sexta-feira, 23 de janeiro de 2009
A saga dos Silva do Brasil
Da pacata Caetés, seguindo o fluxo migratórioi para o Sudeste, saiu uma mãe acompanhada de sete filhos, um deles se tornaria mais tarde o presidente do país
André Dib // Enviado Especial
Garanhuns - O ano é 1952. Na estrada de chão batido, o motorista do pau-de-arara aguarda os passageiros se acomodarem na boléia de madeira. A lotação se faz rapidamente, com homens em busca de trabalho, uma mulher grávida e o marido, e uma mãe acompanhada de sete filhos, um deles ainda no colo. Lobo, o cão, quer se juntar ao grupo, mas acaba deixado para trás, se misturando com a poeira. A bela cena contrasta com a dureza da viagem, uma das tantas daquela época marcada pelo fluxo migratório para o Sudeste. O que ninguém poderia imaginar é que naquele grupo que enfrentou 13 dias de estrada e amargou a morte de uma menina estaria o futuro Presidente da República.
Esse é o mote de Lula - filho do Brasil, longa-metragem de Fábio Barreto que começou a ser rodado na última terça-feira, nos arredores do município de Caetés, no Agreste pernambucano, onde a equipe permanece até a tarde de hoje. Anteontem, a reportagem do Diario visitou o set da produção, montado na zona rural de Capoeiras. Frei Chico, irmão mais velho do presidente, que acompanhou as filmagens sentado ao lado do diretor, e estava visivelmente tocado pela dramatização daquele difícil momento vivido na própria pele. "Foi muito forte", disse, enquanto observava o caminhão partir. Terminada a gravação, ele fez questão de ajudar os figurantes a descer precária estrutura.
A atriz global Gloria Pires, que aqui incorpora Dona Lindú, se disse totalmente envolvida com a personagem. "Reconheço a responsabilidade que é interpretar a mãe de um presidente, mas a história de Dona Lindú simboliza as milhares de mães heroínas, que criam seus filhos mesmo com todas as dificuldades. Ao mesmo tempo, ela oferece uma ideia de vida, um exemplo de estrutura familiar muito raro, que não tem a ver com dinheiro, mas com caráter", comentou a atriz, que no dia anterior contracenava com Milhem Cortaz, que interpreta Aristides, o pai do pequeno Luiz Inácio.
Mais conhecido como o Capitão Fábio, o "número 2" do filme Tropa de Elite, Cortaz disse que impôs a si o desafio de mostrar um outro lado do pai que abandona a família em prol de outra mulher. "Estou criando o meu próprio Aristides. Tenho distanciamento para perceber que ele foi aquela pessoa dura, que abandonou a mulher e filhos, mas que também era pacato, e sentia amor pela família. Se eu for capaz de mostrar uma parte desconhecida deste pai, a ponto de criar dúvidas na própria família Silva, terei meu papel cumprido", disse o ator, que ressalta o caráter decisivo do pai para definir alguns traços de caráter de Lula, assim como seu futuro não no Agreste pernambucano, mas nas indústrias do ABC paulista.
Para entrar em contato com essas origens, o ator Rui Ricardo Dias, que será Lula na idade adulta, esteve presente nas locações. Com barba cheia e oito quilos a mais, ele disse que para compor seu personagem, ele buscou referência em filmes que retratam Lula em diferentes momentos, como ABC da greve, de Leon Hirzman, Peões, de Eduardo Coutinho e Entreatos, de João Moreira Salles.
"Não estamos preocupados em reproduzir como Lula fala ou anda, mas em como ele se sentia, quais são suas dores e alegrias. Quero me dedicar às questões emocionais, subjetivas, que acaba por revelar as atitudes objetivas. São das questões internas que nasce a verdade entre ator e personagem", revela o preparador de elenco Sérgio Penna, que com isso dá pistas de qual será a essência do longa-metragem.
Família unida nos bastidores
Matéria de capa // Clã Barreto participa de várias funções na produção de Lula o Filho do Brasil, filme orçado em R$ 12 milhões e que não terá recursos públicos
"Tem um cara de branco atrapalhando o quadro!", bradou o contra-regra. Os olhares se voltaram para o intruso, ninguém menos do que Luiz Carlos Barreto. A brincadeira com o produtor, que circulava no set como se estivesse em casa, descontraiu a equipe por alguns segundos. É possível compreender sua postura, ao mesmo tempo profissional e afetiva, pelo fato de que Lula – o filho do Brasil é basicamente um projeto tocado em família: os filhos Paula e Fábio assinam, respectivamente, produção e direção; e Lucy, a esposa, divide a produção geral com o próprio "Barretão", como é mais conhecido o patriarca.
Há também o fotógrafo Gustavo Hadba, que não tem ligações sanguineas com os Barreto, mas trabalhou em vários filmes produzidos pelo clã. Sua experiência como cinegrafista de Miguel Arraes, com quem viajou todo o estado nos anos 1980, dá segurança para a aposta na dura luz do meio-dia, com sombras e sem truques de embelezamento. "Busco a luz como ela é aqui, cruel, não-cosmética", revela.
Atenta a cada movimento estava Denise Paraná, co-roteirista e autora do livro que originou o filme. "Esta é a realização de um sonho de 18 anos. Quando comecei a pesquisa, as histórias que Lula me contava nas entrevistas com uma plasticidade tão grande que parecia um filme", contou a jornalista. Ela disse que o objetivo é reproduzir a realidade, mas com algumas licenças poéticas. "Nós queremos mostrar a formação do personagem, para que as pessoas entendam suas motivações". Durante a conversa com o Diario, ela revelou que sua próxima biografia será de Luiz Carlos Barreto, projeto em que já está trabalhando.
As filmagens em São Paulo começam neste domingo, e seguem até o fim de março, com locações na Igreja Matriz de São Bernardo no antigo Estádio da Vila Euclides, local do antológico discurso para milhares de operários. O objetivo é que o longa fique pronto em setembro, a tempo de ser exibido em pelo menos cinco países, a convite dos festivais de Toronto, San Sebastian, Roma, Latino LA (EUA) e Internacional Lima, no Peru.
Segundo a assessoria de imprensa da LC Barreto, ainda não foram divulgados os patrocinadores do filme, orçado em R$ 12 milhões, porque a captação ainda não está completa. O único consenso é que não haverá dinheiro público para que não acusem o filme de chapa branca. No entanto, inevitáveis comentários surgiram pelo o fato do lançamento no circuito comercial estar marcado para janeiro de 2010, ano de eleição presidencial.
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