segunda-feira, 24 de setembro de 2007

Shiko, o samurai dos quadrinhos



É difícil definir os desenhos e pinturas de Shiko. Sua arte desprovida de moral e bons costumes é imprevisível e prazeirosa como um solo de jazz.

A primeira vez que li sobre ele foi no site colaborativo Overmundo. Nas duas matérias (aqui e aqui) Desenhos que enchem os olhos e os textos quase reverentes, mais um acalorado e indiscreto debate nos comments, me levaram a crer que o cara deve ser mesmo uma figura.

Logo depois, minha amiga Leda me deu um toque sobre ele, elogiando bastante. Depois, outra amiga, a Rosana. A mesma coisa.

Pelo que disse naquelas matérias, ele não gosta de ser chamado de artista plástico. Mas o que dizer de quem cria com grafite, tatuagem, escultura, pintura em tela, fanzine, grafismos, animação e HQ??

Seu universo quase sempre auto-referente é um emaranhado de derivações sensoriais e perceptivas. Generalizando um pouco mais, Shiko não abre mão do sexo-drogas-rock’n’roll: amplia para jazz, literatura e cinema. Em seu fanzine, adapta contos de Albert Camus, Giovani Papinni e uma música da banda pernambucana Mundo Livre. Mulher Honesta, adaptação de um post do blog de Xico Sá, é seu projeto mais recente.

Um de seus temas conhecidos (e vendidos) é a série de telas a óleo com uma releitura erótica de Olívia Palito, a namorada de Popeye, seminua num balcão de bar.

Meses atrás Shiko publicou o que considero a melhor HQ nacional de 2007 (e olha que o ano nem terminou): Blue Note.



Projeto assinado em parceria com Biu (poeta e escitor), Blue Note conta a história de um rapaz que sai do interior paraibano (a pequena Rio Tinto, cidade natal de Biu), para se entregar à toda sorte de paixões.

Auto-proclamada "obra fonográfica", esta desconcertante "experiência emocional executada ao vivo" trata-se de uma narrativa não-linear, cuja carga poética é aditivada de referências do jazz, blues, rock e também do cinema – há cenas retiradas de Cinema, Aspirinas e Urubus.

Há também uma seqüência inteira de “Amarelo Manga, analisada com maestria pelo crítico Kléber Mendonça como "o plano detalhe do sexo feminino via saia levantada, imagem que filmada ou desenhada fecha as relações produtivamente promíscuas entre a imagem em movimento e aquela que sugere ação" (revista Continente Multicultural / setembro de 2007).

Natural de Patos, Francisco José de Souto atualmente mora em João Pessoa. Virou Shiko quando morava em Brasília trabalhando com publicidade. Lendo um mangá, ele aprendeu que shiko é a palavra que define a área de alcance de uma espada samurai. Como já havia outro Chico no mercado de lá, resolveu adotar o codinome japonês.



Na Paraíba, Shiko é talento reconhecido. Expõe em eventos de arte; teve seu Marginal Zine publicado como coletânea pela editora independente Marca de Fantasia; teve Blue Note patrocinado pelo Fundo de Incentivo à Cultura Augusto dos Anjos, mantido pelo governo da Paraíba; e está desenvolvendo um videoclipe de animação para os parceiros da Chico Correia Eletronic Band.



Fora do estado ele ainda é uma novidade, e aos poucos vai ganhando terreno. Mês de julho, Flora recebeu o prêmio de melhor HQ no concurso Alfaiataria de Fanzines; no mesmo evento, Blue Note recebeu menção honrosa na categoria publicação independente.

A seguir, uma seleção de cenas de Blue Note.

Se, como dizem seus conterrâneos, Shiko está somente começando, o que está por vir realmente deve ser de outro mundo.








6 comentários:

Luciano Blues disse...

Sou meio suspeito pra falar, mas tudo o que vai blues cai muito bem (pelo menos a mim)!

Outra coisa que me agrada é a mistura entre música e sexo (mesmo que subjetivo) que, acredito, um não vive sem o outro nos quadrinhos.

Uma pena eu não ter acesso a estes trabalhos.

Andre Dib disse...

Luciano

Uma coisa que eu esqueci de dizer é que o livro nem está à venda. Foi feito com grana da lei de incentivo estadual, e distribuído de mão em mão. Ou seja, quem pegou, pegou. Agora é esperar pra que Blue Note ou outro trabalho de Shiko saia por alguma editora nacional. Ele merece, e nós também.
Um abraço,

Lê Santôsha disse...

Sou privilegiada: recebi o livro das mãos do próprio artista; e, ainda tive a sorte de ouvi-lo na palestra realizada no FIQ. O livro é lindo mesmo. Fala de solidão. É maravilhosa a construção de Shiko. Ele cuida de cada detalhe com esmero. Gosto de como ele distribui o texto no espaço. Tudo fala muuuito. É uma partitura musical. A composição tem uma riquíssima variedade de elementos em harmonia total. É de uma ternura... O caba é bom demais.

Beijão.

Andre Dib disse...

É verdade, Lêda, parece que os desenhos flutuam como o smooth jazz tocado por aquela estranha banda (no hay banda?)...

shiko disse...

e aqui http://sirva-serecords.blogspot.com/
mais ficção e música por biu.

Lê Santôsha disse...

Fui lá. Completa sintonia entre os dois parceiros. Fez-se arte, né, rs?
Saudações!