sábado, 10 de abril de 2010

O punk não morreu



Vítima de câncer, o empresário e músico Malcolm McLaren morreu na última quinta-feira, aos 64 anos. Nascido na Escócia, ele passou o último ano na Suíça, onde se tratava da doença. Cérebro por trás do Sex Pistols, desde o início ele mostrou tino para captar o espírito da época e transformar atitude em bom negócio. Se com personagens impactantes, como Sid Vicious e Johnny Rotten, ele criou a "cara" do movimento punk, ao mesmo tempo o tornou algo fake, um produto pronto para ser consumido. Por isso, apesar de ser elemento central na gênese do punk, adeptos mais radicais do movimento não hesitariam em incluí-lo na categoria "porco capitalista".

Mas a carreira de McLaren foi muito maior que o punk. Anos antes, ele deixou sua marca no glitter, ao lançar o visual do grupo New York Dolls; nos anos 80, convidou o então desconhecido Boy George para participar de seu grupo, Bow Wow Wow (do qual George saiu para fundar o Culture Club); e, em 1989, sua música Deep in vogue serviu de influência para Madonna e toda uma cultura de dança nas pistas.

"Ele é uma das figuras mais importantes da cultura nos últimos 50 anos. Como revolucionário, claro que foi um personagem controverso. Mas sem McLaren não existiria o punk, que aliou diversão com reflexão crítica e veio alterar toda a cultura pop", diz Renato L, secretário de cultura do Recife e um dos articuladores do manguebeat. "Nos início dos anos 90, a gente sonhava em lançar bandas, como fez Malcolm McLaren. Lembro que ouvíamos muito um de seus discos, Duck rock (1983), que antecipou a explosão do hip hop, da world music."

"Em termos de cultura pop, ele foi um visionário. Somou a música pré-punk ao discurso ideológico e embalou o negócio para vender. Tudo foi tão pensado que o disco de estreia dos Sex Pistols foi lançado pela EMI", diz Paulo André Pires. A gana pelos lucros gerados pela marca Sex Pistols foi tanta que, em 1980, John Lydon, líder da banda, entrou com um processo contra McLaren, vencido sete anos depois. Empresário de várias bandas e organizador do Abril Pro Rock, Pires vê na postura de McLaren algo equivalente à postura de donos de grupos de forró "fuleragem", que mandam no nome, figurino e coreografia de seus integrantes. E foi mais ou menos por aí que a banda definidora do punk nasceu. O nome Sex Pistols veio da loja sado-masô Sex, que McLaren e Vivianne Westwood mantinham em Londres. O som, da música novaiorquina, como os Ramones; e a atitude anarquista é fruto do movimento operário inglês dos anos 70. O personagem Johnny Rotten, nome artístico de Lydon, é invenção do empresário.

Para o estilista Ronaldo Fraga, McLaren enxergava a música em termos de imagem e estilo. "Foi-se Malcolm, ficam suas criações. Curiosamente, o que causava choque na época, hoje é mainstream, a ponto de estar no Big Brother, como o corte de cabelo moicano".

"Acho que ele foi um grande captador de tendências, do que já estava nas ruas. Era sarcástico, irônico, fazia arte para provocar as pessoas. É verdade que mexia muito com a estética, mas ali tinha umbackground ideológico. Quando ele usou símbolos comunistas, isso vinha mais como provocação anárquica que literalmente comunista", diz o músico Johnny Hooker. "É uma grande bobagem pensar que ele preferia a imagem à música. Cada artista tem a liberdade de ser mais visual ou musical, uma coisa não diminui a outra. Quando criou os Sex Pistols, ele acreditava que o rock tinha morrido e aquele era o grito final, que Never mind the bollocks seria o último disco de rock'n'roll".

Em nota oficial, publicada anteontem em seu site, John Lydon reconhece o trabalho do antigo empresário. "Para mim, Malc sempre foi divertido e espero que se lembrem disso. Acima de tudo, ele era um entertainer e sentirei saudades dele", escreveu Lydon, ao que assina: Johnny Rotten.

(Diario de Pernambuco, 10/04/2010)

Um comentário:

Anônimo disse...

linda foto!