Mata, Vicência e Aliança. A entrada é franca.
“Queremos trazer algo para a Zona da Mata que não seja televisão. Apresentar novas possibilidades. Tenho certeza maioria do público nunca foi ao cinema”, justifica o coordenador da mostra, Caio Dornelas. Sobre a seleção, ele explica que o relevante não é se são filmes da nova safra, mas o conteúdo que eles representam. “Alguns são de 2003, mas continuam inéditos na Zona da Mata”.
Mais do que exibir, a ideia é promover a troca de ideias e estimular a cadeia produtiva regional a curto, médio e longo prazo. Como pontapé inicial, foi organizado o 1º Seminário Arranjo Produtivo Local em Audiovisual na Mata Norte, que reúne produtores independentes, representantes de Pontos de Cultura, entidades do audiovisual, técnicos, gestores públicos e ativistas. O cunho político é explícito. “Da mesma forma que, em nível nacional, os recursos estão concentrados no eixo Rio-SP, em Pernambuco eles estão na capital. Vamos olhar para essa dicotomia e fazer uma autorreflexão. Os recursos existem e sua distribuição é teoricamente democrática. Precisamos acelerar esse processo”.
Outra boa notícia trazida pelo evento é a reocupação do Cineteatro Polytheama, restaurado pelo governo do estado e gerido pela prefeitura de Goiana. “O governo reformou e a prefeitura tomou pra ela”, critica Dornelas, com razão. Atualmente, apesar de contar com um projetor digital Rain, o espaço é ocupado por diferentes atividades, menos a exibição de filmes. “O cineclube funcionou lá por seis meses, todos os domingos, mas a prefeitura determinou que não pode funcionar nos fins de semana. Agora estamos exibindo no terreiro de Mãe Nininha (bairro do Mutirão)”.
Realizado com R$ 67 mil captados pelo edital do Funcultura/Fundarpe, além de apoios das prefeituras envolvidas e investimento próprio, a Mostra Canavial surgiu a partir da demanda percebida por Dornelas nas cidades em que esteve como oficineiro da Federação Pernambucana de Cineclubes. “Boa parte demandas são as mesmas”, conta. “O problema da exibição foi minimizado pela proliferação de cineclubes (são dez, em 19 cidades da Mata Norte), mas faltam estratégias de distribuição e formação continuada. A produção existe, mas apenas de forma empírica”.
(Diario de Pernambuco, 18/11/2011)
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