sábado, 3 de abril de 2010

Cinema entre o luto e a moda



Uma história de amor forjada com imagens impecáveis marca a estreia do estilista Tom Ford no cinema. Pois antes de tudo, Direito de amar (A single man, EUA, 2009) seduz pela plástica, capaz de reconstruir os anos 1960 em termos de moda e design.

Em cores que oscilam entre o "lavado" (quase preto-e-branco) e a saturação over, que torna a pele um pigmento cor-de-rosa. Nada é gratuito ou fora de propósito, já que assim o filme assume a subjetividade do personagem principal, George (Colin Firth), professor de literatura acima da média que, segundo a melhor amiga, Charley (Juliane Moore) poderia lecionar em Berkerley, mas prefere a vida discreta em Los Angeles, onde há 15 anos vive com o namorado Jim (Matthew Goode).

Destino cruel, Jim morre subitamente, em acidente de carro. Por telefone, George é informado da tragédia e pior, de que seria melhor não comparecer ao enterro, a pedido da família. Se emocionalmente a condição de George está no limite do colapso, externamente ele mantém a aparência organizada, correta e afável com alunos e colegas de trabalho. Reserva a dura sinceridade para Charley, frívola bonequinha de meia-idade, com quem na juventude viveu um affair.

Ao mesmo tempo em que elabora luto em suspense de mórbida precisão (há uma sequência na frente de painel de Psicose, bela homenagem a Hitchcock), George procura em vão o amor perdido. Parte de seu olhar transtornado se reserva à beleza das mulheres ao redor. Outra não resiste a garotos com cheiro de fralda, que parecem ter saído de um ensaio erótico. Eles se oferecem mais de uma vez, todos recusados. Distante da promiscuidade sexual, George representa a parcela de gays intelectuais românticos, que preferem o casamento à vida profana.

Indicado ao Oscar, Colin Firth é a alma de um filme visualmente artificial. E o contraste entre ele e a família "normal" da casa ao lado é um dos bons caminhos abertos por Ford. De outra forma, Direito de amar estaria mais para luxuoso catálogo de moda do que para cinema.

(Diario de Pernambuco, 03/04/2010)

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